O Presidente da República disse esta quarta-feira que o Conselho de Estado não recebeu qualquer solicitação para que o primeiro-ministro seja ouvido no caso Tancos, explicando que uma decisão sobre um eventual pedido não implica uma reunião deste órgão.
“Tanto quanto eu sei até à hora da minha saída de Lisboa, não tinha chegado, ainda, uma solicitação ao Conselho de Estado. Quando chega uma solicitação dessas — e chegam inúmeras porque são 19 os membros do Conselho de Estado — o Conselho de Estado é chamado a autorizar ou não autorizar o depoimento como testemunha, neste caso, mas também, se fosse o caso, a intervenção processual como arguido”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.
O Presidente da República, que falava no Porto, respondia à pergunta dos jornalistas: “Deve ou não o primeiro-ministro ser testemunha presencial no caso de Tancos?”.
“Isso [referindo-se a pedidos para audição enquanto testemunha] tem acontecido, ao longo dos anos, com inúmeros membros do Conselho de Estado e com inúmeros primeiros-ministros. O Conselho de Estado, depois de fazer circular esse pedido, pelos membros — não podendo reunir para cada caso porque são muitos casos que aparecem — comunica ao tribunal competente se sim” ou não, acrescentou Marcelo Rebelo de Sousa.
Na terça-feira foi tornado público que o juiz Carlos Alexandre quer que o primeiro-ministro, António Costa, deponha presencialmente no Tribunal Central de Instrução Criminal como testemunha do ex-ministro da Defesa e arguido no caso de Tancos, Azeredo Lopes, que será ouvido a 03 de fevereiro.
Segundo o despacho de abertura de instrução, a que a agência Lusa teve acesso, Carlos Alexandre enviou ao Conselho de Estado, do qual o primeiro-ministro faz parte por inerência do cargo, um pedido de “autorização para prestação de depoimento, presencial, (de António Costa) como testemunha” do arguido Azeredo Lopes.
O magistrado explica que, dada a complexidade da matéria e a eventual necessidade de confrontação das pessoas com a prova documental dos autos, todas as declarações terão lugar nas instalações do Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), não admitindo diligências depoimentos por escrito ou por videoconferência.
Também na terça-feira, de acordo com informações avançadas pela assessoria de imprensa do Presidente da República, foi divulgado que ainda não tinha chegado ao Conselho de Estado qualquer pedido do TCIC para ouvir o primeiro-ministro como testemunha, algo confirmado esta quarta-feira por Marcelo Rebelo de Sousa.
“Se chegar o pedido, o Conselho de Estado decidirá se está autorizado um membro do Governo a depor e como é a forma como depõe. Isto demora algum tempo, o mais curto possível, mas ainda não começou a correr porque ainda não tinha, tanto quanto eu sei, chegado pedido”, sublinhou Marcelo Rebelo de Sousa à saída da reitoria da Universidade do Porto onde participou na cerimónia de atribuição do título de Doutor Honoris Causa ao escritor portuense Mário Cláudio.
A próxima reunião do Conselho de Estado está prevista para o dia 31 de janeiro, dia em que tomarão posse os membros eleitos pela Assembleia da República. De acordo com o artigo 15.º do Estatuto dos Membros do Conselho de Estado, órgão que o primeiro-ministro integra por inerência, “os membros do Conselho de Estado não podem ser peritos, testemunhas ou declarantes sem autorização do Conselho”.
Sobre o caso Tancos, no calendário da instrução, uma fase facultativa do processo para recolha de prova que pode ser requerida pelos arguidos para contestar a acusação perante um juiz, os interrogatórios começam no dia 8 de janeiro e previsivelmente terminam a 13 de fevereiro, estando agendadas duas diligências por dia.
O antigo diretor da Polícia Judiciária Militar (PJM) e arguido Luís Vieira será ouvido no dia 14 de janeiro. Para dia 10 de fevereiro está marcada a inquirição do arguido Vasco Brazão, ex-porta-voz da Polícia Judiciária Militar, que no pedido de instrução não requereu a produção de prova nem o seu próprio interrogatório.
O processo tem 23 acusados, incluindo Azeredo Lopes, Luís Vieira, Vasco Brazão e o ex-fuzileiro João Paulino, que estão acusados de um conjunto de crimes que vão desde terrorismo, associação criminosa, denegação de justiça e prevaricação até falsificação de documentos, tráfico de influência, abuso de poder, recetação e detenção de arma proibida.
O caso do furto do armamento de guerra dos paióis de Tancos foi divulgado pelo exército em 29 de junho de 2017 com a indicação de que ocorrera no dia anterior, tendo a alegada recuperação do material de guerra furtado ocorrido na região da Chamusca, Santarém, em outubro de 2017, numa operação que envolveu a PJM, em colaboração com elementos da GNR de Loulé.