A primeira-ministra britânica, Theresa May, reuniu esta manhã o governo para delinear uma estratégia para o processo de saída do Reino Unido da União Europeia (UE), e esta tarde, pelas 15h30, deverá atualizar os deputados sobre o resultado do Conselho Europeu da semana passada em Bruxelas, quando os líderes europeus concordaram com uma prorrogação da data de saída até 12 de abril.
Na quinta-feira, o Conselho Europeu rejeitou o pedido de Londres para adiar a saída prevista para 29 de março até 30 de junho. O conselho aceita uma prorrogação até 22 de maio — o último dia antes de se iniciarem as eleições europeias —, mas apenas se o acordo de saída for aprovado pelo Parlamento britânico até sexta-feira, 29 de março. Se o acordo voltar a ser chumbado — como já foi duas vezes —, o Reino Unido tem até 12 de abril para apresentar um novo plano ou terá uma saída desordenada (sem acordo). O limite de dia 12 de abril, prende-se com o prazo legal para a apresentação de listas às eleições europeias.
A Comissão Europeia está preparada para esta saída sem acordo e para considerar o Reino Unido imediatamente um país terceiro. O embaixador da União Europeia nas Nações Unidas acredita que há uma vontade comum para fazer tornar o processo o menos doloroso possível para ambas as partes. A verdade é que o Reino Unido tem incentivado os cidadãos da União Europeia a pedirem o estatuto de residente no Reino Unido.
A saída continua a não ser consensual. Theresa May disse que não aceita um novo referendo, mas um dos elementos do governo defendeu-o. Este fim de semana os inglês voltaram a sair à rua para se manifestarem contra o Brexit.
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Uma noite de votação no Parlamento britânico
Antes, está previsto um encontro bilateral com o líder do ‘Labour’ Jeremy Corbyn, que na semana passada recusou participar numa reunião com os restantes partidos da oposição devido à presença do independente e dissidente trabalhista Chuka Umunna.
Os deputados britânicos vão votar esta segunda-feira, pelas 22 horas, os próximos passos sobre o processo do ‘Brexit’, na sequência do chumbo no parlamento a 12 de março, pela segunda vez, do Acordo de Saída negociado pelo governo com Bruxelas. Um grupo de deputados representantes de diferentes partidos, incluindo o Conservador e o Trabalhista, apresentaram uma proposta para o parlamento realizar uma série dos chamados “votos indicativos” para perceber se uma maioria dos deputados consegue concordar em alguma das diferentes opções para o ‘Brexit’. No domingo à tarde, Theresa May convidou colegas do partido Conservador pró-Brexit e opositores do acordo “sobre uma série de questões, incluindo se há apoio suficiente na Câmara dos Comuns para realizar de novo um ‘voto significativo’ esta semana”.
Inicialmente, o governo tinha previsto submeter o Acordo de Saída negociado com Bruxelas uma terceira vez ao parlamento — visto que já tinha sido chumbado em janeiro e março —, mas disse que só o fará quando estiver seguro de que tem o apoio necessário. Teoricamente, May precisa de mais 75 deputados do seu lado, tendo em conta que a 12 de março o acordo foi chumbado por uma diferença de 149 votos, mas não é certo que todos os deputados votem da mesma maneira que há duas semanas atrás.
O governo necessita que o documento seja aprovado no parlamento para poder ratificar o acordo e também para garantir um adiamento mais prolongado da data de saída até 22 de maio proposto pelo Conselho Europeu.
O domingo de May, com defensores e opositores
Presente no encontro de domingo estava um grupo de eurocéticos, incluindo Boris Johnson, o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros que se demitiu em divergência com o plano do governo, bem como os antigos ministros para o ‘Brexit’, David Davis e Dominic Raab, Jacob Rees Mogg, Steve Baker e Iain Duncan Smith.
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Embora não tenham sido anunciados resultados, Boris Johnson mostrou-se insatisfeito com May, alegando, numa coluna de opinião publicada esta segunda-feira no Daily Telegraph, que a primeira-ministra adiou a saída prevista para sexta-feira porque “se acovardou” e sugerindo que a demissão pode ser uma solução. Se ela realmente quer que o seu acordo passe no Parlamento, a primeira-ministra ainda pode apresentar provas convincentes de como a próxima fase das negociações – quando todas as questões-chave vão ser resolvidas – será diferente da primeira”, escreveu, questionando se será possível “continuar com uma equipa de negociação que fracassou tão profundamente”.
Do lado de May no encontro de domingo estava o líder da bancada parlamentar Brandon Lewis, o ministro para o Brexit, Steve Barclay, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, o ministro do Ambiente, Michael Gove, e o ministro do Gabinete, David Lidington. Estes dois últimos foram nomeados pela imprensa britânica no domingo como potenciais sucessores à frente do governo devido à pressão de ministros para Theresa May se demitir, mas ambos negaram o envolvimento em quaisquer planos.
