Em atualização

O “Plano Nacional de Preparação e Resposta à Doença por novo coronavírus Covid-19” foi publicado ao final do dia de segunda-feira, mas poderá ser “revisto e atualizado” a qualquer momento, desde que “tal se mostre necessário” para fazer face à situação vivida no país, é o “documento de referência nacional no que respeita ao planeamento da resposta a Covid-19″.

Prevê, entre outras possíveis medidas, que seja duplicado o número de médicos, enfermeiros e assistentes operacionais nas unidades de internamento hospitalar de adultos e, no caso de internamentos de pediatria, o reforço em 50% de médicos e a triplicação do número de enfermeiros e assistentes operacionais. A diferença no rácio de profissionais a reforçar prende-se com a hipótese de os pais das crianças internadas estarem também “ausentes por doença”.

Ainda no que diz respeito ao recrutamento de recursos humanos, o plano de contingência da DGS não esclarece em que condições será feito o recrutamento, mas prevê ainda que possam ser “determinados alguns papéis onde voluntários possam ser utilizados”, identificados após discussão “entre organizações e associações profissionais”, sendo definidos “protocolos” com as organizações que “podem providenciar voluntários”.

Também o transporte de doentes infetados com a doença Covid-19 irá sofrer alterações à medida que as diferentes fases do plano forem sendo ativadas. Atualmente a funcionar na fase da “contenção” há ambulâncias de transporte especializadas “com equipa e material próprios”, que fazem o transporte dos doentes para os hospitais de referência, na “fase de contenção alargada” a frota de ambulâncias do INEM “terá de ser expandida” e, na fase de mitigação “qualquer meio de transporte do INEM terá de estar preparado para transportar um doente Covid-19”.

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Fases do Plano Nacional de Preparação e Resposta à Doença por novo coronavívus © DGS

Um dos alertas mais repetidos pelas entidades de saúde para combater a disseminação do novo coronavírus é o da limpeza e desinfeção frequente, quer das mãos dos cidadãos, quer de espaços ou meios de transporte púbicos uma vez que “diminui o potencial de transmissão”, recomendado o plano de contingência que sejam “seguidas as recomendações de limpeza e higienização previstas em contexto de serviços de saúde”.

Um dos quartos de isolamento do Serviço de Doenças Infecciosas no Hospital Curry Cabral, em Lisboa.

Isolamento dos doentes

O plano define que o “isolamento deve ser determinado desde a suspeita até à infirmação do caso [resultado negativo] ou até recuperação clínica nos casos confirmados”, assumindo que o tempo de isolamento “durará até ao final do período sintomático” e que poderá ocorrer “em unidade hospitalar, domicílio ou outro, dependendo da fase da epidemia e da gravidade do quadro clínico”.

O documento é claro também no que diz respeito à hipótese de “isolamento coercivo” e em que situações é que poderá acontecer: “em situações extremas, de recusa do doente“. Nesses casos, será necessário “recorrer ao exercício do poder da Autoridade de Saúde” sendo que todas as situações deste tipo, ocorrendo fora do contexto de estado de emergência, “devem estar previstas e tipificadas”.

Há, também, diferenças claras entre os momentos (contenção ou mitigação) no que diz respeito ao isolamento. Se durante a fase de contenção o isolamento deverá preferencialmente ser feito “em local designado, de acordo com a rede de referenciação hospitalar criada para o efeito”, numa fase de mitigação — quando a disseminação do vírus já estiver generalizada entre a população — o isolamento “deverá ser feito no domicílio ou instituição hospitalar, de acordo com a gravidade da doença e o nível de cuidados necessário”.

O plano de contingência reconhece que a “contingência/isolamento” tem “um maior impacto na redução da transmissão durante o período em que ainda não há circulação generalizada do vírus na comunidade”, ou seja, a que se vive atualmente em Portugal. Há escolas, universidades e instituições privadas que já optaram por suspender atividades letivas presenciais, na tentativa de impedir a propagação do vírus, o Governo já recomendou a suspensão de eventos em espaços fechados com mais de mil pessoas ou em espaços abertos com mais de cinco mil e há serviços públicos e outros equipamentos que também já fecharam portas.

