Jerónimo de Sousa não fecha a porta a uma reedição mais completa da “geringonça” e não rejeita uma eventual ida do PCP para o governo, já que “o PCP, em relação ao poder, não se põe numa mera posição de partido de protesto”. Numa entrevista ao jornal Público e à Rádio Renascença, o secretário-geral do PCP diz, contudo, que mais importante do que ir para o governo é saber que políticas vão ser implementadas por esse governo. A política europeia seguida pelo PS, que Jerónimo de Sousa apelida de “pedregulho de imposições da UE”, é o maior obstáculo a uma convergência com os socialistas, mas mesmo assim, questionado sobre se alguma vez será possível o PCP e o PS chegarem a acordo em matéria europeia, Jerónimo admite a “dificuldade” e o “bloqueio”, mas não fecha a porta: “A vida é dinâmica. O que é verdade hoje pode ser mentira amanhã.”

Numa entrevista concedida logo depois da convenção do Bloco de Esquerda, onde aquele partido se disse “pronto” e “preparado” para integrar um governo, Jerónimo de Sousa não rejeita aspirações semelhantes. “Quando se fala de Governo, é evidente que o PCP, em relação ao poder, não se põe numa mera posição de partido de protesto. Mas coloca uma questão primeiro: um Governo para quê? Para quem? Para fazer que política? A ideia de querer participar no Governo a todo o custo, independentemente das políticas que esse Governo vai realizar, não corresponde à necessidade de um caminho novo e de uma política alternativa”, começou por dizer, traçando algumas linhas vermelhas.

Segundo Jerónimo de Sousa, é, primeiro, necessário haver uma “rutura” com a política de défices estruturais do PS, aumentando a produção nacional para aumentar o emprego e, consequentemente, reduzir a dívida, bem como valorizando os direitos e os salários dos trabalhadores, nomeadamente através de alterações à legislação laboral. Para o secretário-geral do PCP, o que acontece é que o PS está prezo ao “pedregulho de imposições” da UE e, por isso não “encontra respostas sólidas” para os problemas do crescimento económico e da dívida.

Apesar de a política europeia ser a maior divergência de fundo entre comunistas e socialistas, não é líquido que esse obstáculo seja mesmo impossível de ultrapassar. Questionado diretamente sobre se alguma vez será possível o PCP e o PS chegarem a acordo em matéria europeia, Jerónimo de Sousa deixa a porta entreaberta: “A vida é dinâmica. O que é verdade hoje pode ser mentira amanhã. Existe esta dificuldade, este bloqueio, este pedregulho de imposições por parte da UE que condicionam qualquer perspetiva de que seja fácil uma convergência com o PS.”

É que, para Jerónimo de Sousa, é o “mandonismo da União Europeia” o principal responsável pelo crescimento da extrema-direita nos vários países da UE. “Hoje todos nos inquietamos com o desenvolvimento das forças xenófobas, racistas, mas a verdade é que este mandonismo da União Europeia é fonte de alimento de sentimentos…”, diz, sublinhando que a UE tem sido um obstáculo à soberania dos povos e que é isso que tem provocado, como reflexo, a “resposta inquietante desses movimentos [de extrema-direita], que capitalizam para si a defesa da soberania e do desenvolvimento económico e social”.

A dois anos do congresso do PCP (que só se realiza de quatro em quatro anos), e já com 70 anos de idade, e 14 de liderança do partido, Jerónimo não diz se se recandidata, mas admite vir a ficar por aqui — porque “isto é uma tarefa exigente e aquilo que se faz com 70 anos não é a mesma coisa do que quando se tem 30”. Em todo o caso, garante: “Não vou calçar as pantufas.”

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