Espanha irá acolher o navio Aquarius, com 629 migrantes a bordo — dos quais 123 menores não acompanhados e sete grávidas. “É nossa obrigação ajudar a evitar uma catástrofe humanitária e oferecer um porto seguro a estas pessoas, cumprindo desta maneira as obrigações do Direito Internacional”, referiu Pedro Sánchez, numa nota divulgada pela Presidência espanhola esta segunda-feira e citada pelo El País.
O “porto seguro” será Valência. “O Governo situará o porto de Valência como o porto seguro para esta operação humanitária que o governo de Espanha vai empreender com a ONU”, disse ainda o presidente da Generalidad Valenciana, Ximo Puig.
O presidente da Câmara de Valência já se tinha oferecido para acolher o navio. “Queremos evitar mais mortes no Mediterrâneo. Por isso pedi à vice-presidente [Mónica Oltra Jarque] que comecemos já a gestão”, lê-se no tweet de Joan Ribó.
#València se ofrece como #CiudadRefugio para acoger a las 629 personas que huyen de la guerra y el hambre (123 menores). Queremos evitar más muertes en el Mediterráneo. Por eso le he pedido a la vicepresidenta @monicaoltra que iniciemos ya las gestiones https://t.co/fsPmdBf2nA
— Joan Ribó (@joanribo) June 11, 2018
Uma noite em alto mar depois de Itália e Malta se recusarem a receber navio
A embarcação passou a primeira noite no mar Mediterrâneo enquanto o ministro do Interior italiano, Matteo Salvini, continuava a fazer finca-pé, depois de Malta se ter recusado a receber o navio.
“Malta está a cumprir plenamente as suas obrigações internacionais e não vai receber o navio nos seus portos. Continuaremos, quando possível, a fazer retiradas individuais e humanitárias de emergência”, escreveu Joseph Muscat, na sua página de Twitter, este domingo, depois de Salvini e o ministro das Infraestruturas e Transportes, Danilo Toninelli, terem emitido um comunicado em que pediam a Malta para assumir “as suas responsabilidades”, “pela primeira vez desde há muito tempo”.
I took a call from #Italy PM @GiuseppeConteIT to discuss #Acquarius issue. #Malta is in full conformity with international obligations & will not take the vessel in its ports. We will continue,where possible, carrying out individual&humanitarian emergency medical evacuations -JM
— Joseph Muscat (@JosephMuscat_JM) June 10, 2018
Para Malta, a questão não se coloca: a responsabilidade é dos italianos, uma vez que as operações de salvamento dos migrantes ocorreram numa zona marítima coordenada por Roma.
Itália recusa desembarque de 629 migrantes e pede a Malta que os acolha
Desde domingo à noite que não há qualquer tipo de comunicações da sala de operações em Roma, refere o jornal italiano La Repubblica. A última instrução que foi dada à embarcação da organização não-governamental (ONG) francesa SOS Mediterrâneo, com pessoal dos Médicos Sem Fronteiras, pelo Centro de Coordenação de Resgate Marítimo italiano foi para se manter na posição em que se encontrava: a 35 milhas náuticas (cerca de 65 quilómetros) de Itália e 27 (cerca de 50) de Malta.
O primeiro-ministro maltês voltou a recorrer à sua página de Twitter para dizer que está “preocupado” com as instruções dadas ao navio pelas autoridades italianas, uma vez que “vão manifestamente contra as regras internacionais e arriscam criar uma situação perigosa para todos os envolvidos”.
We are concerned at #Italy authorities’ directions given to #Acquarius on high seas. They manifestly go against international rules, and risk creating a dangerous situation for all those involved -JM
— Joseph Muscat (@JosephMuscat_JM) June 10, 2018
Mal acordaram, os migrantes, que passaram a noite uns debaixo do convés e outros ao relento — o Aquarius só tem capacidade para 550 pessoas –, deram logo conta de que o navio não se mexia e, enquanto lhes davam pão e chá, começaram a questionar o que se passava, relata o La Repubblica. Uma vez que a bordo há apenas comida e água para 48 horas, estão dois barcos junto do Aquarius para prestar auxílio tanto a nível médico como alimentar.
Isto porque, apesar de não ninguém ter problemas de saúde graves, estão a bordo pessoas que foram vítimas de tortura e violência durante longos períodos, pelo que apresentam alguns ferimentos e queimaduras.
