É um desenvolvimento que o Observador já tinha antecipado: os ex-líderes parlamentares social-democrata Luís Montenegro e Hugo Soares vão ser constituídos arguidos pelo alegado crime de recebimento indevido de vantagem no caso das viagens do Euro 2016. Luís Campos Ferreira, ex-secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação vai ser igualmente constituído arguido pelo mesmo ilícito por parte do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa.
Ao que o Observador apurou, os três social-democratas foram notificados pelo DIAP de Lisboa a prestar declarações na qualidade de arguidos num dos dois inquéritos foram abertos na sequência do caso Euro 2016.
Este desenvolvimento de um inquérito sobre o qual já não havia notícias há algum tempo indicia claramente que a conclusão do caso está para breve. Ao que o Observador apurou, o inquérito deverá ser concluído antes de agosto.
Recorde-se que, além de dos social-democratas, há diversos ex-secretarios de Estado do Governo do PS que são arguidos pelo mesmo crime: João Vasconcelos, ex-secretário de Estado da Indústria, Fernando Rocha Andrade, ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, e Jorge Oliveira, ex-secretário de Estado da Internacionalização, foram constituídos arguidos em julho de 2017, depois de se terem demitido do Governo de António Costa.
Também Vitor Escária, ex-assessor económico do primeiro-ministro António Costa, foi constituído arguido na mesma situação, tal como João Bezerra da Silva (ex-chefe de gabinete de Rocha Andrade) e Pedro Almeida Matias (ex-chefe de gabinete de Vasconcelos e presidente do Instituto de Soldadura e Qualidade) e o deputado Cristóvão Norte (PSD).
Euro 2016. Hugo Soares e Luís Montenegro na mira do Ministério Público
Montenegro, Soares e Campos Ferreira reagem
Em comunicado conjunto enviado para o Observador, Luís Montenegro, Hugo Soares e Luís Campos Ferreira confirmam a notícia do Observador e afirmam que, “com surpresa mas também com absoluta tranquilidade, tomamos conhecimento que no âmbito da investigação desenvolvida na sequência do chamado ‘processo das viagens ao Euro 2016’, o Ministério Público decidiu constituir-nos arguidos”.
Os deputados social-democratas reiteram a “total disponibilidade para prestar os esclarecimentos que forem devidos, reafirmando, sem tibiezas, que não praticamos qualquer crime e que as viagens que efectuamos naquela ocasião foram a expensas próprias”.
O caso que está em causa
Tal como o Observador noticiou a 4 de agosto de 2016, os deputados Luís Montenegro, Hugo Soares e Luís Campos Ferreira terão viajado para França a convite do empresário Joaquim Oliveira, líder do grupo Olivedesportos, para assistir a jogos de Portugal no no Campeonato da Europa que a Seleção Nacional veio a vencer. Alegadamente os três social-democratas viajaram a convite da Agência Cosmos — pertença do grupo do empresário nortenho.
Luís Montenegro terá assistido a quatro jogos, já Hugo Soares assistiu a dois jogos: a meia-final com o País de Gales, em Lyon, e a final de Portugal com França, em Paris. Luís Campos Ferreira assistiu à meia-final do Euro 2016.
Tal como acabaram de afirmar em comunicado, os três social-democratas sempre alegaram que pagaram todos os gastos “das respetivas deslocações”.
E esta é uma questão relevante. Porque o DIAP de Lisboa terá de concluir se o pagamento se se verificou antes ou após as viagens ao Euro 2016. O Observador noticiava em agosto de 2017 que a investigação do DIAP de Lisboa suspeitava que os deputados do PSD terão pago as viagens, bilhetes e refeições como reação à notícia do Observador. Isto é, um mês após a realização das viagens e dos jogos. Caso o DIAP de Lisboa entenda que tem provas nesse sentido, a alegada prática do crime ter-se-á consumado na altura da aceitação do convite.
O facto de o Ministério Público entender que deve constituir os três social-democratas como arguidos um ano depois do pico mediático do caso, pode significar que entende que o serviço não foi contratualizado de forma normal pelos três deputados.
Dois inquéritos abertos em 2017
Tal como o Observador noticiou no verão de 2017, o DIAP de Lisboa tinha aberto naquela altura dois inquéritos.
O primeiro inquérito estava exclusivamente relacionado com os convites feitos pela empresa Galp. Estes autos já têm seis arguidos constituídos: os ex-secretários de Estado dos Assuntos Fiscais (Fernando Rocha Andrade), da Internacionalização (Jorge Oliveira) e da Indústria (João Vasconcelos), além de Vítor Escária(ex-assessor do primeiro-ministro António Costa), João Bezerra da Silva (ex-chefe de gabinete de Rocha Andrade) e Pedro Almeida Matias (ex-chefe de gabinete de Vasconcelos e presidente do Instituto de Soldadura e Qualidade). A este grupo deve ter-se juntado o deputado Cristóvão Norte (PSD), depois de ser levantada a respetiva imunidade parlamentar.
Três ex-secretários de Estado arguidos com termo de identidade e residência no Galpgate
A investigação estava focada em perceber o que foi oferecido pela Galp. No pacote, que incluía viagem, bilhete para o jogo e refeição, os valores que estão em causa são variáveis, consoante o jogo que está em causa e o lugar no estádio que foi ocupado.
O segundo inquérito estava concentrado no grupo Olivedesportos, nomeadamente nos alegados convites que Joaquim Oliveira, líder do Grupo Olivedesportos, terá feito a diversos titulares de cargos políticos e de altos cargos públicos. Os autos deste segundo inquérito criminal contêm um conjunto de documentação que foi apreendida nas instalações da sociedade Cosmos Viagens (Grupo Olivedesportos) durante buscas judiciais realizadas em setembro de 2016. Tais buscas visaram a recolha de documentação sobre os clientes da Cosmos durante a fase final do Euro 2016, assim como a identidade de todos os beneficiários das viagens, refeições e bilhetes das empresas e pessoas individuais que os pagaram.