A Assembleia Geral do Sporting, que se realizou no Multidesportivo de Alvalade para aprovação do Orçamento de 2018/19 e o Relatório e Contas do exercício anterior, teve alguns momentos onde os ânimos ficaram mais quentes, levando mesmo o novo líder da Mesa verde e branca, Rogério Alves, a pedir por uma vez a intervenção dos seguranças para ajudarem a acalmar um foco da sala onde alguns associados que estavam um pouco mais exaltados. Aí, tudo começou quando Rui de Carvalho, pai de Bruno de Carvalho, ex-presidente dos leões, foi chamado ao palanque para exercer os três minutos de intervenção habituais nas reuniões. Também Alexandra Carvalho, a irmã do antigo líder, marcou presença e foi ao palanque falar.
No primeiro encontro depois das eleições, e segundo informações recolhidas pelo Observador, foi notório o clima de tensão e fratura entre os presentes, com alguns discursos contra a Direção recentemente eleita e também contra a forma como foi gerido todo o processo que levou à destituição de Bruno de Carvalho em Assembleia Geral a 23 de junho (a ata dessa reunião não foi lida, o que também gerou protestos). Houve também pelo menos um membro das Comissões nomeadas por Jaime Marta Soares, antigo líder da Mesa, durante o período de maior crise no clube que foi alvo de insultos por outros associados.
Um grupo que estava numa zona mais localizada do Multidesportivo, e que se mostrou assumidamente a favor de Bruno de Carvalho – e que se manifestaram também contra os repórteres de imagem, quando subiram ao piso 3 para recolherem imagens do início da reunião magna –, assobiou Frederico Varandas na altura em que se preparava para iniciar o seu discurso. Também na altura de votação o presidente verde e branco voltou a ser criticado, o que deixou muitos dos presentes incomodados pelo sucedido. “Nunca mais haverá alguém acima do clube. Há uma condição mínima para trabalhar: estabilidade. A Direção nunca vai recuar sob ameaça”, disse no único discurso, voltando então a ouvir assobios pela “indireta” ao antecessor.
Os resultados finais acabaram por refletir essa divisão existente: se em relação ao ponto 1, que votava o Orçamento do novo elenco liderado por Frederico Varandas, a aprovação foi de “apenas” 56,36% (apesar de ser apenas necessária maioria simples, por norma costuma passar com valores de 80% para cima), o ponto 2 mereceu 82,99% de votos favoráveis, “ratificando” o Relatório e Contas do exercício de 2017/18 quando Bruno de Carvalho era ainda presidente. Perante estes resultados, é provável que a próxima Assembleia Geral, que irá deliberar sobre a suspensão do antigo líder do clube, tenha bem mais associados do que os 553 (com um total de 3.021 votos) que passaram esta noite de sexta-feira pelo Multidesportivo de Alvalade.
Acrescente-se que o Orçamento apresentado esta noite, tendo revisões por cima e por baixo de alguns parâmetros – com um resultado final estimado de 2,088 milhões de euros, acima do projetado pelo anterior elenco diretivo –, tem muitas semelhanças com o que tinha sido apresentado por Bruno de Carvalho a meio de junho (exemplos: rúbricas de gastos, receitas de bilheteira, gastos com pessoal, rendas ou publicidade/patrocínios). Como o próprio Francisco Salgado Zenha, vice-presidente com a parte financeira do clube, explicou aos associados presentes, muito do que vinha de trás teve de ser seguido porque os ordenados e os orçamentos para cada modalidades já estavam há muito definidos.
As contas projetadas pelo anterior líder nunca chegaram a ser votadas: por um lado, a Comissão Transitória da Mesa da Assembleia Geral liderada por Elsa Judas que tinha sido nomeada foi considerada ilegal, pelo que a marcação da reunião magna nunca existiu; por outro lado, a Comissão de Fiscalização, que assegurou as competências do Conselho Fiscal e Disciplinar que se tinha demitido em peso, deixou um parecer muito crítico aos números em causa, considerando mesmo ser “um cheque em branco para aumentar o passivo” num exercício com “receitas exageradas” e “variações mascaradas”.
“Teve a fase de debate, intervenções, votação e acabou, missão cumprida. Não, não foi uma Assembleia Geral. Mas penso que cabe aos sportinguistas por um lado não esconder que o clube ainda atravessa momentos de tensão. Há feridas muito abertas, há um caminho que terá de ser empreendido para restaurarmos a união, a confiança e a unidade, para convivermos uns com os outros de uma maneira serena e pacífica. Mas isso não deixou de fazer com que a Assembleia tivesse corrido, em alguns momentos com mais ênfase nos protestos, manifestações de reprovação, mas o fundamental é que, num momento em que pretendemos sair de um momento difícil, em que a união é trabalhosa e morosa, temos de contribuir todos para ela”, começou por comentar Rogério Alves aos jornalistas, no hall VIP de Alvalade, no final da reunião magna.
“Uma das coisas que devem contribuir para essa união é não estarmos sistematicamente a expor aquilo que nos divide. O exercício do direito e a divergência de pontos de vista é normal e natural, tal como o voto a favor e contra. Temos é de tentar fazer isto cada vez mais um clima de unidade, de fraternidade e de esclarecimento. Acho que é algo que vai adquirir com o tempo. Hoje estiveram na altura da votação mais de 550 sócios mas o Sporting tem milhões de adeptos e mais de 100 mil sócios e creio que a esmagadora maioria pretendem um clube unido que sare e não esfregue feridas, um clube que se aproxime da unidade e do esclarecimento e não que continue a dar pretexto para ser notícia por razões que não queremos. É um caminho a percorrer mas, apesar das divergências e dos momentos de maior efervescência, a Assembleia iniciou-se, decorreu, terminou, produziu os resultados que tinha de produzir. Agora aguardaremos o futuro. A história do Sporting criou fraturas espessas, fundas, que nos obrigam a olhar para fazer tudo para que se regresse à normalidade”, completou sobre o que se passou esta noite.
Por fim, o presidente da Mesa da Assembleia Geral falou também da próxima reunião magna do próximo dia 15. “Procuro ser sempre um otimista. Neste mundo em que estamos, em que vivemos no século da revogação dos segredos, não vale a pena tentar esconder nada. Quero acreditar que os sócios vão também aprender com o que acontece no passado e vão fazendo um esforço para que as Assembleias vão correndo melhor. A função de uma Assembleia Geral é produzir um resultado após debate. Para isso, tem de haver serenidade e respeito. Os sinais que possam ser considerados menos positivos podem ser o impulsionador para que as coisas mudem para melhor, é isso que eu desejo e espero”, concluiu Rogério Alves.