Governo recomenda suspensão de alguns eventos em Portugal

A DGS admite que “a aplicação de algumas medidas de saúde pública levanta questões de ordem ética e legal”, sobretudo no que diz respeito às “medidas de distanciamento social”, porque “podem pôr em causa a liberdade individual”. Ainda assim, são claramente identificados os propósitos da imposição das medidas de isolamento/quarentena:

“Reduzir o risco de transmissão individual e de propagação do agente na população;

Atrasar o pico da epidemia;

Reduzir o número total de casos, o número de casos graves e o número de óbitos;

Diminuir a velocidade de propagação/transmissão do vírus;

Prevenir o estabelecimento de cadeias de transmissão e atrasar e reduzir a transmissão comunitária disseminada;”

Intervenção em contexto social

O plano delineou medidas específicas para três principais áreas de intervenção social: intervenção em contexto escolar, em contexto laboral e em contextos especiais (como eventos, residências, estabelecimentos prisionais ou transportes públicos).

No primeiro ponto, o contexto escolar, o público-alvo são as crianças e jovens. O documento prevê o “encerramento pró-ativo ou reativo de escolas”, de acordo com a gravidade da epidemia. Ou seja, as escolas podem optar por encerrar totalmente ou então apenas para aos alunos, “mantendo-se os restantes serviços em funcionamento e algumas atividades letivas não presenciais”.

O objetivo desta medida é prevenir ou reduzir a transmissão do Covid-19 nos estabelecimentos de ensino, e assim ganhar tempo e atrasar o pico da epidemia, de forma a “planear os serviços de saúde para responder as fases mais críticas da epidemia”. Nesse sentido, o documento salienta que as medidas de saúde pública de intervenção em contexto escolar podem ser “aplicadas isoladamente ou em combinação com outras medidas de distanciamento social”.

Em contexto laboral, onde a interação entre pessoas pode ser próxima e duradoura, as medidas de saúde pública podem traduzir-se na implementação de horários de trabalho flexíveis e desencontrados, a promoção do trabalho à distância e a utilização de ferramentas de comunicação como o correio eletrónico ou a teleconferência.

Em caso de gravidade extrema, o plano prevê o encerramento de locais de trabalho. Tudo depende da evolução da situação epidemiológica. O documento destaca, ainda, o cumprimento de medidas de proteção individual, como higienização das mãos e etiqueta respiratória. E frisa a necessidade de justificar o absentismo laboral, quer em situação de infeção por Covid-19, quer em situação de contacto com caso confirmado, para que que não resultem prejuízos financeiros para o trabalhador.

No terceiro ponto, as intervenções em contextos especiais incluem o reforço das medidas de proteção individual e a distribuição e comunicação de mensagens de saúde pública. É sugerido que se evite a participação em eventos ou locais de utilização coletiva, caso sejam apresentados sinais ou sintomas. No entanto, neste ponto, o plano de contingência deixa em aberto a articulação dos responsáveis pelos espaços coletivos, como estádios desportivos ou centros comerciais, com as autoridades de saúde. O tipo de medidas a aplicar pode variar entre o adiamento ou o cancelamento do evento.

Em todas as fases, apela-se à adoção de medidas de limpeza e higienização, por rotina, de superfícies e objetos, já que diminui o potencial de transmissão.

Debilidades e dificuldades da implementação do plano de contingência

Uma das páginas do documento é dedicada a elencar os “pontos críticos” identificados para a implementação do plano de contingência e que vão desde a “limitação de meios e recursos” ao “elevado número de pessoas que será necessário colocar em isolamento por um longo período”.

“Limitação de meios e recursos para a implementação e generalização das medidas de proteção individual e para garantir o isolamento dos casos;

Dificuldade em garantir a aplicação das medidas de prevenção e controlo de infeção em estruturas residenciais fechadas (lares, estabelecimentos prisionais).

Fadiga de intervenção, nas medidas de proteção individual;

Menor aceitabilidade do isolamento de contactos; o elevado número de pessoas que será necessário colocar em isolamento por um longo período reduzirá ainda mais a sua aceitabilidade e exequibilidade numa fase tardia da epidemia, com elevado potencial de disrupção social;

Impacto financeiro das medidas nos agregados familiares e a eventual restrição à liberdade individual, em especial, dos doentes com quadros clínicos mais ligeiros;

Impacto económico e social da aplicação de medidas de saúde pública em contexto laboral;

No caso específico do isolamento de agregado há ainda a considerar que os elementos do agregado poderão estar em contacto com o coabitante infetado embora assintomático, o que aumenta o seu risco de exposição, colocando-se aqui questões éticas específicas, para além das que decorrem da privação da liberdade individual.

