O Manchester City entrava na Community Shield como defensor absoluto do(s) título(s): começando pela Premier League, passando pela Taça de Inglaterra, pela Taça da Liga e depois pela própria Community Shield, a Supertaça inglesa. Face à total hegemonia dos citizens no que toca às competições internas, o adversário deste domingo e do primeiro jogo a contar da temporada era o Liverpool, o segundo classificado da Liga inglesa e segunda metade da dupla que na época passada levou todas as decisões sobre o campeão inglês até ao último dia. Contas feitas, era o duelo entre o vencedor de todas as competições inglesas do ano passado e o vencedor da Liga dos Campeões: mas as duas equipas estavam bem menos equiparadas noutro tópico.

A meio da semana passada, a FIFA anunciou os nomeados para o The Best relativo à temporada passada, ou seja, os dez melhores jogadores do período entre agosto de 2018 e junho de 2019. Entre os nomes escolhidos, com os habituais Cristiano Ronaldo e Lionel Messi à cabeça, estavam Mané, Salah e Van Dijk, três das traves mestras do Liverpool que na época anterior ofereceram a Liga dos Campeões a Jürgen Klopp; e nenhum jogador do Manchester City. As vozes críticas, principalmente as portuguesas, levantaram-se a favor de Bernardo Silva, que para além de ter conquistado tudo em Inglaterra ainda ganhou a Liga das Nações em Portugal — mas também em defesa de Sterling e Agüero, com especial insistência no argentino, que realizaram temporadas acima da média. Ainda assim, no que diz respeito aos nomeados para o prémio de melhor jogador do ano, o Liverpool entrava na Community Shield com vantagem.

A Supertaça serve também — para além de ser o dia em que as equipas apresentam de forma oficial os novos equipamentos — para uma espécie de balanço no que toca a saídas e entradas, renovações de plantel e ainda para estreias competitivas de novos reforços. E, neste particular, Liverpool e Manchester City entravam em Wembley algo equiparados, com poucas movimentações no mercado de verão e pouca preponderância no que toca aos maiores negócios: os reds limitaram-se a resgatar o defesa Van den Berg por pouco mais de um milhão de libras e os citizens estenderam um bocadinho mais a corda e contrataram Rodri ao Atl. Madrid por mais de 60 milhões de libras (depois de desistirem da corrida por Bruno Fernandes). Ora, fazendo as contas mais uma vezes, Rodri era mesmo o único reforço de parte a parte que se estreava de forma competitiva nesta Community Shield — e logo a titular.

Klopp lançava Joe Gomez ao lado de Van Dijk na defesa, Wijnaldum, Fabinho e Henderson eram os responsáveis pelo meio-campo e Origi estava com Salah e Firmino no ataque, no lugar de Mané, que ainda não foi reintegrado depois de voltar da CAN. Do outro lado, Guardiola apostava em Claudio Bravo no lugar de Ederson na baliza, Rodri era ladeado por David Silva e De Bruyne e Leroy Sané acompanhava Sterling e Bernardo na frente, com Gabriel Jesus e Agüero a começarem no banco. O jogo começou da mesma forma que se esperava: vivo e com as duas equipas com alguma pressa para chegar ao golo inaugural, de forma a anular um sempre provável golo adversário que pudessem sofrer. E o Manchester City demorou pouco mais do que 10 minutos a chegar à vantagem, deixando bem patente que a eficácia que foi letal na temporada passada e que garantiu a vitória na Premier League permanece um dos principais ativos da equipa de Guardiola.

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Sterling, um dos jogadores deixados de fora da lista final de nomeados ao The Best, concretizou uma daquelas jogadas com poucos toques que dificilmente permite intervenções adversárias (12′). Tudo começou com um livre, Kyle Walker abriu para Zinchenko no corredor esquerdo, o lateral cruzou, Silva ajudou com um último toque e Sterling finalizou já praticamente na cara de Alisson (num lance onde o guarda-redes brasileiro parece não ficar totalmente isento de culpa). O golo do avançado inglês trouxe uma alegria para Guardiola e o City que foi rapidamente acompanhada por uma preocupação que é mais problema para o Bayern Munique do que propriamente para o treinador espanhol e os citizens: Leroy Sané, que nas últimas semanas tem sido constantemente associado a uma ida para o campeão alemão, lesionou-se depois de uma jogava dividida com Alexander-Arnold e foi substituído por Gabriel Jesus logo após o golo de Sterling. Sem se conhecer para já a extensão da lesão de Sané, já terão soado os alertas em Munique — assim como na cabeça do jogador alemão, que pode ver a transferência cair por terra e a próxima temporada ameaçada.

O Manchester City soube manter-se enquanto a melhor equipa do jogo durante toda a primeira parte, mesmo com Salah a protagonizar três ocasiões de golo que poderiam ter dado empate. A ida para o intervalo apareceu numa altura em que os ânimos começavam a aquecer, com muitas entradas fortes e Guardiola a ser continuamente avisado pelos árbitros devido às intervenções junto à linha técnica, e tanto Liverpool como Manchester City voltaram para a segunda parte sem alterações. Já no segundo tempo, Sterling ainda acertou no poste (num lance que acabou por ser anulado por fora de jogo) mas foram os reds a ficar muito perto do empate de forma quase consecutiva, primeiro com Van Dijk a cabecear à trave (57′) e depois com Salah a atirar ao poste com um remate de fora de área (58′). Klopp aproveitou esta fase de superioridade do Liverpool, que entretanto tinha assentado arraiais no meio-campo defensivo do City, para lançar Matip e Naby Keita e tentar segurar de vez um setor intermédio que até então parecia demasiado volátil para apostar de forma definitiva na reviravolta. A aposta — e as substituições — foi recompensada.

O empate apareceu na sequência de um livre, tal como tinha acontecido com o golo do Manchester City, e a insistência de Van Dijk na esquerda. O central holandês bombeou a bola para o coração da área de Claudio Bravo e Matip cabeceou para recolocar o empate no marcador de Wembley (77′). Daí e até ao apito final do tempo regulamentar, o Liverpool empurrou os citizens para o próprio meio-campo, com a equipa de Guardiola a depender totalmente dos contra-ataques e de lances rápidos de transição para conseguir criar perigo. Kyle Walker atirou tudo para as grandes penalidades já depois dos 90′, com um corte acrobático junto à linha de golo que evitou a vitória do Liverpool por intermédio de Salah.

Nas grandes penalidades, Shaqiri, Lallana, Chamberlain e Salah marcaram para o Liverpool, Gundogan, Bernardo Silva, Phil Foden, Zinchenko e Gabriel Jesus marcaram para o Manchester City e acabou por ser Wijnaldum, um dos heróis dos reds que garantiram a reviravolta histórica contra o Barcelona na meia-final da Liga dos Campeões da temporada passada, a permitir a defesa de Bravo e a carimbar a vitória dos citizens. O conjunto orientado por Pep Guardiola conquistou o sexto (!) título interno consecutivo e continua totalmente invicta no que toca às competições inglesas: e, mais do que isso, envia em carta registada este troféu para a FIFA, na revolta dos esquecidos Sterling, Bernardo e companhia que não integraram a lista de nomeados ao prémio de melhor jogador do ano.