O ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, “está disponível” para reunir com o PSD depois de o partido ter pedido uma “audição urgente” para esclarecer a posição do Governo português em relação ao caso Skripal. O ministro, que se encontra esta quarta-feira de visita a Paris, afirmou à Agência Lusa estar “disponível para ir à audição que o PSD anunciou que ia requerer, na data em que a Comissão entender e que corresponda a um dia em que não esteja em visita ao estrangeiro”.

O PSD acusou esta quarta-feira o Governo de ter uma posição “tímida e condicionada” pelo PCP e pelo BE no caso Skripal e defendeu a expulsão imediata dos diplomatas russos de solo português, tal como fizeram a maioria dos países da União Europeia. Em declarações aos jornalistas no Parlamento, o líder parlamentar social-democrata, Fernando Negrão, anunciou que o partido vai pedir uma “audição urgente” do ministro dos Negócios Estrangeiros para dar esclarecimentos sobre esta matéria na Assembleia da República.

Fernando Negrão classificou a posição do Governo português de “tímida” — porque se limitou a condenar o envenenamento do ex-espião russo no Reino Unido — e também “condicionada”. “A única explicação que encontro, num PS que foi sempre atlantista, é o de se sentir condicionado pela aliança com PCP e BE”, disse o líder parlamentar. Questionado sobre se o PSD defende a expulsão imediata dos diplomatas russos, Fernando Negrão respondeu afirmativamente: “A posição do PSD é que devemos alinhar com a maioria daqueles com quem temos estado sempre e devemos recomendar ao Governo que expulse os diplomatas russos da sua embaixada”.

PS acusa PSD de criar caso “inexistente”

Em resposta às declarações do PSD, o PS acusou o partido da oposição de forçar um “inexistente” nexo de causalidade entre a atual maioria de esquerda parlamentar e a posição do Governo português no caso Skripal. Esta posição foi assumida, numa conferência de imprensa, pelo vice-presidente da bancada socialista, Pedro Delgado Alves, que também apontou haver um desconhecimento da parte dos sociais-democratas em relação às posições do Bloco de Esquerda e do PCP sobre este caso.

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Para Pedro Delgado Alves, “não há condicionamento algum [por parte do PCP e Bloco de Esquerda], mas o PSD está a todo o custo a tentar fazer um caso que não existe”. “O PSD entendeu tomar uma posição incompreensível face ao histórico das relações diplomáticas e àquilo que têm sido as posições prudentes deste e de anteriores governos de Portugal. O PSD revela também desconhecimento sobre as posições que Bloco de Esquerda e PCP têm tomado sobre esta matéria, mas sobre isso não cabe ao PS pronunciar-se”, referiu.

De acordo com o vice-presidente da bancada do PS, está-se apenas perante “uma tentativa muito forçada do PSD no sentido de encontrar nexos de causalidade e condicionamentos que, manifestamente, não existem por parte do Governo português, que encarou a questão como muitos outros Estados aliados”. Na perspetiva do dirigente da bancada socialista, “o Governo, com muito bom senso e com aquilo que são as melhores práticas, solicitou a vinda do embaixador de Portugal na Rússia para consultas – uma medida perfeitamente adequada tendo em vista a obtenção de informação sobre o caso”.

“A posição do Governo português não é distinta daquela que foi adotada por vários países aliados que tomaram decisões similares compatíveis e totalmente razoáveis face às circunstâncias que o caso exige”, disse, em outra nota de demarcação face aos países que optaram pela expulsão imediata de diplomatas russos. Ainda em defesa da posição do Governo, Pedro Delgado Alves referiu que o caso deve ser acompanhado “no contexto multilateral” e que, para já, “não há razões para outras medidas para além destas”.

