Foi uma madrugada de sobressalto. Quem sobreviveu ao incêndio — há dezenas de feridos confirmados e ainda se contabilizam os mortos –, perdeu tudo ou quase tudo, tendo consigo pouco mais do que a roupa que veste. Os relatos são duros, de lamentação e espanto. Quase todos de gente que dormia enquanto o incêndio crescia “como um fósforo”. Não foi o alarme de incêndio (alguns apartamentos têm-no, outros não) que os alertou, mas os vizinhos — que ora ligavam, ora batiam porta a porta, com estrondo, enquanto fugiam até à rua. Apesar de tudo, apesar da perda e do medo, o relato dos sobreviventes é de alívio: “Tenho sorte por estar vivo!”

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Não se sabe quem é, apenas que vivia no prédio. Este sobrevivente, ainda sobressaltado pelo que vivera, conta ao The Guardian que escutou o alarme de incêndio na casa de um vizinho. E assegura: “Não pensei em nada disto. Perdi tudo o que tinha. Tudo o que tenho é o que trago. Muita gente não conseguiu sair, tenho sorte em estar vivo!”

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Siar Naqshabandi. Vivia no terceiro piso. Não estava no prédio quando o incêndio começou mas chegou a tempo de alertar o irmão. “Voltei a casa por volta da 1h45 e vi o edifício a arder. Liguei ao meu irmão e disse-lhe para fugir”, contou ao The Guardian.

O tio de Siar vive no 23.º piso. O sobrinho não sabe se sobreviveu ou não. Siar culpa os bombeiros no local: “Eles estavam a dizer às pessoas para não deixarem o edifício, que não tinham permissão para sair”.

David Benjamin vive com a namorada no quarto piso. Estava a dormir quando o incêndio teve início. À BBC, contou que só acordaria porque escutou alguém bater com estrondo na porta de sua casa. David levantou-se. E ouviu: “Fogo! Fogo!” A primeira reação antes de “calçar os ténis e começar a correr e correr pelas escadas” foi ligar para um vizinho, alertando-o. Foi difícil sair do prédio. “O fumo era muito, muito intenso”, explica.

Não se lhe sabe o nome. Apenas que habitava no 17.º piso. “Ouvi a sirene dos bombeiros e fui à janela. Não havia alerta de incêndio no prédio. Não há um sistema integrado de incêndio; é cada um por si”, lamenta-se ao Channel 4 News. “Saí de casa e tentei imediatamente perceber se os elevadores funcionavam ou não. E nada… Apenas podia sentir o fumo.” Voltou para dentro de casa. “Foi então que espreitei pela janela e vi o fogo a chegar até mim muito depressa por causa do revestimento – o revestimento era realmente inflamável. Parecia um fósforo!” Por fim, escapou. Ele e a tia, de 68 anos. Teme que outros vizinhos não tinham tido a mesma sorte.

“Estava quase a adormecer e senti um cheiro de plástico a arder”, contou à Sky News um homem em fuga. Vivia no sétimo andar. Só percebeu o que realmente se passava quando se dirigiu à janela da cozinha de sua casa. Alguém gritava: “Está a aumentar! Está a aumentar!…”

Isabel Afonso, 22 anos, é portuguesa. Vive no prédio imediatamente ao lado daquele que esta madrugada arderia. Ouvida pelo The Guardian, conta que por volta da 1h30 despertou com o ruído, tendo descido imediatamente até à rua. Foi lá que se apercebeu da dimensão do incêndio. E da aflição de quem habitava no prédio e não conseguia escapar, desesperando por ajuda. “Havia gente sentada no parapeito da janela. Diziam que iam saltar. E havia gente cá em baixo a dizer para não saltaram, porque os bombeiros estariam a chegar”, explicou Isabel. E acrescentou: “Nós podíamos ver gente a bater na janela, a gritar por ajuda. Foi horrível!”

