Francisco Rodrigues dos Santos, líder da Juventude Popular e candidato à liderança do CDS, partilhou esta quinta-feira uma fotografia ao lado da noiva, Inês Vargas, com a legenda: “Estabilidade emocional”. Trata-se de uma referência à notícia, publicada esta quinta-feira, segundo a qual o banco Crédito Agrícola pagava à mulher do seu presidente uma avença para garantir “estabilidade emocional” ao marido. Na crítica que fez nas redes sociais, o candidato à liderança do CDS não referiu, porém, que a sua namorada é vice-presidente na direção da Juventude Popular a que preside — e foi avençada do CDS na câmara municipal de Lisboa entre dezembro de 2017 e 31 de outubro de 2019, período em que recebeu 27.791,65 euros.
Contactado pelo Observador, Francisco Rodrigues dos Santos, conhecido na JP como ‘Chicão’, não vê qualquer incompatibilidade no facto de a noiva fazer parte da sua direção e nega ter tido influência na escolha dela para assessora da vereação do CDS. Inês Vargas considera este um “não assunto”, já que “tinha um contrato de prestação de serviços legal”, que cumpriu, e sobre os quais pagou “os respetivos impostos”. Refira-se que no caso do Crédito Agrícola, que está na base do post do candidato a líder do CDS, também não estava em causa qualquer ilegalidade.
De acordo com o contrato publicitado no site Base.gov, Inês Vargas — nutricionista de profissão — foi contratada para prestar “assessoria na área da educação, ambiente e juventude” no gabinete dos vereadores do CDS-PP, liderados por Assunção Cristas. A avença, de acordo com o mesmo contrato, era de 1150 euros mensais, aos quais acresce IVA (custo de 1414,5 euros mensais para a autarquia lisboeta). Inês Vargas saiu da câmara no final de outubro deste ano — se tivesse cumprido o contrato na totalidade estavam em causa 55.391,65 euros de salários em quatro anos. Segundo fontes do CDS que conhecem a realidade da autarquia “Inês Vargas foi indicada pela JP e pelo próprio ‘Chicão’ e raramente aparecia nas instalações da autarquia”.
Mas Francisco Rodrigues dos Santos nega ter tido influência na escolha da namorada: “De maneira nenhuma. A Inês foi convidada pelo grupo da vereação para integrar o gabinete, colaborando na prestação de serviços de assessoria nas áreas relacionadas com a juventude”, afirma ao Observador. O líder da Juventude Popular e candidato a líder do CDS recorda que o contrato da noiva “foi assinado pela presidente do partido”, Assunção Cristas, e que quer “acreditar que os assessores do agrupamento político do CDS na Câmara Municipal de Lisboa estão lá por mérito próprio, dado que todos eles foram convidados pessoalmente pela equipa da vereação”.
O líder da Juventude Popular destaca ainda que “a Inês tomou a liberdade de voluntariamente cessar as suas funções na Câmara Municipal um ano e 10 meses depois de as ter iniciado, pois nunca encarou a atividade política como uma profissão e entendeu estarem reunidas as condições para se dedicar em exclusividade à sua vocação profissional — a carreira de nutricionista — , abrindo lugar a que outra pessoa ocupasse a vaga que deixou, como veio a suceder”.
Fonte centrista conhecedora do dia a dia dos gabinetes do CDS na autarquia afirma que, “ao contrário de outros membros da JP que trabalham na autarquia, como Francisco Laplaine, que trabalha muito, ou Diana Vale, que também está sempre na câmara, Inês Vargas raramente vai às instalações”. “Nunca a vi lá”, diz outra fonte que trabalha no edifício onde funcionam os gabinetes da vereação.
O Observador questionou também o vice-presidente da JP, Francisco Laplaine Guimarães, sobre o facto de Inês Vargas não ser vista nas instalações com regularidade. O dirigente da JP afirma que a função não exige uma presença permanente no local: “É um contrato de prestação de serviços, idêntico ao meu, que pela sua natureza é um contrato flexível, e não obriga a uma permanência diária nas instalações da autarquia”. Mais: segundo ele, Inês Vargas “cumpria as tarefas que lhe pediam e onde lhe eram exigidas”.
