“O Tribunal de Contas quer que a Segurança Social se comporte como especulador imobiliário“, acusou esta manhã Fernando Medina na conferência de imprensa marcada para responder à auditoria do Tribunal de Contas (TdC) à gestão do património imobiliário da Segurança Social (SS) que, esta quarta-feira à noite, revelou um acordo assinado em junho de 2018 entre a autarquia e o ministério então encabeçado por José António Vieira da Silva.

De acordo com o tribunal, o negócio acordado pelas duas entidades prevê a cedência à autarquia de 11 imóveis na capital para arrendamentos com a duração de 10 anos, renováveis pelo mesmo tempo, com períodos de carência — ou seja, de isenção do pagamento de quaisquer rendas — que podem chegar aos 24 meses. Mais do que isso: de acordo com o mesmo documento, a Câmara de Lisboa tem ainda opção de compra desses mesmos imóveis, a valores 3, 5 milhões de euros inferiores aos preços de mercado, o que, para os juízes, privilegia a política de arrendamento acessível em Lisboa “em detrimento da receita e consequente sustentabilidade da Segurança Social”.

Auditoria. Segurança Social fez acordo para vender imóveis à Câmara de Lisboa abaixo do valor de mercado

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Garantindo que o negócio, que foi “visado pelo TdC”, foi fechado depois de terem sido feitas quatro avaliações aos referidos imóveis e em cumprimento de todos os preceitos legais, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa acusou o TdC de se pronunciar de forma política — “O que é absolutamente inaceitável”, frisou.

“Vem dizer o TdC, no fundo, que a SS não se devia ter comportado como uma instituição pública destinada a contribuir, como consta do programa do governo e da missão da SS, para resolvermos uma grave crise de habitação às classes médias e aos jovens da cidade de Lisboa. O que o TdC vem dizer é ‘não, não deviam ter contribuído para termos mais casas a preços acessíveis’ e vem dizer que a SS devia ter especulado no mercado imobiliário, utilizando as técnicas todas que tivesse de utilizar para hipervalorizar o seu património. Isto é uma conceção completamente errada do que é o papel das instituições e da SS mas também é uma conceção errada do que é o TdC. O TdC está neste relatório a fazer política não tendo sido eleito para isso”, começou por acusar Fernando Medina.

Depois de explicar que o negócio foi fechado por “mais de 57 milhões de euros” e de assegurar que ” a segurança social teve lucro nessa operação e libertou 11 imóveis do seu património”, o autarca lisboeta continuou o ataque ao TdC: “Era bom que o TdC fizesse a sua função, que é apreciar da legalidade dos atos, apreciar dessa sua compatibilidade com a lei e trabalhar em tempo útil: nós continuamos à espera do visto do TdC que está para recurso há quase um ano relativamente a uma operação de renda acessível na Rua de São Lázaro. É lamentável que o TdC gaste o seu tempo e os seus recursos a fazer relatórios que são de baixíssima qualidade técnica e que têm um certo panfleto de natureza política“.

Questionado sobre o assunto, Medina negou ainda quaisquer alterações feitas ao contrato originalmente assinado em junho de 2018 e garantiu que o “acautelar dos interesses patrimoniais da SS” foi “colocado como linha vermelha intransponível pela SS no início das negociações”.

Recorde-se que, no texto da auditoria, o TdC comparou a carência de rendas a “um subsídio ao programa de arrendamento acessível do município” concedido pela Segurança Social.

Desde que, em janeiro do ano passado, foi recusado o visto prévio ao Programa de Rendas Acessíveis previsto para a Rua de São Lázaro, que previa a recuperação de 16 edifícios e a criação de 131 fogos com rendas entre os 100 e os 350 euros, que o discurso de Fernando Medina para com o Tribunal de Contas tem endurecido. Em dezembro de 2019, o presidente da Câmara de Lisboa chegou mesmo a juntar-se a Rui Moreira para, em conferência de imprensa conjunta, na capital, exigirem que o Tribunal de Contas “despachasse favoravelmente” os projetos do Programa de Rendas Acessíveis e do Matadouro.