“Estamos a ver se conseguimos algum apoio”, responde Luís Capoulas Santos — ministro da Agricultura — a uma mulher que vê passar a comitiva da Comissária Europeia da Política Regional. Em Castanheira de Pera, depois de passar por Pedrógão Grande e antes de ir a Figueiró dos Vinhos, a romena Corina Cretu quis ver de perto o grau de destruição deixado pelos incêndios do verão. Foi recebida por um extenso cenário negro. De acordo com o Governo, os prejuízos dos incêndios deste ano podem chegar aos 1.000 milhões de euros. Mas só dentro de dois meses haverá dinheiro do Fundo de Solidariedade Europeu, porque o executivo ainda está a fazer o levantamento completo dos danos.
Markus Bosch espera junto a uma edifício térreo em construção. Esperou quase uma hora pelo autocarro que transportava Corina Cretu, o ministro Capoulas Santos, e os secretários de Estado do Desenvolvimento e Coesão, Nelson de Souza, e das Florestas e Desenvolvimento Rural, Miguel João de Freitas. A reunião em Coimbra, antes da visita a Pedrógão Grande, prolongou-se para lá do que se esperava mas o empresário ia insistindo na sua mensagem: “Eu só quero agradecer toda a solidariedade.”
Bosch chegou há 28 anos a Portugal. Veio da Suíça com a mulher – ainda namorada no ano de 1989 – e acabou por instalar-se na zona centro do país onde abriu a sua empresa. Compra casas, restaura-as e vende-as, sobretudo a clientes estrangeiros, como ele próprio. “Os portugueses querem todos ir para a Suíça, vão à procura de uma vida melhor”, reconhece. Ele fez o caminho contrário. “Sentia-me numa gaiola dourada, porque a Suíça é um país muito organizado, mas as pessoas vivem infelizes”, diz. Markus veio à procura de “qualidade de vida”.
Aquilo que viu à sua volta, na noite de 17 de junho, foi o inferno. Estava em casa com o filho mais novo, Flinn, 18 anos, e a mulher, Edith, de 54. O filho mais velho, Noah, 22 anos, estava na sua casa, uns metros ao lado. “Olhámos pela porta da frente e vimos o fogo chegar e logo a seguir as chamas já estavam nas nossas costas”, diz Flinn, junto ao pai. Molharam toalhas, enrolaram-nas na cabeça e, durante três horas, fizeram o que podiam para salvar a casa. Conseguiram. Mas não salvaram a empresa.
O edifício em construção com vista para milhares de hectares queimados é a nova carpintaria. Os primeiros 150 mil euros de Bruxelas permitiram começar a erguer as primeiras pedras. Foram exemplos como o de Markus Bosch que a comissária veio ver – e destacar – a Portugal. São histórias como a daquela família que o Governo quer mostrar à Comissão Europeia, numa ação de sensibilização dos responsáveis europeus quando ainda está por definir o montante global de ajudas comunitárias ainda está por definir.
Capoulas Santos explicou que o objetivo passou por “demonstrar ao vivo quais são os problemas” e por julgar “necessário o apoio da União Europeia”. Cretu diria logo a seguir que a Comissão quer dar um sinal de presença. “Precisamos de mostrar a nossa solidariedade”, sublinhou. Falta que o Governo envie a Bruxelas o levantamento completo dos prejuízos provocados pelos incêndios.
Avaliação dos danos em Bruxelas “antes do Natal”
O último grande incêndio deflagrou a 15 de outubro, nas zonas centro e norte do país. Os estragos provocados no dia com o maior número de incêndios do ano fizeram subir a escala das ajudas comunitárias para uma escala superior, com prejuízos potenciais acima dos mil milhões de euros. Esse patamar faz a diferença no momento de calcular os apoios a conceder a Portugal e, por isso, o Governo português e a Comissão Europeia decidiram fazer um pedido de ajuda global que considere o universo de danos provocados durante os meses quentes.
“Com os prejuízos de outubro, pensamos atingir e ultrapassar o limitar” para que os incêndios possam ser classificados como major disaster ou uma catástrofe de grandes dimensões, disse o secretário de Estado do Desenvolvimento e Coesão. Ou seja, os incêndios deixam de ser considerados um problema regional e passam a ser encarados como um caso nacional. Do ponto de vista dos apoios europeus, isso significa que o valor acima dos 500 milhões pode receber até 6% de ajudas comunitárias. Abaixo desse patamar, continuam a ser concedidos apoios a uma taxa de 2,5% do total dos prejuízos provocados.
Além da empresa de Markus Bosch, a comissária europeia ainda visitou as obras da casa de Serafim Rosa Bernardo, em Sarzedas de São Pedro, Castanheira de Pêra. Não viu o o homem, internado desde o fim de semana depois de se ter sentido mal, mas viu o que está a ser feito para recuperar a casa onde Serafim Bernardo vive com a mulher, a filha, o genro e um neto.
O programa ainda contemplava a visita ao Eco Turismo de Campelos, e Figueiró dos Vinhos. Visitas rápidas por locais de “tragédia e tristeza”, de não mais de dez minutos, mas que permitiram à governante europeia perceber o impacto dos fogos do primeiro grande incêndio deste ano. “Vim dizer ao povo português que não estão sozinhos”, insistia, antes de revelar que o próprio presidente Juncker entrou em campo para acelerar a revisão dos mecanismos de apoio europeus a países atingidos por desastres naturais, reduzindo os patamares mínimos de destruição exigidos para que meios como o Fundo de Solidariedade Europeu possam ser acionados.
A título de adiantamento, Portugal recebeu ainda em agosto 1,5 milhões de euros do Fundo de Solidariedade. Há ainda 50 milhões de euros de fundos estruturais que podem ser aproveitados para a reconstrução das povoações atingidas e um bolo de 433 milhões de euros de que o pais dispõe até 2020. Esse dinheiro foi pensado para aplicar em medidas de combate às alterações climáticas e prevenção de incêndios. Mas, segundo Cretu, pode ser utilizado nos trabalhos de reconstrução.
Capoulas Santos prevê que, até ao Natal, o Governo tenha concluído o levantamento de todos os danos provocados pelos incêndios de junho, agosto e outubro. A Comissão Europeia espera que o resultado desse trabalho seja apresentado em Bruxelas “na próxima semana”.
Com base nessa informação, a Comissão terá fazer ao Conselho e ao Parlamento Europeu a sua proposta de apoios a conceder. Precisará de cerca de duas semanas para concretizar essa proposta. Caberá aos eurodeputados votar a proposta, mas deverão passar mais dois meses até que isso seja possível. O que significa que só no final de fevereiro, no cenário mais otimista, haverá resposta de Bruxelas ao pedido de apoio português. Mas, para isso, é preciso que o Governo cumpra o calendário previsto.