O tema é polémico desde o primeiro dia. O Bloco de Esquerda apresentou, no final do verão, uma proposta de combate à especulação imobiliária (que ficou conhecida na oposição por taxa Robles, devido ao vereador bloquista que foi afastado do cargo por ele próprio praticar especulação) e Rui Rio foi o único líder partidário que não se mostrou contra. O PSD — ou parte dele — entrou em alvoroço perante a postura do líder, e, no contra-ataque, Rui Rio anunciou logo nessa altura que o PSD iria ter uma proposta no Orçamento do Estado que visava combater o problema dos elevados preços de habitação.

Bem dito, bem feito. O prazo para apresentar propostas de alteração ao Orçamento chegou e o PSD, como tinha prometido Rui Rio, apresentou a tal proposta: a ideia não era, afinal, criar uma “taxa especial para evitar a rotatividade excessiva”, como alegadamente defendia o BE naquela altura, mas sim penalizar os especuladores através da taxa já existente em sede de IRS sobre as mais-valias — quem comprar e vender imóveis num curto espaço de tempo deve ser penalizado no IRS, e quem retiver imóveis durante muitos anos deve ser beneficiado no imposto. Acontece que o PSD continua em alvoroço com o mesmo tema, o que ficou patente na reunião de deputados esta quinta-feira.

PSD quer penalizar especulação imobiliária

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Segundo apurou o Observador, vários foram os deputados que criticaram a proposta, incluindo Maria Luís Albuquerque. Na génese da crítica está a ideologia inerente à medida, com os sociais-democratas a dizerem que contraria o princípio da liberdade de iniciativa. “Vai contra a lógica de pensamento do PSD, e contra aquilo que defendemos nas outras propostas. Não podemos dizer que é preciso fomentar o mercado de arrendamento e depois prejudicar quem compra e arrenda”, diz uma fonte presente na reunião.

À saída da reunião, e confrontado pelos jornalistas, Fernando Negrão admitiu que ouviu críticas de “três deputados” e, no seguimento dessas críticas, admitiu “alterações”. “Houve críticas, naturalmente, é assim que se discute. Houve críticas construtivas, propostas e contrapropostas. Tenho a certeza que, com esta reunião, melhoraremos as nossas propostas em relação ao Orçamento do Estado. Mas, obviamente, se elas forem corretas tecnicamente e politicamente, admitimos eventualmente a sua alteração”, disse.

Uma coisa é certa, garantiu Negrão para acalmar as hostes: o PSD não irá negociar com o Bloco de Esquerda, que também tem propostas sobre o mesmo tema da especulação imobiliária. “Nunca negociámos com o BE, nem pensámos negociar com o BE”, garantiu, ao mesmo tempo que sublinhou que o PSD não irá votar a favor da proposta do Bloco.

Apesar da divisão evidente entre os deputados do PSD, Negrão garantiu também que não haverá liberdade de voto por se tratar de matéria orçamental. “Em matéria orçamental nunca há liberdade de voto, este ano também não haverá”, afirmou, o que significa que o voto na especialidade é um voto do partido como um todo, restando a possibilidade de aquelas normas serem chamadas a plenário para retificar a votação e, nesse caso, poderá haver deputados a furar a disciplina de voto para fazerem valer o seu ponto.

Isto, claro, se a proposta de Rio se mantiver. Segundo Fernando Negrão, poderá haver alterações. Questionada pelo Observador sobre o que diz o regimento em termos de alterações às propostas de alteração, a presidente da comissão parlamentar de orçamento e finanças, a deputada social-democrata Teresa Leal Coelho, afirmou que a única maneira era através de “propostas de substituição”. “O prazo para a entrega das propostas de alteração ao OE já terminou, o que pode haver é substituições às propostas desde que sejam sobre a mesma matéria e digam respeito às mesmas normas da proposta de lei do OE”, afirmou. Ou seja, só se for uma substituição direta sobre o mesmo assunto, não uma proposta totalmente diferente.

Segundo apurou o Observador, o tema agitou as águas na reunião da bancada, e coube ao deputado António Topa, próximo de Rio, fazer a defesa da medida.

Contagem do tempo dos professores? Negrão remete para Rio, mas admite que nada seja aprovado

Já sobre as propostas relativas ao congelamento das carreiras dos professores, Fernando Negrão disse que ainda não está definido se o PSD vai ou não dar luz verde às propostas de BE e PCP, que impõem um calendário para a contagem do tempo integral de serviço dos professores. E passou a bola a Rui Rio, que vai avaliar “politicamente” o que fazer. “Discutimos só a nossa proposta, ainda não está definida a votação. A votação é um processo que vai até à direção do partido”, disse.

No limite, se a esquerda e a direita não fizerem uma coligação negativa, o líder parlamentar admitiu que possa ficar tudo na mesma e nenhuma das propostas ser aprovada — apesar de todos os partidos terem propostas de alteração sobre a contagem do tempo de serviço dos professores. Todos concordam que alguma coisa deve ser feita, mas não se entendem na resposta a dar.  “Isso pode acontecer. Avaliaremos politicamente com a direção do partido como havemos de agir”, afirmou.

Em causa está o facto de as negociações entre o Governo e os professores relativas à contagem de todo o tempo de serviço que esteve congelado para efeitos de progressão de carreira não terem chegado a bom porto. Com as negociações num impasse, PSD e CDS propõem no OE para 2019 que o Governo cumpra o que ficou estabelecido no OE 2018 e que passa por retomar as negociações com os sindicatos (isto apesar de, no ano passado, PSD e CDS terem-se abstido na votação desta norma).

Já o BE e o PCP vão mais longe e fixam um calendário (até 2023, no caso do BE, e até daqui a sete anos, no caso do PCP) para que Governo e sindicatos fixem etapas para uma devolução faseada aos professores, a começar já em janeiro de 2019.

Certo é que a reunião da bancada do PSD foi acesa. Segundo relatos feitos ao Observador, além dos temas da “taxa Robles” e dos professores, houve mais críticas. Álvaro Batista, de Castelo Branco, por exemplo, fez uma intervenção descrita como “muito dura” contra as propostas do partido para o interior, dizendo inclusive que lhe foi pedido um dossiê sobre o tema que, depois, não foi tido em conta. O mesmo aconteceu com o deputado Ricardo Batista Leite, atual coordenador dos sociais-democratas para a área da Saúde, que “terminou a reunião aos berros, com o microfone desligado, a dizer que claramente a Saúde não era uma prioridade para o partido”.

*artigo atualizado às 22h40 a eliminar a alegada postura crítica de António Leitão Amaro em relação à proposta sobre as mais-valias imobiliárias.