Esta segunda-feira, o tabloide The Sun juntou a voz ao The Times, que no sábado escreveu em editorial que May “deve demitir-se para permitir que um primeiro-ministro interino navegue o país para águas mais seguras” se não conseguir aprovar o acordo. O The Sun, até agora defensor da estratégia da primeira-ministra, defende que “May deve anunciar hoje [segunda-feira, 25] que deixará o cargo assim que o seu acordo para o ‘Brexit’ for aprovado e o Reino Unido estiver fora da UE”.
Membro do governo defende novo referendo
Philip Hammond, ministro do governo de May, defende que um segundo referendo sobre o Brexit é uma opção. “Não tenho certeza se haverá maioria no Parlamento para sustentar um segundo referendo, mas é uma proposta perfeitamente coerente.”
A posição do secretário do Tesouro, membro do Parlamento desde os anos 1990, diverge, no entanto, de Theresa May que rejeita a hipótese de voltar a ouvir a opinião dos eleitores sobre a saída do Reino Unido da União Europeia.
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João Vale de Almeida, diploma na ONU: o Brexit foi uma escolha democrática e deve ser feito de forma organizada
O atual embaixador da União Europeia junto das Nações Unidas defende uma saída do Reino Unido “organizada se possível, coordenada e controlada, em vez de uma saída sem acordo”. João Vale de Almeida recorda que a saída da União Europeia por parte do Reino Unido “resulta de uma escolha democrática” dos cidadãos britânicos, o diplomata considera que agora é tempo de “encontrar as melhores soluções”.
Em declarações à Lusa, à margem do encontro WinterCEmp, promovido pela representação da Comissão Europeia em Portugal durante o fim de semana, em Ílhavo, distrito de Aveiro, o diplomata português João Vale de Almeida reconhece que ambas as partes vão “perder”, mas acredita que vão igualmente “construir uma relação futura”.
“Estamos com vários cenários possíveis”, admite João Vale de Almeida, destacando o que lhe parece óbvio: “é preciso completar esta fase” e “encontrar um modelo de saída” com “um impacto o menos negativo possível” para ambas as partes. A partir daí, as partes vão “avaliar as suas perdas” e “construir uma relação futura”, confia o embaixador da União Europeia junto das Nações Unidas, que cessará funções em outubro.
“O que me parece óbvio hoje, e visto de Nova Iorque ainda mais, é que há uma necessidade absoluta e uma vontade comum, aliás, de ter uma relação muito próxima e muito sólida entre a União Europeia a 27 e o Reino Unido”, frisa.
“Isso faz parte dos nossos interesses, corresponde aos nossos valores comuns e, num contexto multilateral e estratégico, faz todo o sentido. E quando as coisas fazem sentido têm muita força”, acredita.
Se houver uma saída sem acordo, a Comissão Europeia está preparada
A Comissão Europeia concluiu esta segunda-feira os preparativos para um cenário de saída desordenada do Reino Unido da União Europeia (UE), visto que, segundo Bruxelas, essa perspetiva é “cada vez mais provável”.
Paralelamente, a Comissão continua a acompanhar os preparativos a nível das administrações e insta todos os cidadãos e empresas da UE a informarem-se sobre as consequências de um eventual cenário de ausência de acordo e a concluírem os seus preparativos para esta eventualidade. “Embora o cenário de ausência de acordo não seja desejável, a UE está preparada para lhe fazer face“, ressalva a nota.
O Conselho Europeu concordou na quinta-feira com uma extensão do Artigo 50.º até 22 de maio, desde que o Acordo de Saída seja aprovado pela Câmara dos Comuns até sexta-feira. Se tal não acontecer, a UE a 27 estipulou uma prorrogação até 12 de abril e disse que esperava que o Reino Unido indicasse um caminho a seguir antes dessa data para a consideração dos líderes europeus.
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Embora a UE continue a esperar que tal não aconteça, se o Acordo de Saída não for ratificado até sexta-feira, 29 de março, o cenário de ausência de acordo poderá concretizar-se em 12 de abril. A UE preparou-se para este cenário e manteve-se unida durante todos os seus preparativos. É crucial que todos estejam cientes e preparados para as consequências práticas que a ausência de acordo implica”, insiste Bruxelas.
Em caso de ausência de acordo, o Reino Unido tornar-se-á um país terceiro, sem qualquer regime transitório, lembra o executivo comunitário, indicando que todo “o direito primário e secundário da UE deixará de ser aplicável ao Reino Unido a partir desse momento” e que o período de transição previsto no Acordo de Saída não terá lugar, “o que implicará perturbações significativas para os cidadãos e para as empresas”.