CDS-PP: decisão do Governo “só pode ter acontecido por razões muito ponderosas”

O CDS-PP considerou esta quarta-feira que a decisão de não expulsar diplomatas russos de solo português “só pode ter acontecido por razões muito ponderosas” porque a “condenação tem de ser clara, inequívoca e sem reservas”. O partido espera agora que o Governo dê explicações no Parlamento.

Em declarações à Agência Lusa, o eurodeputado do CDS-PP, Nuno Melo, considerou que “o não acompanhamento por Portugal, em solidariedade óbvia daquela que é a decisão de outros países amigos e aliados, expulsando diplomatas russos, só poderá suceder por razões muito fortes e muitos ponderosas”. Na opinião do vice-presidente centrista, “está em causa o assassinato de um cidadão em território que é da União Europeia, de um país particularmente amigo de Portugal, membro da NATO, com recurso a armas proibidas por tratados” e, portanto, Portugal “tem de ter firmeza absoluta em relação à condenação”, que deve ser “clara, inequívoca e sem reservas”.

“Antes de se exigirem decisões — que são necessariamente drásticas tendo em conta a natureza dos interesses em jogo — parece-me que é relevante e importante que se ouça o Governo, através do ministro que tutela a área e possivelmente até através do próprio primeiro-ministro, na Assembleia da República”, exigiu. Nuno Melo disse esperar, assim, que o Governo, no parlamento, explique esta decisão.

“Tenho presente que a política externa acontece primordialmente no plano bilateral e, desse ponto de vista, também no relacionamento no que tem que ver com a Rússia e de Portugal com este país, mas isso não invalida tudo o resto”, considerou. O dirigente centrista explicou que, primeiro, o partido, quer conhecer os fundamentos da decisão do Governo e, na base dessas explicações, decidir “aquilo que o CDS subsequentemente entenda”.

Bloco de Esquerda: “É prudente que o Governo português não queira fazer parte desta escalada”

Catarina Martins também comentou a decisão do Governo de não expulsar quaisquer diplomatas russos. A coordenadora do Bloco de Esquerda considera que “temos assistido na Europa a uma vontade de fazer uma escalada de várias formas” e adjetivou como “prudente” o facto do executivo português não querer “fazer parte dessa escalada”.

Já durante a manhã desta quarta-feira, foi o líder parlamentar do BE a comentar a temática na Assembleia da República. Pedro Filipe Soares começou por esclarecer que o partido “nem sequer teve nenhum contacto com o Governo” sobre o tema mas saudou a decisão de “pedir a opinião do embaixador para ter mais conhecimento do conteúdo”.

PCP: “O Governo está no caminho certo”

Questionado pelos jornalistas durante a manifestação dos jovens trabalhadores esta quarta-feira, em Lisboa, Jerómino de Sousa considerou que “o Governo está no caminho certo”, uma vez que “a nossa Constituição é uma Constituição amiga da paz”. “A posição inicial do Governo tem a ver, do meu ponto de vista, com os comandos constitucionais que existem em relação à questão da cooperação, da paz, do relacionamento com outros países”, disse o secretário-geral do PCP.

Em relação à tentativa de envenenamento do ex-espião russo, Jerónimo de Sousa começou por dizer que “neste submundo da espionagem, não se pode ter certezas certas”, defendendo um “apuramento de responsabilidades e, naturalmente, com todas as consequências”. “Mas a nossa preocupação é outra”, disse.

“É uma preocupação em relação ao sentido em que vai o mundo — o aumento da escalada de conflitos em varias partes do globo, o reforço da militarização e do armamento nuclear. Consideramos que este caminho tem de ser travado, e isso encaixa com a posição do Governo”, afirmou o secretário-geral do PCP, frisando que o executivo “deve saber ler e cumprir a nossa Constituição da República, que claramente se afirma pela paz, pela solidariedade, pela relação diversificada com outros povos e outros países”. “O direito internacional deve permanecer.”

Artigo atualizado às 16h33 com as declarações do ministro dos Negócios Estrangeiros e do CDS-PP