Foram dois a três minutos de aplausos. De pé. Foi desta forma que a plateia presente na Conferência ”Combate à Corrupção: Perspetivas de Futuro” – composta maioritariamente por magistrados do Ministério Público – prestou homenagem a Joana Marques Vidal, horas depois de se ter ficado a saber que não será reconduzida como procuradora-geral da República.
Joana Marques Vidal acabava de discursar (pela segunda vez no decorrer da Conferência, desta vez numa intervenção não prevista na agenda). Na sua intervenção, a mulher que dirigiu a PGR nos últimos seis anos fez um balanço do trabalho da procuradoria durante o seu mandato e não poupou nos elogios ao trabalho dos magistrados do Ministério Público, muitos deles sentados à sua frente.
“Num quadro de dificuldades os magistrados do Ministério Público mantiveram-se fiéis ao seus princípios e às suas ações. Conseguimos obter êxitos em circunstâncias que não foram as mais favoráveis” devido à falta de quadros, considerou Joana Marques Vidal, que vai ser substituída no cargo por Lucília Gago, que fazia parte da sua equipa.
Joana Marques Vidal diz que hipótese de recondução nunca lhe foi colocada
No final, aplausos, muitos aplausos. Dois a três minutos, com a sala de pé, incluindo o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, que a seguir ia discursar. A caminho do púlpito, Marcelo cruzou-se com a PGR, abraçou-a e deu-lhe um beijinho.
Na sua intervenção, o Presidente deixou três palavras. A primeira de agradecimento a Joana Marques Vidal pelo seu trabalho à frente da PGR. Virado para a procuradora, Marcelo disse: “Quero agradecer-lhe o empenho pela visão particularmente relevante e inteligente. Agradecer a humildade pelo seu desempenho e pela defesa do bem comum”.
“Nós somos servidores da causa publica, devemos fortalecer as instituições, porque assim fortalecemos a democracia”, sustentou.
Lucília Gago: A “magistrada discreta” que “não gosta de exposição mediática”
A segunda palavra de Marcelo foi para o combate à corrupção, que considerou estar “na primeira linha da defesa da Constituição”. “Esse combate não tem filhos e enteados. O combate deve chegar aos mais poderosos. A todos sem exceção”, disse.
“Uma coisa é combater a corrupção há 50 anos. Outra coisa é combater agora, com as novas tecnologias, a internet e o imediatismo dos mercados financeiros”, acrescentou o Presidente, salientando que “o combate não é de um grupo ou de uma fação. É o combate da Constituição”.
E a última palavra de Marcelo foi para o próprio Ministério Público, considerando que já “é tempo de dar todas as condições à Justiça para fazer esse combate”.
Já no exterior, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu aos jornalistas sobre o tema do dia. O presidente sublinhou que, para si, “era fundamental [a nova PGR] ser um magistrado do Ministério Público” e não apenas “um magistrado”. Justificou: só um magistrado do MP tem “uma proximidade do centro nevrálgico que é a procuradoria-geral da República”.
Questionado sobre se é favorável a incluir na Constituição o princípio do “mandato único” para a figura do procurador-geral da República, Marcelo chutou para fora. “Não entro agora em debates constitucionais, já sabem o que penso de revisões constitucionais. (…) Por definição não comento políticos partidários, antigos políticos, governantes, primeiros-ministros. Tenho uma posição muito clara em matéria de mandatos. Sobre este mandato, mantenho essa posição, entendo que é boa para a democracia”.
Ainda assim, o Presidente disse que reconhece que o mandato de Joana Marques Vidal à frente da PGR “foi um mandato que deixa no plano qualitativamente superior a intervenção do Ministério Público na sociedade portuguesa”.
“Pela primeira vez o PR explicitou as razões pelas quais nomeou e o governo explicitou as razões pela quais propôs. Entendo que é assim que deve ser”, sublinhou.
Ainda assim, concluiu, “mudança no cargo da PGR não muda a substância no combate à corrupção”.