As moléculas de água são abundantes no universo e até já tinham sido detetadas nos planetas gigantes gasosos, mas esta é a primeira vez que se deteta num exoplaneta na zona habitável da sua estrela — ou seja, à distância certa para que seja possível a existência de água no estado líquido (nem demasiado frio, nem demasiado quente). A descoberta foi feita em paralelo por duas equipas e publicada, esta quarta-feira, na Nature Astronomy e no arXiv.org, um repositório de artigos científicos.
“O grande salto aqui é que se trata de um planeta mais pequeno [do que os gigantes gasosos, como Júpiter], que está à distância certa da sua estrela para se poder dizer que está na zona habitável”, diz ao Observador Nuno Santos, investigador no Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, num comentário sobre a descoberta.
Quanto mais pequeno o planeta, menor a sua atmosfera, e quanto menor a atmosfera, mais difícil é estudar os sinais que permitiram encontrar e identificar as moléculas nessa camada. Daí que esta descoberta seja tão interessante para o investigador: trata-se de um planeta relativamente pequeno — ainda assim, o dobro do tamanho da Terra e oito vezes a sua massa —, com uma atmosfera pequena, mas, ainda assim, foi possível encontrar sinais que indicavam a presença de água.
De uma forma simplificada, o que os cientistas analisaram foi a luz da estrela que atravessa a atmosfera — mas com uma estrela muito menos luminosa que o Sol. A atmosfera funciona como um filtro em que cada molécula absorve a radiação da estrela de maneira diferente. Ler as cores que o filtro deixa passar, que é como quem diz analisar o espetro de luz, permite perceber que moléculas estão presentes, porque cada uma tem um comportamento próprio — é quase como comparar impressões digitais.
Com os resultados obtidos a partir do Telescópio Espacial Hubble, a equipa do University College London espera poder usar equipamentos mais sensíveis e procurar outras moléculas que não tenham sido agora encontradas. “Os resultados agora apresentados confirmam a existência de uma atmosfera detetável em torno do [planeta] K2-18 b, tornando-a um dos mais interessantes alvos para futura caracterização atmosférica com o Telescópio Espacial James Webb ou a missão Ariel da Agência Espacial Europeia”, escreveram os autores na Nature Astronomy.
O planeta K2-18 b, a orbitar uma estrela anã-vermelha, foi descoberto em 2015, pelo telescópio espacial Kepler, e encontra-se a 34 parsec da Terra — qualquer coisa como mil biliões de quilómetros. Como está a “apenas” 21 milhões de quilómetros da sua estrela, encontra-se dentro da zona habitável daquele sistema estelar e tem uma temperatura estimada entre -73,15 e 46,85 graus Celsius.
Nuno Santos lembra, no entanto, que estar na zona habitável e ter vapor de água na atmosfera não chega para dizer que pode ter vida. Basta olhar para Vénus, no nosso sistema solar, que cumpre estes dois requisitos, mas que é claramente incompatível com a existência de organismos vivos.
Para existir vida como a conhecemos na Terra, o planeta também tem de ter água no estado líquido. Mas o K2-18 b pode não ser um planeta rochoso como a Terra. Tem um núcleo denso, mas o resto será atmosfera, o que torna mais difícil a presença de água líquida. Além disso, haver água não quer dizer que exista vida.
“Detetar vida é um desafio muito interessante, porque não é muito claro qual é o elemento que podemos detetar que nos diga sem ambiguidade que existe vida nesse planeta”, diz Nuno Santos. “Provavelmente o melhor candidato neste momento é o oxigénio. Se detetarmos oxigénio num planeta parecido com a nossa Terra poderá ser uma indicação que existirá vida a produzir esse oxigénio”, continua. “Mas mesmo isso não é completamente garantido.”