O antigo ministro das Finanças grego, Yanis Varoufakis, diz que “a crise continua aí” e que “o euro corre perigo”. Numa entrevista ao jornal espanhol El País, a propósito da publicação da tradução espanhola do seu livro Adults In The Room: My Battle With Europe’s Deep Establishment (Comportarse Como Adultos, na versão espanhola), Varoufakis desvaloriza os recentes avanços da economia europeia, considerando-os “uma reativação cíclica” e enumera as ameaças que a Europa enfrenta.
“Na fase mais aguda da crise do euro, houve sérios riscos de fragmentação. O BCE soube contê-los, mas as ameaças ainda existem, ainda que adotem outras formas: o Brexit, uma Alemanha que não consegue formar Governo, a extrema-direita na Áustria, a Catalunha, o afundamento do bipartidarismo na França e os reflexos autoritários na Europa de Leste são claros sintomas de um mal-estar profundo”, considera Varoufakis na entrevista ao jornal espanhol
“As grandes crises são momentos de revelação das falhas do sistema: na Europa vimos as costuras ao euro e, se nada muda, a ameaça é o afundamento gradual daquilo a que costumávamos chamar democracia liberal”, assegura ainda o ex-ministro grego, sublinhando como “as análises mais pessimistas, entre elas as minhas, não falharam nos últimos anos; lamento, mas é assim“.
Euro é “insustentável”
Yannis Varoufakis, que liderou o Ministério das Finanças da Grécia durante seis meses em 2015, diz que a situação atual lhe faz lembrar “a de 2001”. Na altura, recorda Varoufakis, “vínhamos de 20 anos a conter bolhas, rebentou a bolha tecnológica, e ainda assim conseguimos manter-nos na mesma e provocámos uma crise ainda mais grave, com uma bolha ainda maior que rebentou em 2008. Corremos o risco de voltar a estes tempos. Em Espanha, a dívida total está a subir. Em Itália há fuga de capitais, uma crise bancária em potência, uma situação política explosiva”.
“O que temos na Grécia não se pode chamar recuperação, e a dívida é impagável. Os exemplos são inesgotáveis. Em toda a periferia trocámos empregos a tempo inteiro por trabalho precário, e com isso se põem em perigo as pensões futuras e as bases da economia europeia. Os desequilíbrios financeiros e macroeconómicos não só se reduziram, como são ainda maiores: temo que não estejamos para celebrações. O euro, tal como está hoje, é insustentável“, avisa mesmo o antigo governante grego.
“Dez anos depois [da queda] do Lehman Brothers, somos incapazes de reforçar a arquitetura do euro e a moeda, ao contrário do que diziam os seus impulsionadores, é uma fonte de incerteza. A Europa é muito rica e pode manter esse euro com pés de barro durante um tempo, mas a longo prazo, creio, as costuras vão rebentar”, afirma Varoufakis, acusando a Comissão Europeia de não ter um papel ativo na política europeia. “O Eurogrupo e até o grupo de trabalho do Eurogrupo mandam muito mais”, acusa.
“Não soubemos resistir”
No livro, o ex-ministro recorda as negociações entre a Grécia e a União Europeia, em que o país procurou reestruturar a dívida. “A Grécia não podia aceitar nenhum acordo sem reestruturar a sua dívida, que era e é insustentável. Mas aos credores não lhes interessava que pagássemos: simplesmente queriam dar uma lição à Grécia como aviso a outros países. No final, desgraçadamente, Tsipras capitulou“, recorda Varoufakis.
“No póquer, se tens cartas más, só tens uma possibilidade de ganhar se o teu bluff for bom e se o mantiveres até ao fim, mas se acreditas que o teu adversário não se vai retirar, não devias jogar. Estou orgulhoso do autêntico susto, ainda que breve, que a troika apanhou. Mas não soubemos resistir”, escreve o antigo ministro grego, admitindo ao El País que a “derrota teve custos enormes”.