“É a ‘Brianstorm’”/“Não meu, é uma cena qualquer do álbum novo”/”É das antigas, tenho a certeza!” — meia hora antes das 00:05, altura em que os Arctic Monkeys começaram o seu concerto, era esta a conversa entre dois amigos que bebiam uma cerveja na orla do Palco NOS. Discutiam qual seria a música de abertura do concerto. “Eu ‘tive a ver na net, já sei o alinhamento”, acrescentou um deles. “Epá, não me digas nada então, man. Odeio spoilers!”, ripostou o outro. Se ainda houvesse alguma dúvida de que os ingleses eram o nome mais aguardado por todos (não havia), elas caíam por terra ao ouvir estes dois “manos” a conversar.

No rescaldo do lançamento de Tranquility Base Hotel + Casino (TBH+C), um álbum que foi tudo menos consensual, Alex Turner e companhia voltaram a um palco onde tinham sido felizes há quatro anos, meses depois de terem lançado o incontornável AM. A expectativa era alta: TBH+C marcou uma viragem de 180 graus no estilo da banda, explorando uma sonoridade muito mais calma, longe dos riffs endiabrados de outros tempos, e isso não agradou a muita gente. Mais tranquilo e trabalhado, o novo trabalho seria sempre desafiante para tocar ao vivo, num festival de verão onde se procuram emoções fortes e canções orelhudas. Como iriam os rapazes de Sheffield dar a volta à situação?

Alex Turner e a sua nova persona — o crooner satírico que nos canta ao ouvido. ©JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Poucos minutos depois da hora marcada, o entusiasmo materializava-se em palco na forma de quatro rapazes que há muito trocaram a t-shirt deslavada pelo casaco de cabedal rockabilly, depois de AM, e pelo fato au point remeniscente dos crooners de outros tempos, agora. O “mano” que foi “à net” tinha razão: Four out of Five, uma das canções mais mexidas do último trabalho, abriu as hostilidades. A meio gás e com um “Obrigado” pelo meio, Alex foi-nos levando a bordo da sua nave espacial com destino a um planeta distante onde o retro-futurismo kitch impera. Sem grande ajuda do sistema sonoro — que esteve cristalino umas horas antes, quando os Nine Inch Nails atuaram –, o grupo foi prosseguindo, repescando temas mais antigos mas adaptados a esta nova imagem cool relaxada e down tempo.

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Don’t Sit Down ‘Cause I’ve Moved Your Chair”, “Crying Lightning”, “505” e “Cornerstone” foram algumas das canções apresentadas em jeito mais brando. O característico início de “Teddy Picker”, por exemplo, nem soava ao mesmo, esteve longe da potência do antigamente. Teriam os Arctic Monkeys deixado o “barulho” para trás? A dúvida ia crescendo à medida que o concerto avançava.

Muita gente cantava e dançava, mas notava-se algum desalento dos fãs mais antigos perante esta falta de genica. Temia-se o pior. Felizmente, porém, surgiu “Do I Wanna Know?” mais ou menos a meio do espetáculo — e os espíritos rejubilaram. Agora sim toda a gente sacava da sua air guitar, abanava o cabelo e gritava a plenos pulmões. Costuma-se dizer que o que nasce torto, tarde ou nunca se endireita, mas este concerto provou o contrário. A “Pretty Visitors” foi pujante, assim como o clássico “I Bet You Look Good on the Dancefloor”, canções que marcaram esta curva ascendente que se manteve até ao fim. Para o encore, os macacos guardaram uma balada do novo disco, “Star Treatment”, que deixou que todos recuperassem o fôlego para logo a seguir o perderem de novo, com as mais rápidas “Arabella” e “R U Mine?”.

Milhares de fãs assistiram ao regresso do grupo inglês a Portugal. ©JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

O que quer tudo isto dizer, então? Quer dizer que, a julgar por este concerto e pelo último álbum, Alex Turner tem 32 anos mas parece ainda não ter ultrapassado aquela fase da adolescência onde ainda não percebemos bem quem somos. Uma espécie de puberdade ao retardador. Já tentou ser como Josh Homme, dos Queens of the Stone Age, agora parece querer reencarnar Serge Gainsbourg e o seu estilo blasé, ignorando o passado de jovem rebelde meio punk que fez a banda atingir o sucesso.

Todo o artista é mais do que livre de mudar de estilo as vezes que entender e muitos já o fizeram. Com estes rapazes, porém, as oscilações parecem algo forçadas. Essa foi, pelo menos, a impressão que ficou do concerto desta quinta-feira, em que todo o alinhamento adaptou-se ao novo registo do grupo. Os arranjos de músicas mais antigas, por exemplo, foram desacelerados de tal forma que não só perderam pujança como soaram indistintos a fãs que os seguem há vários anos. Crise de identidade à parte, a verdade é que os sorrisos do público provam que ainda não é desta que os Arctic Monkeys vão ser travados. A popularidade granjeada no passado é à prova de passos em falso. Ou assim pareceu, esta quinta-feira, no NOS Alive.