O ministro da Educação contestou esta quarta-feira que a existência do 2.º ciclo tenha um impacto na “cultura de retenção”, defendendo que mudanças nos ciclos de ensino necessitam primeiro de “discussões alargadas” e experimentação.

As declarações do ministro Tiago Brandão Rodrigues surgem na sequência da posição da presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Maria Emília Brederode Santos, que defendeu que deveria ser repensada a existência do 2.º ciclo, lembrando que se trata de uma “originalidade portuguesa” e que “não é uma boa prática” tendo em conta o elevado número de reprovações.

Ano letivo de 2016/17 com valor mais baixo de “chumbos” da última década

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O relatório Estado da Educação 2017, divulgado esta quarta-feira pelo CNE, alerta para as dificuldades dos alunos nos anos de transição, apontando o dedo ao 2.º ciclo, que é composto por “um ano para entrar e outro para sair”. No entanto, o Ministro da Educação entende que os números expressos no relatório não espelham essa relação: “A reprovação do 2.º ciclo estava em 12,5% (2013) e agora está em 5,8%”, afirmou Tiago Brandão Rodrigues em declarações à Lusa.

“Obviamente que as transições são sempre complexas, que temos de fazer um trabalho sistemático no acompanhamento dessas transições para mitigar os efeitos de mudar de escola, mudar de ciclos, de mudar da monodocência para a pluridocência, como acontece no 2.º ciclo. Mas não nos parece, pelos números que vemos, que este 2.º ciclo tenha uma implicação na reprovação e cultura de retenção, como é dito”, disse Tiago Brandão Rodrigues. Para o ministro, qualquer alteração no esqueleto da escolaridade obrigatória e na reconfiguração do ensino básico teria de ser sempre alvo de “uma discussão alargada e profunda”.

O ministro admitiu, no entanto, que, caso a sociedade e as forças políticas assim o entendessem, então poderia avançar-se para essa mudança: “A sociedade portuguesa assim o fará, mas sempre após uma discussão alargada e profunda que não se faz com repentismos”.

A pertinência e eficácia dos três ciclos no ensino básico têm sido questionadas há já vários anos pelo CNE, mas nunca teve qualquer consequência por parte da tutela. Tiago Brandão Rodrigues mostra-se apologista de “mudanças paulatinas”, defendendo que qualquer mudança tem de ser primeiro experimentada no terreno.

A “cultura da retenção” nas escolas portuguesas foi outra das preocupações apontadas no relatório do CNE, que indica que as taxas de retenção e abandono atingiram o valor mais baixo da última década no ano letivo de 2016/2017. No entanto, a presidente do CNE lamenta que a medida continue a ser usada em demasia apesar de ser a “mais cara e menos eficaz”.

Uma realidade que também preocupa o ministro que esta quarta-feira salientou a “redução paulatina” dessas taxas, dando como exemplo a descida da taxa de abandono de 44% em 2001 para os atuais 12,6%, “que ainda precisam de ser combatidos”.

O ministro corroborou a ideia de o chumbo representar um custo social e económico, mas também “um custo individual e um custo para a comunidade educativa muito alargado”. Tiago Brandão Rodrigues lembrou vários projetos que têm sido levados a cabo para “combater a retenção sem facilitismos”, tais como o programa de promoção do sucesso educativo, a redução de alunos por turma ou o reforço na oferta do ensino profissional.

Outro dos alertas lançados pelo CNE prende-se com o envelhecimento dos professores: O corpo docente das escolas públicas portuguesas está em queda e envelhecido, com apenas 0,4% dos professores com menos de 30 anos. No que diz respeito ao ensino pré-escolar, básico e secundário, entre 2007-2008 e 2016-2017, as escolas perderam 30.370 docentes, registando um total, no último ano letivo em análise no relatório, de 145.549 profissionais.

Tiago Brandão Rodrigues lembrou a recente entrada de sete mil docentes, mas também que há cada vez menos alunos nas escolas: “Nos anos 60 havia cerca de 210 mil crianças a entrar todos os anos no 1.º ciclo e agora temos aproximadamente 80 mil”. No entanto, reconhece que os programas que foram lançados nos últimos anos exigem a presença de mais docentes nas escolas e que por isso “este é um facto que preocupa o Ministério”.