Foram quase três anos como ministro da defesa. Azeredo Lopes, o doutor em Direito — e antigo presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social — que não fez a tropa, demitiu-se. O caso do roubo das armas em Tancos (e encobrimento que se seguiu) foi o limite, mas para trás ficam uma nomeação surpresa, os conflitos devido a discriminação no Colégio Militar e as mortes no curso de Comandos. Na prática, foi um mandato em que o ministro não teve o exército do seu lado e não esteve ao lado do exército. Leia as principais polémicas que marcaram este mandato.

Azeredo Lopes demitiu-se do Governo para evitar “desgaste das Forças Armadas”

A nomeação surpresa para o cargo de ministro da Defesa

O que aconteceu?

José Alberto Azeredo Lopes foi nomeado ministro da Defesa a 26 de novembro de 2015, depois de uma carreira que nunca o tinha feito passar pelas Forças Armadas. É doutor em Direito pela Universidade Católica Portuguesa, onde é professor, e foi diretor da faculdade de Direito no Porto (entre 2005 e 2006). Em 2006, passou para a presidência da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), onde esteve até 2011. Foi este cargo, durante o Governo socialista de José Sócrates, que levou o Correio da Manhã a dizer que foi nomeado “um amigo” do polémico antigo primeiro-ministro.

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Esta passagem “de comunicador para a tropa”, em 2015, como apelidou o Expresso, acabou por justificar a surpresa com que foi recebida a sua escolha para a pasta da Defesa.

O que disse Azeredo Lopes?

O antigo ministro é um homem de palavras diretas. A propósito do Governo de coligação de esquerda, que viria a integrar, disse no Jornal de Notícias, onde era habitual cronista: “Perceber-se-á que PCP e BE não têm corninhos e que a treta dos bolcheviques é chão que deu uvas”.

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Como é que as coisas acabaram?

O jurista comunicador, mesmo tendo sido uma nomeação surpresa, continuou no cargo. Mas a escolha socialista para a defesa viria a criar problemas, por causa das opções de liderança de Azeredo Lopes em casos ligados ao Colégio Militar, aos Comandos e, agora, o roubo de armas em Tancos.

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O que aconteceu?

A 1 de abril de 2016, é publicada no Observador uma reportagem sobre a chegada de alunas raparigas aos corredores do Colégio Militar, pela primeira vez em mais de 200 anos. A tradição era, assim, combatida, mas a instituição de ensino mantinha outros tabus: a transferência de alunos homossexuais por não se adaptarem à escola. “Um aluno tentou acarinhar outro aluno. Os pais ainda quiseram que ele se mantivesse na escola, mas a partir daí perdeu o espaço”, dizia o Tenente Coronel António Grilo, subdiretor da instituição. O caso gerou, como seria de esperar, polémica, e acabou mal para Azeredo Lopes.

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O que disse Azeredo Lopes?

O ministro da Defesa tinha em mãos o primeiro caso polémico. Rapidamente pediu ao Exército “esclarecimentos sobre o teor de tais declarações” e considerou a situação “absolutamente inaceitável”. O pedido de declarações foi também feito diretamente ao chefe do Estado Chefe do Estado-Maior do Exército e Azeredo Lopes pediu a demissão da direção do colégio, por permitir esse tipo de discriminação.

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Como é que as coisas acabaram?

O Exército assumiu que havia “situações de discriminação”, mas a direção do Colégio Militar só mudou passado dois meses. Antes disso, o General Carlos Jerónimo, chefe do Estado-Maior do Exército, pediu a demissão “por razões pessoais”, numa afronta ao ministro que foi acusado de não ter mostrado solidariedade com as Forças Armadas. O Presidente da República aceitou a exoneração e Azeredo Lopes começou a ouvir os primeiros pedidos de demissão, vindos de dentro do Exército, para forma como lidou com o problema, começando a criar-se um fosso que nunca viria a desaparecer. Uma inspeção feita ao Colégio Militar concluiu que não havia situações de discriminação. Contudo, no ano letivo seguinte, foi pedida atenção redobrada ao alunos para evitar esse tipo de casos.

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As mortes nos Comandos

O que aconteceu?

