De todos quantos não negaram à partida a ciência da viabilização e aceitaram negociar com o Governo, nenhum partido ficara satisfeito com a proposta, mas todos deixaram em aberto o que fariam na votação marcada para 10 de janeiro, nomeadamente PCP, Bloco de Esquerda, Verdes, PAN e Livre. Agora, começa a haver decisões.

O cenário das várias conjugações possíveis para fazer passar o Orçamento começa a redefinir-se. “Não há condições para votar a favor deste Orçamento do Estado”, anunciou este sábado Catarina Martins, ficando assim em aberto dois cenários possíveis: o voto contra do BE ou a sua abstenção, posição que não inviabiliza a eventual aprovação do documento. Quanto ao Livre, este reunido no sábado, mas não deixou a posição totalmente fechada, já disse que não será “obstáculo” e agora afirma que o sentido de voto dependerá das garantias dadas pelo governo durante a semana.

Atualizamos as contas aos votos que podem ser cruciais nesta fase (a direita só entra nestas contas por três deputados): basta que 15 deputados se abstenham para a bancada do PS ser suficiente para aprovar o OE.

PS a favor, todos contra: OE chumba

Que os socialistas votarão a favor da proposta do seu Governo, não há dúvidas. Mas, já se sabe, não chega. São apenas 108 deputados, faltam oito para a maioria parlamentar que permitiria aprovar a proposta de OE sem ajudas. Se as ameaças dos partidos à esquerda fossem levadas à letra e todos votassem contra ou mesmo apenas os dois com maior peso, PCP e BE, a proposta teria um redondo chumbo. Mas o Governo tentou acautelar isso, e deixou normas em aberto e autorizações legislativas na proposta de Orçamento, como quem diz que ainda há caminho para fazer na especialidade. Ao Observador, fonte do Governo disse há semanas que “este ano há mais especialidade” e que, com a mudança do quadro político pós-legislativas, a estratégia de todos foi diferente. A do Governo: “Reunimos, ouvimos, incluímos e negociaremos na especialidade”. Há esperança que a esquerda possa voltar a juntar-se. Na mesma linha daquilo que António Costa defendeu a partir da Grécia, o PS não vê motivos para haver uma rutura à esquerda, num Orçamento que “não traz nenhum retrocesso”, segundo disse o deputado João Paulo Correia. Nesta fase, ainda não se sabe se a promessa de negociações na especialidade convence os partidos à esquerda — só se sabe que o BE, pelo menos, não ficou suficientemente convencido para votar a favor.

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PS único a favor, abstêm-se BE, PCP, PEV e Livre: OE passa

Se a esquerda toda se abstiver, a maioria absoluta consegue-se com 100 votos a favor da proposta de Orçamento. E, assim, o PS seria suficiente para a conseguir. No Governo, a expectativa era a de que o BE não vote contra o primeiro Orçamento da legislatura, porque isso poderia retirar margem negocial e de reivindicação em futuras negociações. Este sábado ficou a saber-se que voto a favor do BE não haverá de certeza — mas a abstenção é uma hipótese. No caso do PCP, o próprio líder da bancada parlamentar já fez referência ao facto histórico de os deputados comunistas nunca se terem abstido num OE. Mas João Oliveira acrescentou: “O facto de nunca termos optado pela abstenção não é nenhuma projeção para o futuro: é uma constatação em relação ao passado”. Se a esquerda toda seguir esse caminho, o OE passa.

PS a favor, PCP e Verdes abstêm-se e BE vota contra: OE só passa com PAN

Não é suficiente para a proposta do Governo passar. E aqui entra o elemento que poderia ser decisivo. O PAN nunca fez formalmente parte da “geringonça”, mas votou muitas vezes ao lado do governo na anterior legislatura. Agora, com quatro deputados, é uma peça-chave que António Costa tem levado muito em conta nesta equação de cenários. No quadro em que a esquerda se divida entre a abstenção e o voto contra, o PS ficaria a precisar de dois deputados e poderia contar com o PAN para garantir a aprovação na generalidade. No entanto, dificilmente os comunistas ficariam isolados a segurar o Governo socialista, sobretudo depois de um resultado eleitoral nas legislativas que fez a bancada comunista (PCP e Verdes) reduzir para 12 deputados e com o seu rival à esquerda, o BE, a votar contra. É, por isso, um cenário improvável.

PS a favor, BE abstém-se. PCP e Verdes votam contra: OE passa

Já o contrário é aritmeticamente possível. Com o Bloco a abster-se, o PS necessitaria apenas de 106 deputados para ter a maioria absoluta na votação do Orçamento. Tendo 108, a proposta estaria mais do que garantida.

PS e PCP a favor e BE chumba: OE passa

Basta que um dos dois principais parceiros da anterior legislatura se junte no apoio ao Governo para o OE passar. Mesmo que o outro partido da esquerda vote contra ou se abstenha, dois cenários possíveis para o Bloco de Esquerda. Mais uma vez, ter um dos parceiros a segurar o Governo e outro fora deste apoio é uma hipótese pouco provável. E sobretudo com o BE e o PCP incomodados com o Orçamento.

PS a favor, BE, PCP e Verdes contra. Livre, PAN e PSD-Madeira a favor: OE passa

É a solução mais criativa (e envolve a direita), mas há quem entre os partidos da esquerda faça estas contas, apesar de o Livre já dito ao Observador que descartava esta hipótese e de a abstenção ser o sentido de voto mais provável. A conjugação de peças justificava-se pela posição do PSD-Madeira, que pela voz de Miguel Albuquerque não descartou negociar com o Governo de António Costa questões regionais e, na sequência disso, avaliar um voto a favor do Orçamento. O presidente do Governo Regional da Madeira chegou mesmo a congratular-se publicamente com a inclusão da verba para o cofinanciamento do novo hospital no OE. No Bloco de Esquerda, medidas como o aumento do IVA nas touradas — uma das bandeiras do PAN — foram vistas como uma cedência importante ao partido de André Silva que pode mudar as contas todas, caso a ideia inicial do PSD-Madeira se materializasse também. Com esta conjugação de forças (PS, PAN e três deputados do PSD eleitos pela Madeira), só faltaria o Livre para que a proposta passasse. A esquerda podia votar contra que nada travaria o OE do Governo.