Desde 2006 que Bernardino Ramires anda num “lá para cá” entre Braga e a Serra da Peneda-Gerês. Começou por fazer estes mais de 100 quilómetros de viagem ocasionalmente mas, nos últimos anos, o percurso tornou-se mais comum. Quando se junta com o Observador para uma conversa, há uma frase que repete várias vezes: “Nunca é tarde para começar de novo”. E Bernardino levou o mote a sério. Deixou o emprego estável que manteve durante 25 anos numa multinacional na área da saúde para mudar de ritmo, estando agora na Peneda-Gerês prestes a arrancar com um negócio de turismo rural para explorar a Gavieira. Tudo porque sentiu que “a vida na cidade é desgastante” e que precisava de mudar.
Na sua infância, a serra da Peneda fez parte dos roteiros escolares e sempre deixou memórias no empreendedor. “Lembro-me da Senhora da Peneda em concreto, porque é um lugar que nos deixa muitas memórias, para além do aspeto arquitetónico do monumento. Aquela imagem está comigo desde criança”, conta ao Observador. Foi a partir destas recordações e da vontade em querer transmiti-las aos de fora que nasceu o projeto da Penedino, um negócio de turismo rural que Bernardino criou do zero e contém componentes como trilhos e até uma forma de localizar os animais, que serve essencialmente para os criadores locais, que serve essencialmente para os criadores locais mas também para programas e experiências dos turistas no contacto com os animais em regime livre de pastagem.
“As pessoas ficam cansadas de uma certa rotina profissional e procuram novos caminhos, e a natureza vem ao encontro daquilo que são as minhas origens, da ruralidade onde nasci e cresci”, explicou Bernardino Ramires, acrescentando que o projeto que vai agora inaugurar na Peneda, no início de dezembro, não foi uma ideia que surgiu logo no início, mas sim quando percebeu o cenário de “falta de oferta” que existia naquela zona e a necessidade de dar a conhecer o que ele próprio encontrou em pequeno, mas sem tirar a sua essência. A mudança, explicou ao Observador, “implica ritmos muito acelerados”. “Quando tens uma vida preenchida, repensas um pouco em tudo o que queres fazer até ao fim”.
Foi em 2006 que Bernardino decidiu comprar a primeira das quatro casas devolutas que recuperou na Gavieira. Na altura, o objetivo era diferente: “A ideia era ser o meu canto para estudar, para fazer trabalhos relacionados com a responsabilidade que tinha nesta multinacional”, conta. Só que os planos mudaram e “pouco a pouco a ideia de mudar de vida, de criar um projeto novo na Peneda foi tomando forma”, explicou. Depois de ter “andado a namorar a empresa onde estava para sair e seguir” a sua ideia, Bernardino seguiu em frente.
Durante um fim-de-semana, acompanhado da mulher e dos filhos, conheceu alguém que lhe vendeu a primeira casa e que acabou por introduzi-lo na vida e no quotidiano da Peneda-Gerês. Decidiu reabilitar a habitação, mesmo junto ao rio, onde “não existia nada”. A reabilitação, conta Bernardino, foi feita com materiais locais e com o objetivo de manter as características originais das casas, para “dinamizar a ideia da utilização e aproveitamento de novos materiais enquadrados naquilo que é a identidade das terras e das gentes”. Por noite, o preço de estadia nestas casas varia entre os 100 os 200 euros. ”
A própria população local contribuiu para o projeto e, apesar da estranheza inicial, acompanhou o percurso: “O telhado, por exemplo, é feito por um local que tem muita experiência em carpintaria, o senhor Agostinho. É um homem com 66 anos que trabalha a madeira como um pintor trabalha uma tela”, refere. Na Gavieira, conta, ficou conhecido como o “Doutor do Porto” e procurou sempre dar preferência aos locais nas construções. “Acabei por ter uma relação natural e boa com eles”, referiu. Uma das componentes que Bernardino quis dar a conhecer, especialmente através dos trilhos organizados, foi a história e costumes antigos da população que, “muitas vezes não passam para os livros”. E acrescenta que há quem lhe diga: “Quem me dera que viessem mais pessoas como o senhor, senão isto morre”.
“As pessoas precisam de parar, de voltar às origens”
O negócio da Penedino está dividido em quatro componentes: alojamento local — com o material original de construção das casas–, uma loja de produtos da Peneda-Gerês — como o vinho verde e os doces da região –, a organização de trilhos pedestres na região, desde o Trilho da Peneda ao Trilho das Brandas da Gavieira e, por fim, um sistema de geolocalização dos animais. Esta última componente consiste num detetor que é colocado numa coleira dos animais e que permite fazer o tracking das suas últimas 24 horas, acompanhando os seus movimentos e permitindo garantir que o animal está bem em todos os momentos. Serve, essencialmente, para os criadores da região.
Este é também um produto pensado para dar resposta aos criadores de gado, porque muitas vezes o gado anda solto nos chamados baldios. Principalmente no Inverno, é muito duro visitar os animais e saber se eles estão bem. E estes dispositivos de geolocalização eletrónica de animais permitem, em tempo real, visualizar os animais, as vacas, os cavalos, os póneis e saber também se eles estão em boas condições de saúde”, explica Bernardino Ramires.
O caminho para chegar à criação do negócio, conta o empreendedor, foi como “entrar num comboio que já estava a passar”, tendo em conta as oportunidades de criação de negócios de turismo rural que têm surgido no país. Inicialmente, a empresa terá apenas Bernardino — que investiu entre 300 e 400 mil euros do seu próprio bolso –, mas o objetivo é crescer e contratar mais pessoas para fazer a gestão quotidiana do local. “Gavieira é uma freguesia pequena, tem cerca de 300 votantes e eu espero que com esta iniciativa empresarial vá criar riqueza, vá criar trabalho”, explica, acrescentando que não recorreu a nenhum apoio, para já, mas que contou com a ajuda da Incubadora de Arcos de Valdevez – Incubo –, no sentido de aprender mais sobre os passos a dar, e com o apoio da Junta de Freguesia da Gavieira.
Quando chegou à Peneda, Bernardino encontrou a estranheza da população, mas nunca uma falta de recetividade. O seu objetivo, refere, é “fazer com que os visitantes fiquem com excelentes recordações e repitam a experiência. Que não seja aquela ida fugaz em que se visita e vai-se embora. É preciso ir e voltar a experienciar”.
O meu foco é colocar em marcha uma ideia que vá fazer as pessoas felizes, que as pessoas sintam vontade de viver a natureza, que saiam desta rotina, da azafama citadina, de acordar, entrar numa fila e sabe-se lá a que horas se chega ao trabalho, telefone a toda a hora, a todo o momento. As pessoas precisam de parar, de voltar às origens, mesmo que seja por poucos períodos. É preciso parar para viver, mesmo que sejam dois dias, uma vez por mês.”, refere o responsável pela Penedino.
Bernardino admite que não está no negócio puramente “para ganhar dinheiro”, apesar de saber que esse é o objetivo de quem cria um projeto com fins financeiros: “O negócio está a acontecer, estou a fazer investimentos com paixão. Agora é um investimento, é a semente, e na agricultura sabemos que temos de semear e esperar resultados, eu tenho a certeza que vou ter resultados”.
(Texto editado por Ana Pimentel)
(notícia atualizada no dia 5 de novembro às 11h30 com a correção dos preços do alojamento)