Um mês e depois depois de ter sido condecorado por Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, por todos os feitos alcançados no Brasil (que vão mais longe do que as conquistas pelo Flamengo), Jorge Jesus voltava a ter os holofotes sobre si. E se em 2019 ganhou dois títulos em 24 horas, um deles sem ter sequer entrado em campo, agora o desafio era tão ou mais aliciante: três troféus em apenas dez dias. Este domingo jogava o primeiro.

Jesus, o Comendador. As ligações ao Infante D. Henrique, o convite aos presidentes, a paixão no Flamengo e o peso de uma medalha

Enquanto esteve de férias em Portugal, onde além da passagem pelo Palácio de Belém foi aproveitando para se encontrar com amigos ao almoço, deu algumas entrevistas, fez comentários inclusive ao Sporting-Benfica que se jogou em Alvalade na CMTV, testemunho por videoconferência no julgamento do caso de Alcochete, Jorge Jesus foi gerindo a pré-época do Flamengo à distância de uma chamada telefónica, aguardando também que uma dessas chamadas pudesse ser do ambicionado clube que lhe permita lutar pela vitória na Liga dos Campeões (o que ainda não aconteceu). Nem de Espanha, nem de Itália, nem de França, à partida as três maiores hipóteses para um técnico que já torceu o nariz à Premier League por causa da língua. Em concreto, só uma oferta de muitos milhões para a China e umas sondagens discretas para a Primeira Liga. Assim regressou ao Brasil.

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O sonho que nem nos melhores sonhos o sonhador Jesus imaginava: Flamengo ganha segundo título em 24 horas

Entre as principais opções da equipa, houve apenas duas saídas: Reinier, vendido por 30 milhões ao Real Madrid, e Pablo Mari, que reforçou o Arsenal no último dia do mercado de inverno. Entre as entradas, os destaques foram Michael (médio ofensivo ex-Goiás), Léo Pereira (defesa ex-Athl. Paranaense), Gustavo Henrique (central ex- Santos), Pedro (avançado ex-Fiorentina), Thiago Maia (médio ex-Lille) e Pedro Rocha (lateral esquerdo ex-Spartak Moscovo). Mais importante que isso, nomes como Gerson, Bruno Henrique e sobretudo Gabriel Barbosa ficaram no clube, com o maior investimento a ser para o goleador da equipa no último ano. Quando chegou, o Fla tinha realizado quatro jogos com jogadores reserva e da formação no Carioca, ganhando ao Vasco da Gama e ao Volta Redonda, empatando com o Macaé e perdendo com o Fluminense; depois, veio a artilharia toda.

Em fevereiro, com Jesus no banco, o Mengão venceu o Resende (3-1) e o Madureira (2-0) antes de uma eletrizante meia-final do Carioca com o Fluminense, que terminou com a vitória do campeão por 3-2 num dérbi do Rio de Janeiro que deu muito que falar sobretudo pelas declarações do técnico português no final, que motivou críticas de adeptos rivais e comentadores televisivos e que voltou a ter resposta na antecâmara da Supertaça do Brasil por parte do próprio. “Só constatei factos. O Fluminense está mais forte do que ano passado mas nós estamos noutro patamar porque temos outros objetivos. O Fluminense disputa o título brasileiro? O Fluminense vai disputar a Libertadores? O Mundial de Clubes? O Flamengo está nesse patamar. Isso é arrogância?”, questionou.

Não era mesmo. E a final da Supertaça, prova que regressou agora após duas edições no início da década de 90 (vitórias do Grémio e do Corinthians), comprovou isso mesmo. Sobretudo a primeira meia hora: com apenas uma alteração em relação à equipa tipo de 2019, com a troca de Pablo Mari por Gustavo Henrique, o Flamengo chegou com facilidade ao 2-0 e as contas podiam nem ter ficado por aí. Bruno Henrique, na sequência de um cruzamento em arco de Gabriel Barbosa na direita, inaugurou de cabeça o marcador (15′) antes de ser o próprio número 9 a fazer o quarto golo em quatro jogos em 2020 aproveitando um desentendimento da defesa de Dorival Júnior entre Azevedo e Santos para empurrar fácil para a baliza e ir à bancada buscar o cartaz “Hoje tem gol do Gabigol”.

O Athl. Paranaense melhorou depois da curta paragem para os jogadores se poderem refrescar no Mané Garrincha, em Brasília (onde esteve o presidente brasileiro Jair Bolsonaro, o que obrigou a um enorme reforço do dispositivo de segurança), com a temperatura a superar os 25 graus às 11h da manhã, mas Marquinhos Gabriel viu Diego Alves corrigir um dos poucos erros da defesa do Flamengo na primeira parte (40′) antes de Rony fazer a bola atravessar a área sem que Erick conseguisse fazer o desvio final que reduzisse a desvantagem ao intervalo (42′).

No segundo tempo, o Flamengo conseguiu gerir da melhor forma a vantagem, não dando grande margem para o Athl. Paranaense chegar com perigo à baliza de Diego Alves (as duas substituições ao intervalo até acabaram por tirar capacidade nas transições à equipa) e criando oportunidades para dilatar o marcador, o que aconteceu a mais de 20 minutos do final com Arrascaeta a aproveitar uma bola solta após cruzamento de Bruno Henrique da esquerda desviado por Santos para empurrar para a baliza deserta e fazer o 3-0 (68′). Bissoli, apenas dois minutos depois, acertou com estrondo na trave após grande investida de Nikão pela direita num jogo que na parte final recuperou os cânticos do “Olê, olê, olê, olê, mister, mister” vindos das bancadas.

No final, mais um troféu para o Flamengo, mais um milhão de prémio de vitória, mais ambição para ganhar os próximos desafios… qualquer que seja o destino de Jesus a curto prazo. “Vamos disputar um troféu importante, que valorizamos muito. O meu futuro? Isso não é importante agora, o importante é a disputa dos títulos. Esse é o meu foco. Estamos em três frentes e queremos conquistá-las. Esse é o meu objetivo no Flamengo”, assegurou antes da Supertaça. E agora os olhos já estão apontados à Taça Guanabara, onde irá defrontar o Boavista ou o Volta Redonda, e à Recopa Sul-Americana, onde terá pela frente os equatorianos do Independiente del Valle.