Num tal cenário, as relações do Reino Unido com a UE serão regidas pelo direito internacional público geral, incluindo as regras da Organização Mundial do Comércio, e a UE será obrigada a aplicar de imediato as suas regras e tarifas nas fronteiras com o Reino Unido, “incluindo verificações e controlos aduaneiros, sanitários e fitossanitários e a verificação da conformidade com as normas da UE”. “Não obstante os consideráveis preparativos das autoridades aduaneiras dos Estados-Membros, estes controlos poderão causar atrasos significativos na fronteira”, alerta.
Bruxelas recorda ainda que as entidades do Reino Unido deixarão também de ser elegíveis para receber subvenções da UE e participar nos procedimentos de adjudicação de contratos da UE segundo os termos atuais e que, do mesmo modo, os cidadãos do Reino Unido deixarão de ser cidadãos do bloco comunitário e serão objeto de controlos adicionais aquando da passagem das fronteiras para a UE. “Como referido, os Estados-membros efetuaram preparativos consideráveis a nível dos portos e aeroportos para assegurar que esses controlos são efetuados de forma tão eficiente quanto possível. Ainda assim, poderão verificar-se atrasos”, assume Bruxelas.
Até à data, a Comissão Europeia apresentou 19 propostas legislativas, das quais 17 foram adotadas ou acordadas pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, e publicou 90 notas setoriais específicas sobre os preparativos para o Brexit, que fornecem orientações pormenorizadas para os diferentes setores afetados pela saída do Reino Unido da UE.
Na incerteza, o melhor é pedir visto de residência
O Governo britânico iniciou esta segunda-feira uma campanha publicitária para incentivar os cidadãos europeus a pedirem o estatuto de residente no Reino Unido, obrigatório após à saída do país da União Europeia. Seis mil painéis digitais publicitários de grande formato, conhecidos por ‘outdoors’, começaram a ser colocados em todo o país, incluindo nas grandes cidades, antecedendo uma campanha na televisão, rádio, redes sociais e internet no final da semana.
O Ministério do Interior britânico confirmou que o esquema de regularização do estatuto migratório obrigatório para os cidadãos europeus residentes no Reino Unido vai estar em pleno funcionamento a partir de sábado, 30 de março, apesar de a data do Brexit ter sido adiada de 29 de março para 12 de abril. O estatuto de residente permanente (‘settled status’) será atribuído àqueles que vivem há cinco anos consecutivos no Reino Unido, enquanto os que estão há menos de cinco anos no país terão um título provisório (‘pre-settled status’) até completarem o tempo necessário.
As autoridades estimam que cerca de 3,5 milhões de europeus residentes no Reino Unido necessitem de se registar até pelo menos ao final de 2020, dos quais 200 mil já o fizeram durante as fases experimentais. No início deste ano estavam inscritos nos serviços consulares portugueses, em Londres e Manchester, 302 mil portugueses, mas o Governo português calcula que residam no Reino Unido perto de 400 mil portugueses.
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A secretária de Estado da Imigração britânica, Caroline Nokes, disse querer passar a mensagem de que os cidadãos europeus continuam a ser bem-vindos no Reino Unido e que a campanha publicitária é importante “para que todos os que são elegíveis saibam como inscrever-se e recebam o estatuto de que precisam”. “Quero que os cidadãos da UE permaneçam e continuem a chamar ao Reino Unido a sua casa e gostaria de encorajar todos os cidadãos da UE a candidatarem-se assim que o programa entrar em funcionamento”, afirmou a secretária de Estado da Imigração britânica, citada num comunicado.
A campanha, na qual vão ser gastas 3,75 milhões de libras (4,36 milhões de euros), será feita apenas em língua inglesa, mas o ministério do Interior britânico garante que vão estar disponíveis instruções em cada uma das línguas dos Estados membros do Espaço Económico Europeu, que inclui os 27 da UE e também a Noruega, Islândia e Liechtenstein.
O sistema de candidatura à residência permanente, criado pelo ministério do Interior britânico, será inteiramente digital, tendo sido criada uma aplicação móvel em dispositivos com sistema operativo Android para verificar a identidade do candidato, o que faz lendo a informação contida pessoal no ‘chip’ do passaporte biométrico. Em alternativa, foram prometidos mais de 50 centros de apoio para a verificação dos documentos e também um serviço de verificação centralizado para documentos de identificação enviados por correio, incluindo cartões de identidade nacionais como o Cartão do Cidadão português. Mais de 1.500 funcionários públicos vão trabalhar neste esquema, que terá um centro de atendimento centralizado com uma linha telefónica e endereços eletrónicos para esclarecer dúvidas e dar instruções sobre os passos a dar.