O Bloco de Esquerda diz-se “pronto” para integrar um Governo e o PCP passou por entre os pingos da chuva na atribuição de medalhas de António Costa no pódio do campeonato no despesismo, mas nenhum dos dois escapou às farpas do líder parlamentar do PS no discurso de encerramento das Jornadas Parlamentares do PS em Portimão. Não foi preciso Carlos César chamá-los pelos nomes para se saber que “os outros” a quem se referia quando falava na “ansiedade eleitoral” e nas propostas que comprometem meta europeias, eram os parceiros parlamentares do Governo. Com eleições no horizonte, César volta ao papel de principal malhador na esquerda.
Para a direita não foi brando e até afirmou que “anda de cabeça perdida, à pequenas, médias e grandes cabeçadas”, quando avisou que “todo o cuidado é pouco” perante os “milhares de milhões de euros nas propostas de alteração que a oposição entregou no Parlamento para mudar o Orçamento do Governo. Disse mesmo tratar-se de uma espécie de “leilão” em que “a direita é, euforicamente, quase perdulária”. Mas logo de seguida apontou aos “outros que já acham que as propostas da direita são como as propostas da esquerda” e que “parecem tomados por uma ansiedade pré-eleitoral de difícil compatibilização com o sentido de responsabilidade que os portugueses estimam“.
Na mesa de honra das Jornadas do PS estava o único governante que passou por Portimão (além da passagem relâmpago de António Costa no sábado), o secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares. Pedro Nuno Santos — a quem César chamou de “companheiro de viagem dos períodos de calmaria como de turbulência e a quem os PS e o Governo muito devem nas funções de estabilização do relacionamento com os parceiros” — aplaudiu entusiasticamente estas referências orçamentais do líder parlamentar socialista.
E voltou a aplaudir quando César concluiu a intervenção a sublinhar a impreparação da esquerda para governar. Não o disse por estas palavras, mas ficou claro que se “uns, de tanto se oporem a si próprios pouco servem ao país como oposição ao Governo”, do outro lado também não será melhor, já que lá estão “os outros”. Novamente a esquerda: “Outros, tanto negligenciaram o cumprimento das normas a que o país estava obrigado que se revelam pouco preparados para entender a governação num período tão sensível da vida do país e da vida europeia”.
É com os olhos no “futuro” que o presidente do partido diz que é importante “recusar ímpetos menos razoáveis dos que tudo querem sem quererem entender que tudo não pode ser conseguido e podendo incorrer no risco de comprometer a maior parte do que conseguimos”. A responsabilidade vs. despesismo está para ficar no discurso pré-eleitoral dos socialistas, como forma de vincar a diferença face aos parceiros da “geringonça” nesta fase. Precisamente a mesma dicotomia que a direita usou, em 2015, para atacar o PS que acusa de ter levado o país ao resgate financeiro. Nessa campanha, também coube a Carlos César a diabolização dos partidos mais à esquerda, que atacava frequentemente, poupando o líder António Costa de ter de radicalizar o seu discurso nesse ponto — um caminho que poderia inviabilizar entendimentos futuros.
Agora, com as legislativas de 2019 no horizonte, César até admite que “compete ao PS manter o diálogo particularmente à esquerda, mas sobretudo manter o rumo para os portugueses continuarem a recuperar rendimentos”. E “assim, o PS poder pedir com consciência tranquila um PS mais forte e que conduza o país para um caminho mais seguro”.
Quanto ao grupo parlamentar que lidera — e depois de no dia anterior ter ouvido Costa referir-se à liberdade de voto que concedeu aos deputados no Orçamento –, o socialista afirmou que voltará a dizer “sempre que necessário” que, no grupo parlamentar do PS, os deputados são interpretes dos eleitores e não porta vozes do governo que apoiam”. Já na estrada eleitoral que está prestes a abrir, César será o porta-voz da desconfiança com o que pode vir da esquerda.