As eleições em Espanha estão a provocar polémica na campanha eleitoral em Portugal — e estão a dividir o PSD e o CDS. Este domingo, em entrevista à agência Lusa, Nuno Melo defendeu que o Vox — que conseguiu 12% dos votos dos espanhóis, elegendo 24 deputados — “não é um partido de extrema-direita”, que é “europeísta” e que “defende muito do que defende o Partido Popular espanhol”, razão pela qual “não estranharia, por exemplo, que o Vox viesse a entrar no PPE”, referindo-se à maior família política europeia, o Partido Popular Europeu, de que fazem parte o CDS e o PSD.

As declarações do eurodeputado democrata-cristão atraíram críticas, com o Bloco de Esquerda a acusar Nuno Melo de estar a “branquear” a direita radical espanhola. Ao Observador, esta segunda-feira, Nuno Melo manteve a argumentação de que o Vox não deve ser considerado de extrema-direita por ser contra o aborto, a favor das touradas e a favor do controlo dos fluxos migratórios — mas refreou-se ligeiramente no que à família política europeia diz respeito.

“O que eu disse foi que não me choca que o Vox eleja eurodeputados e que peça para integrar o PPE, porque o PPE tem muitos partidos de várias alas da direita, e até mais do que um partido por país”, explica, dizendo que isso não é o mesmo do que dizer que “deseja” que o Vox integre o PPE. “É normal que partidos à direita queiram pedir adesão ao PPE, mas, se assim for, é preciso avaliar na base de que pressupostos o Vox pedirá a adesão”, afirma.

“Eu não tenho particular simpatia pelo Vox e o parceiro espanhol do CDS é o PP, não o Vox”, sublinha agora Nuno Melo.

Rangel: Vox no PPE? “Nunca”

Esta segunda-feira, o eurodeputado social-democrata Paulo Rangel entrou na discussão. E foi taxativo no distanciamento em relação ao partido espanhol. “[O Vox] não tem lugar [no PPE], nem nunca terá!”, disse, em declarações ao Diário de Notícias. Para o cabeça de lista do PSD e vice-presidente do PPE, o Vox é uma “força de direita radical, um partido nacionalista, que tem um programa anti-Europa“, pelo que é incompatível com os princípios daquela família política europeia.

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Rangel não utiliza a expressão “extrema-direita” por entender, segundo explicou ao Observador, que estes novos movimentos políticos não se tratam de um regresso ao fascismo dos anos 30 e, como tal, é preciso “rigor” na utilização dos termos.

“Estes novos movimentos à direita não são a recuperação do fascismo, mas são altamente negativos”, afirma Paulo Rangel ao Observador.

O cabeça de lista do PSD argumenta que um partido que “de certa forma defende a desigualdade entre homens e mulheres, que além do nacionalismo interno, contra as autonomias, também defende um nacionalismo anti-europeu, e cuja política de migrações é muito diferente da nossa, não tem lugar no PPE“. De “direita” é que o Vox não é, resume.

“Defender os fluxos migratórios é ser de extrema-direita? Ser contra o aborto é ser de extrema-direita?”

Segundo Nuno Melo, o problema do Vox não é o que defende, mas sim o facto de ter “fragmentado, a par do Ciudadanos, a unidade de direita que um dia o PP conseguiu”. “Porque quem manda no Vox [Santiago Abascal] foi presidente da Juventude do PP, filho de um histórico militante do PP, e quase toda a direção do Vox fez parte da ala mais conservadora do PP”, diz, sublinhando que o Partido Popular espanhol conseguiu em tempos unir as várias vertentes da direita espanhola, que agora se fragmentaram, beneficiando a esquerda nas urnas.

Isto quer dizer que, no seu entender, o Vox não é de extrema-direita? Sim. Nuno Melo rejeita “rótulos que uma certa esquerda quer dar” e, por isso, é contra a designação de extrema-direita, partindo ao ataque àquilo que diz ser a extrema-esquerda que saiu reforçada nas eleições espanholas deste domingo. “Quando Pablo Iglesias diz que quer acabar com a economia de mercado, e que a liberdade de expressão passa por não haver órgãos de comunicação social privados, isso não é ser de extrema-esquerda? Quem considera a Venezuela uma democracia exemplar não é de extrema-esquerda?”, atira.

Nuno Melo argumenta também com uma polémica portuguesa. “Marisa Matias e Catarina Martins cantam a morte de Bolsonaro e isso não é assunto, imagino o que seria o Vox ou o PP, ou o CDS, a pedir, cantarolando, sorrindo e contentes, a morte de quem quer que seja”, diz, referindo-se ao cântico do Bloco de Esquerda na marcha do 25 de Abril (“Ó meu rico Santo António! Ó meu Santo Popular! Leva lá o Bolsonaro para ao pé do Salazar”).

Para Nuno Melo, o Vox só é conotado como radical por ser contra o aborto — “mas isso também muitos países, como a Roménia, são de esquerda e têm leis contra o aborto”; por defender tradições conservadoras como as touradas ou a caça — “não me consta que por cá, todos os deputados do PS, PSD ou do CDS que defendam alguma dessas tradições sejam conotados como tal”; ou por pedir a revisão do sistema de autonomias — “e esse é um assunto que está no epicentro do debate mas que outros partidos têm medo de falar por ser contra o politicamente correto”.

Já sobre as políticas migratórias, Nuno Melo afirma que nos países do sul confunde-se migrações com refugiados e “é óbvio que as migrações têm de ser controladas por lei”. “Defender o controlo do fluxo migratório é ser de extrema-direita? Isso também eu defendo”, diz ao Observador.

Lendo o programa do Vox (“100 medidas para a Espanha viva”) encontra-se mais do que o mero controlo do fluxo migratório, com aquele partido espanhol a defender, por exemplo, que nenhum imigrante que tenha entrado no país de forma ilegal possa alguma vez legalizar-se e a criação de um “muro” em Ceuta e Melilla. O Vox defende ainda a “publicação de dados sobre a nacionalidade e origem nas estatísticas de todos os delitos registados no país”. No capítulo sobre migrações e controlo de fronteiras, o Vox é a favor de “quotas para a imigração, privilegiando as nacionalidades que partilhem o idioma e laços culturais com Espanha”. Quanto à Europa, o Vox defende “o abandono de organismos supranacionais se forem contrários aos interesses de Espanha”. E, quanto às mulheres, é a favor da “revogação da lei sobre violência de género e qualquer regra que discrimine um sexo em detrimento de outro” e a “supressão de todos os organismos feministas radicais subsidiados”.