“Salvar vidas é um dever, transformar a Itália num enorme campo de refugiados não”
Ainda esta manhã, Salvini voltou a dar conta da sua posição a propósito de uma outra embarcação de uma ONG alemã que está “ao largo da costa líbia à espera de fazer o enésimo resgate de imigrantes, obviamente para levar para Itália”.
“Associação alemã, embarcação holandesa, Malta não se mexe, França que rejeita, Europa que não se importa. Salvar vidas é um dever, transformar a Itália num enorme campo de refugiados não. A Itália parou de obedecer e desta vez HÁ QUEM DIGA NÃO”, lê-se na publicação de Facebook, acrescentando o hashtag “#chiudiamoiporti” (“fechemos as portas”).
O ministro das Infraestruturas e Transportes italiano afirmou, esta segunda-feira, que em breve “haverá uma resposta” e que há “víveres para alguns dias” no navio.
Danilo Toninelli, que pertence ao partido antissistema Movimento 5 Estrelas, disse à televisão SkyTg24 que Roma continua à espera “da resposta oficial de Malta” ao pedido italiano para que receba o navio.
“Não nos movemos desde a noite passada, as pessoas começam a questionar-se porque estamos parados”, escreveu hoje de manhã no Twitter a jornalista Annelise Borges, que está a bordo do navio.
È necessario, stavolta, che tutti comprendano che il diritto internazionale non può prevedere un'Italia abbandonata a se stessa. Noi salveremo sempre le vite umane, ma #Malta è la spia di un'Europa che deve cambiare.
— Danilo Toninelli (@DaniloToninelli) June 11, 2018
#portichiusi vs #umanitàperta
O hashtag “#portichiusi” gerou um outro: “#umanitàperta” (“humanidade aberta”), que foi criado pelo site de informação Valigia Blu, refere o La Repubblica. Personalidades italianas e anónimos já utilizaram este hashtag nas redes sociais para expressarem solidariedade para com os migrantes e criticarem a atitude de Salvini. “Se há quem tenha a coragem de fazer ativismo hashtag na pele de seres humanos devemos opor #portichiusi com #umanitàperta.”
Se c'è chi ha il coraggio di fare hashtag activism sulla pelle di esseri umani dovremmo contrastare #portichiusi con #umanitàperta
— Valigia Blu (@valigiablu) June 10, 2018
“Sobre Salvini não tinha qualquer esperança, mas sobre si, ministro Toninelli, pensava que fosse — ao menos — uma boa pessoa. E vocês, mulheres e homens que levaram o M5S [Movimento 5 Estrelas] ao governo, querem isto? Ser a roda sobresselente de um partido xenófobo?”, lê-se num tweet de Roberto Saviano, jornalista e autor do livro “Gomorra”.
Su Salvini non avevo alcuna speranza, ma Lei, ministro Toninelli, pensavo fosse – almeno – una brava persona.
E voi, donne e uomini che avete portato il M5S al governo, volevate questo? Essere la ruota di scorta di un partito xenofobo? #umanitàperta #apriteiporti #Aquarius pic.twitter.com/aBLDqJMtC1— Roberto Saviano (@robertosaviano) June 10, 2018
“O porto de Nápoles está pronto para acolher”
Mas se Salvini quer fechar os portos italianos a embarcações com migrantes, vários presidentes de câmara italianos mostraram-se disponíveis para acolher o Aquarius, como por exemplo os de Messina, Palermo, Régio da Calábria e Nápoles.
“Se um ministro sem coração deixa morrer mulheres grávidas, crianças, idosos, seres humanos, o porto de Nápoles está pronto para acolher. Nós somos humanos, com um coração grande. Nápoles está pronta, sem dinheiro, para salvar vidas humanas”, escreveu o autarca de Nápoles, Luigi de Magistris, no Twitter.
Se un Ministro senza cuore lascia morire in mare donne incinte,bambini,anziani,esseri umani,il porto di Napoli è pronto ad accoglierli.Noi siamo umani,con un cuore grande.Napoli è pronta,senza soldi,per salvare vite umane
— Luigi de Magistris (@demagistris) June 10, 2018
“O nosso coração e grande, maior do que aqueles que querem especular sem um pingo de humanidade. Nós continuamos humanos”, referiu o presidente da Câmara de Régio da Calábria, Giuseppe Falcomatà, acrescentando que a “estratégia não pode ser a de fechar as portas sem critério”.
Di fronte a 629 persone, fra cui 11 bambini e 7 donne incinte, noi restiamo umani. pic.twitter.com/B2WueLcuN5
— Giuseppe Falcomatà (@g_falcomata) June 10, 2018