O vice-presidente da JP acrescenta ainda que este “é o registo seguido pela generalidade dos colaboradores do gabinete” e destaca que, mesmo depois de cessar funções, Inês Vargas “continua a ser muito solícita a apoiar o partido e a jota em Lisboa, não olhando a meios nem a horários para colaborar com todos nós”.
Ao Observador, Inês Vargas considera este um “não assunto” e destaca que fez e esteve “sempre” onde foi “solicitada, embora não houvesse obrigatoriedade de os assessores se encontrarem diariamente na câmara (como o nosso próprio contrato menciona)”. Este regime, justifica, “é aplicado a todos os assessores” e o seu caso não foi “exceção”. A vice-presidente da JP destaca ainda: “Nunca foram apontadas falhas ou críticas ao meu trabalho e portanto só pode ter segundas intenções este assunto estar a ser levantado em vésperas do congresso, logo quando há tantos assessores na mesma situação”.
“A Inês é a pessoa que diverge mais vezes de mim”
Francisco Rodrigues dos Santos partilha até a direção da JP com a noiva, que já foi vogal da direção mas atualmente é vice-presidente. O líder da Juventude Popular não vê nenhuma incompatibilidade em fazer parte da mesma direção da noiva, já que Inês “não foi nomeada para as funções que ocupa na JP” e “foi eleita entre os seus pares com maiorias claríssimas”.
O presidente da Juventude Popular tem, no entanto, influência na escolha da equipa que o acompanha na direção da estrutura, incluindo os vice-presidentes. Apesar disso, o líder da Juventude Popular destaca: “A Inês é filiada e militante ativa da Juventude Popular antes de mim, tendo iniciado o seu percurso mais cedo do que eu. De resto, foi na JP que eu a vim a conhecer, sendo ela, já na altura, uma destacada dirigente quer da JP, quer do CDS: era presidente da concelhia da JP de Rio Maior, da qual foi a fundadora e sua primeira presidente com apenas 14 anos”. E continua, numa descrição do currículo partidário da namorada: “Aos 18 já era deputada municipal pelo CDS — cargo para o qual foi reeleita e que ainda hoje exerce; era secretária da concelhia do CDS e integrava os órgãos distritais do partido em Santarém, na qualidade de vogal da comissão política – exatamente a mesma posição que ainda ocupa à data de hoje”.
Francisco Rodrigues dos Santos diz que “seria uma injustiça prejudicar a Inês, que é reconhecida por todos como um dos quadros mais valiosos e promissores da nova geração e que já possuía um lastro significativo na JP e no CDS anterior ao nosso relacionamento, pela circunstância de sermos namorados”.
O líder da JP considera que “a simples insinuação de que a Inês beneficiou de qualquer outro critério para ascender politicamente que não fosse mérito e o capital de credibilidade próprio” é “um argumento sexista, que ofende todas as mulheres, como um insulto ao trabalho e ao esforço que dedicou ao longo dos anos, em sacrifício pessoal”. E acrescenta: “A Inês é um exemplo da mulher moderna, empreendedora, líder, inteligente, competente e determinada. Tanto assim é que sempre foi conhecida pela Inês, que já estava solidamente afirmada politicamente antes de mim, e não pela namorada do Francisco.”
Sobre o facto de serem logo dois votos se agirem como casal nas reuniões da direção da Juventude Popular, Francisco Rodrigues dos Santos começa por destacar que “não é caso inédito na história da JP, nem tão pouco caso único atualmente”. A relação, garante, nunca interferiu na opinião de ambos ou na tomada de decisões. O líder da JP diz que “é facilmente comprovável pelos demais membros da comissão política nacional da JP” que “a Inês é a pessoa que diverge” do noivo e “talvez seja” a sua “mais acérrima crítica”. Inês Vargas, destaca Francisco Rodrigues dos Santos, “não é parte integrante de ninguém, e nas reuniões ocupa o seu lugar nas exatas condições de igualdade que os demais vice-presidentes”.
Francisco Rodrigues dos Santos é líder da Juventude Popular desde dezembro do 2015 e, no passado dia 17, apresentou a sua candidatura à liderança do CDS. O partido vai escolher o sucessor de Assunção Cristas no próximo congresso, no final de janeiro.