A 4 de setembro de 2016, vários militares que faziam um treino do 127.º curso de Comandos são transportados para hospital, vítimas de um “golpe de calor”. No mesmo dia, Hugo Serra, um dos recrutas, morre. Uma semana depois, morre o segundo, Dylan da Silva. Reportagens e inspeções ao caso mostram que as mortes podiam ter sido evitadas.

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O que disse Azeredo Lopes?

O então ministro da Defesa anunciou que os cursos de Comandos seriam ser suspensos, quatro dias depois da morte de Hugo Serra. Ainda estava Dylan Silva internado. Azeredo Lopes voltava a estar “debaixo de fogo”, como escreveu na altura o Correio da Manhã , e depois de sete militares terem sido detido na sequência do sucedido, disse ao Expresso: “Num caso desta natureza, com o impacto que teve, onde está em causa a perda de duas vidas e perigo para outras, é muito importante que se saiba o que aconteceu, como aconteceu, e se for caso disso, quem deve ser responsabilizado.”

Como é que as coisas acabaram?

O Ministério Público deduziu acusação contra 19 militares por 489 crimes de abuso de autoridade por ofensas à integridade física. O caso ainda está em julgamento. O Coronel Pipa Amorim, comandante do Regimento de Comandos, foi afastado pelo Chefe do Exército em julho deste ano. Como refere o Público esta sexta-feira, a decisão de afastar o comandante, que se opunha à forma como a acusação aos militares foi feita, pode ter tido mão de Azeredo Lopes, que não comentou mais o caso.

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Tancos: as armas que desapareceram, apareceram e fizeram desaparecer um ministro

O que é que aconteceu?

A 28 de junho de 2017, soube-se que tinha desaparecido material limitar dos Paióis Nacionais de Tancos. A 18 de outubro, o armamento era encontrado. Parecia um avanço numa investigação centrada em encontrar os assaltantes, mas viria a dar origem a uma outra investigação, da Polícia Judiciária civil à Polícia Judiciária Militar, que recuperou o material “na região da Chamusca, com a colaboração do núcleo de investigação criminal da Guarda Nacional Republicana (GNR) de Loulé”, contava, na altura, um comunicado.

Os indícios entretanto recolhidos apontaram noutro sentido: a descoberta das armas no tal terreno descampado teria, afinal sido encenada pela própria PJM, que quereria ficar com os méritos de resolver o caso do roubo, mesmo que isso implicasse proteger um dos assaltantes envolvidos, o homem que confessor que tinha o material e combinou entregá-lo. A investigação culminaria com a detenção desse civil, de elementos da GNR e da PJM — entre eles, o diretor da Judiciária Militar. Os arguidos acabariam por confessar o encobrimento.

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O que disse Azeredo Lopes?

“Pode não ter havido furto”, chegou a dizer Azeredo Lopes, confrontado com o desaparecimento das armas. Quando o roubo foi tornado público, Exército e Ministério da Defesa pareciam não saber o que tinha acontecido ao material desaparecido. Quando a atuação da PJM no “achamento” das armas foi descoberta , ainda mais. O ministro negou saber de “qualquer encobrimento” de suspeitos do furto e de “qualquer encenação ou de qualquer prática ilegal”. Contudo, o ex-chefe de gabinete do político terá recebido nota detalhada dos verdadeiros contornos da operação de resgate do material furtado de Tancos, que explicava que a PJM não queria a PJ envolvida na investigação.

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Como é que as coisas acabaram?

Com a demissão. Antes mesmo de se saberem, com exatidão, as circunstâncias em que tudo aconteceu, a dúvida sobre o que sabia ou não sabia o gabinete do ministro deixou Azeredo Lopes sem margem de recuo, mesmo que mantendo a garantia de que nunca foi informado. “Não podia, e digo-o de forma sentida, deixar que, no que de mim dependesse, as mesmas Forças Armadas fossem desgastadas pelo ataque político ao Ministro que as tutela, em virtude da acusação acima referida”, justificou.

A carta de demissão do ministro da Defesa na íntegra

Foi o ponto final numa relação que nunca correu bem, entre militares e ministro, e que termina poucas semanas depois de o Serviço de Informações Militares ter dito que Azeredo Lopes agiu com “ligeireza, quase imprudente” na forma como lidou com o caso de Tancos.

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[Veja o vídeo: Como Tancos tramou Azeredo]