Joe viu um homem morrer mesmo à sua frente. À BBC Radio London, descreveria assim a morte: “Vi gente a saltar. Vi um homem em particular a saltar, um homem que aterrou sobre um bombeiro. A perna ficou desmembrada.” E acrescentou, Joe: “Falei com um bombeiro. Ele disse-me que apesar de terem trabalhado a noite toda não conseguiram passar do 11.º andar. A meu ver, toda a gente que vivia nos pisos de cima teve certamente muitas dificuldades em sair”. O prédio tinha 24 andares. O fogo não poupou nenhum piso.

À BBC, Muna Ali, 45 anos, contou que o incêndio se propagou a todos os pisos em “menos de meia hora”. E descreveu-o assim: “As chamas… Nunca vi nada como isto; lembrei-me imediatamente do 11 de Setembro”.

Ao The Guardian, uma testemunha, Samira Lamrani, conta que um bebé foi atirado do 10.º andar pela própria mãe, na tentativa desesperada de o salvar. “As pessoas estavam à janela, a bater e a gritar. Nós, populares, apenas lhes dizíamos que já tínhamos ligado para os bombeiros – mas é evidente que eu vislumbrava a morte no rosto delas. Foi então que vi uma mulher que se preparava para atirar o seu bebé e pedia que alguém cá em baixo o apanhasse. Alguém o fez: um homem correu para a frente e apanhou o bebé”, explicou Samira. E acrescentou: “Olhava para cima, piso após piso, e via um sem-número de pessoas a pedir ajuda, maioritariamente crianças – as suas vozes, estridentes, vão acompanhar-me durante muito tempo. Ouvia-os a gritar pelas suas vidas.”

Outra mulher, Zara, esta moradora no prédio que se incendiou esta madrugada, garante ter visto uma mulher a atirar o filho, com perto de cinco anos, do “quinto ou sexto piso”. À LBC, Zara contaria: “Ela atirou realmente o filho da janela. Mas acho que ele está OK. É provável que tenha alguns ossos partidos e feridas, mas está OK.”

Mas nem todos tiveram a mesma sorte. “Ouvi outra mulher a gritar: ‘O meu bebé, o meu bebé, preciso de sair, preciso que salvem o meu bebé’. Nós continuávamos a olhar para cima mas não podíamos fazer nada. Não havia nada que pudéssemos fazer para a ajudar”, contou Zara.

Francisco Ramos é português, emigrante em Londres. Vivia no prédio que esta madrugada ardeu. Não estava em casa aquando do incêndio. “Estava a trabalhar, estudo música em Londres. Estava fora do prédio e tive pessoas a ligar-me, a perguntar se estava lá, porque as chamas estavam a cobrir o edifício. Não fui para lá porque sabia que não podia fazer nada. Morava no 13.º andar. Estive agora ao pé do edifício e senti uma dor no coração quando vi a minha casa a arder”, contou à SIC Notícias. E acrescentou: “Algumas pessoas ficaram presas no edifício, não conseguiam passar. Penso que houve um casal de portugueses encurralados no edifício. Não tenho muita informação do que aconteceu, mas penso que não tiveram muita sorte. Eu vivo aqui há pouco temo, mas foi o suficiente para perder muita coisa, tudo o que tinha trazido para cá.”

Tal como Francisco, também Miguel Alves é emigrante em Londres e vivia no prédio. À SIC Notícias contou como escapou ao incêndio e à morte. “Cheguei ao prédio, estava a subir no elevador – o meu andar era o 13.º – , entretanto alguém carregou para o quatro, e estava tudo cheio de fumo. A minha reação foi sair do elevador, ir pelas escadas e resgatar os meus filhos. Mandei a minha esposa sair do prédio, alertei os meus vizinhos, pelo menos os do mesmo andar, e saí calmo”, explicou.

Agora, Miguel precisa de começar tudo de novo. “Tinha toda uma vida ali, 25 anos em Londres e fiquei com a roupa que tinha no corpo. Agora preciso de descansar, tenho bons amigos que me vão acolher, mas não sei o que vou fazer a seguir.”

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