Depois de vários anos com as contas no vermelho, acima do limite de endividamento permitido, o presidente da Câmara de Gaia prepara-se para apresentar o primeiro orçamento e Plano Plurianual de Investimentos “verde” em vários anos. Nele incluem-se, por exemplo, o reforço dos processos de contratação, a dotação de 700 mil euros para um programa de apoio ao arrendamento jovem e a construção de um centro cultural e de congressos no centro da cidade. Regresso ao despesismo que transformou Gaia no segundo município mais endividado do país? “Não estamos a voltar aos vícios antigos”, garante Eduardo Vítor Rodrigues.
“Quando a Câmara estava no verde, há muitos anos, o vício que adotou foi o da má despesa pública, dos boys altamente pagos, dos avençados e das empresas municipais esbanjadoras“, esclareceu o autarca de Gaia ao Observador, após um encontro com os jornalistas, esta quinta-feira, para apresentar os investimentos e despesas previstos para 2018. O socialista referia-se aos 16 anos em que Luís Filipe Menezes presidiu à Câmara de Gaia, e a quem sucedeu em 2013. Nessa altura, encontrou uma dívida de 299 milhões de euros, entre dívida camarária e dívida das empresas municipais. Atualmente, o terceiro município mais populoso do país reduziu a dívida para cerca de 160 milhões de euros.
“O que acho que tem de se criar nos cidadãos é a noção de que é possível reduzir passivo e, ao mesmo tempo, ter investimento e serviços públicos dignos”, explica. No imediato, pretende abrir contratação pública para a polícia municipal e as escolas — já a 2 de janeiro de 2018–, baixar impostos como o IMI e investir em equipamentos para aproveitar fundos comunitários que, de outra forma — e porque o Governo central não investe –, se perderiam. É o caso dos três milhões de euros que o município vai canalizar para obras no Hospital de Gaia. Até agora, Gaia estava impedida pelo Programa de Apoio à Economia Local (PAEL), criado para apoiar municípios em pré-falência, de efetuar este tipo de despesa. “Vamos pedir para sair do PAEL em abril”, adiantou aos jornalistas.
Com a redução do IMI, o município deixa de arrecadar 800 mil euros por ano. A reposição de massa salarial decidida pelo Governo e a contratação pública custará um milhão de euros em 2018. Eduardo Vítor Rodrigues prevê também um aumento de cinco milhões de euros com bens e serviços.
O programa de incentivo ao arrendamento jovem — semelhante ao Porta 65, mas que não envolve em nenhum momento o senhorio — terá um orçamento de 700 mil euros. “Gaia é um município muito jovem ainda e sentimos a pressão dos jovens que são confrontados com rendas abruptas, e a política municipal tem de dar uma resposta”, defendeu. O autarca quer atrair parte da população que não consegue pagar habitação no Porto e, para isso, sublinhou estar a olhar com calma para os projetos hoteleiros que chegam à Câmara. “Acho que temos de ter calma com o frenesim hoteleiro. À medida que o Porto se especializar no alojamento local, sobra para Gaia um rejuvenescimento e arrendamento mais barato.”
Para 2018, o socialista compromete-se com mais apoios sociais, obras em escolas e centros de saúdes e a construção do novo Centro Cultural e de Congressos, que terá capacidade para 2200 pessoas, junto à Câmara. “É um equipamento absolutamente capital para a deslocalização de eventos na área metropolitana”, explicou, sublinhando que é para estar concluído até 2021.
Redução da dívida é para continuar, mas a ritmo mais lento
Do lado da receita e da poupança, Eduardo Vítor Rodrigues, que foi reeleito com maioria absoluta e, pouco tempo depois, foi escolhido para presidir também ao Conselho Metropolitano do Porto, destacou os três milhões de euros que vão ser arrecadados com a criação de uma taxa turística de 2€ por noite, à semelhança do que o Porto se prepara para fazer. A estimativa refere-se a nove meses de receitas, já que a medida só deverá entrar em vigor em março.
A poupança nos juros também é significativa. Com a saída do PAEL “podemos poupar 600 mil euros por ano” em juros, que a autarquia está a pagar acima do valor de mercado. “Quase a bater nos 3%”, explicou. Em juros de mora, a poupança anual é de 1,5 milhões de euros. Atualmente, a autarquia paga ao fornecedores a 52 dias — a meta legal é de 90 dias.
Contas feitas, Eduardo Vítor Rodrigues admitiu ao Observador que, no próximo ano, a redução da dívida continuará, mas “com intensidade diferente“. No caso, menor. “No próximo ano esperamos ter uma redução de 20 milhões de euros no passivo. Não é porque passamos ao verde que deixamos de pressionar a redução do passivo”, garantiu.
“A primeira coisa que é preciso garantir é que as receitas existentes, mesmo que não aumentem, sejam geridas com honestidade e bom senso. Porque não adianta aumentar muito as receitas e continuarmos com despesismo e numa lógica de corrupção que atordoa o país e nos atordoa a todos. E não pode haver uma lógica cíclica que agora que estamos no verde vamos outra vez investir atabalhoadamente porque depois recuperamos mais tarde.”