Disrupção económica e social associada ao adiamento/cancelamento de atividades;”

Medidas restritivas na mobilidade de pessoas e bens

O documento reconhece que a implementação de medidas restritivas na mobilidade de pessoas e bens no contexto internacional pode ser um “ineficaz” e causador de uma profunda disrupção económica e social, com impacto negativo nos países afetados e respetivos parceiros comerciais. No entanto, e seguindo as orientações da Organização Mundial de Saúde, permite:

Atrasar a entrada e a propagação do Covid-19 em Portugal

Identificar precocemente viajantes suspeitos de Covid-19

Isolar, gerir e referenciar casos de viajantes doentes

Iniciar precocemente a investigação epidemiológica

Segundo o documento, quem tem viagens previstas deverá realizar uma consulta do viajante nos Centros de Vacinação Internacional para obter informações atualizadas sobre Covid-19 e medidas de prevenção. As viagens não essenciais devem ser reconsideradas. É proposta, ainda, sensibilização das agências de viagens e dos operadores de transporte (companhias aéreas, marítimas, agentes de navegação, entre outros) para divulgação da informação aos viajantes sobre medidas de prevenção e contenção de risco a bordo recomendadas pela OMS, e, se necessário, uma mudança temporária das rotas turísticas que integram zonas de risco.

Já os viajantes que regressem de uma área afetada e não tenham sintomas de Covid-19, devem seguir as medidas de higiene e etiqueta respiratória, assim como realizar a autovigilância de sintomas. Em caso de algum sintoma suspeito, o plano realça o “contacto não presencial através do SNS 24″.
Caso um viajante adoeça a bordo de uma aeronave ou de o navio, os procedimentos são definidos de acordo com o plano de contingência nos pontos de entrada (PoE) e que deverá incluir a “deteção precoce, avaliação epidemiológica, a notificação e a gestão de viajantes doentes”.

O documento alerta ainda para a pouca efetividade das medida de rastreio nas zonas de chegadas (no caso dos aeroportos, por exemplo). Contudo, se por motivos de alarme social ou mediante recomendação internacional, for necessário implementar essa medida, será feito com a “monitorização da temperatura”. No entanto, está prevista a formação de profissionais dos aeroportos para encaminhar o doente com suspeita de Covid-19 para sala de isolamento, designada no plano de contingência do aeroporto, para posterior avaliação médica. Assume-se ainda, nesta fase, o preenchimento de um questionário quando o viajante adoece a bordo da aeronave.

Formação e treino dos profissionais de saúde

Face ao atual surto por Covid-19, o documento implementa um plano de formação e treino de forma a capacitar os profissionais de saúde do SNS a responder aos desafios dinâmicos da epidemia, ao mesmo tempo que promove o envolvimento dos especialistas de acordo com a sua função e área de intervenção. No entanto, o mesmo plano salienta como pontos críticos, e que podem colocar em causa as medidas delineadas, a disponibilização de informação de forma célere e em tempo útil ou o alcance de todas as categorias profissionais envolvidas.

A estratégia global passa pela formação de equipas de saúde pública, que têm um papel preponderante em todas as fases da preparação e resposta em cenários de emergência, e pela atualização de procedimentos, para uma rápida investigação epidemiológica e rastreio de contactos. O plano propõe ainda a capacitação de equipas específicas em cada uma das regiões devem adotar o modelo de formação em cascata.

O plano quer o reforço da formação e treino dos profissionais com maior probabilidade de exposição, e de acordo com a sua função, como seguranças, assistentes técnicos, serviços de limpeza ou tripulantes de ambulâncias. Promove-se, ainda, formação em gestão clínica de caso com o objetivo de agilizar a deteção precoce do Covid-19.

Com o propósito de capacitar o país com medicamentos, dispositivos médicos e equipamentos de proteção individual para responder ao Covid 19, o plano prevê os procedimentos necessários para a constituição de uma Reserva Estratégica de Medicamentos (REM) tendo em em conta os cenários traçados. Os medicamentos e os dispositivos médicos são selecionados pelo risco para a vida humana que a sua escassez pode condicionar. Nestas situações, e considerando que até à data não existem fármacos com prova científica de serem agentes antivirais eficazes no tratamento da Covid-19, a REM é constituída pelos fármacos necessários para o tratamento de suporte de órgão e vida, em ambiente de cuidados intensivos, com evolução para pneumonia e choque séptico. E ainda fármacos necessários para o tratamento de outras doenças cuja infeção por Covid-19 tem potencial de descompensar.

O documento desenha uma estratégia para assegurar os recursos humanos necessários às fases de preparação, resposta e recuperação de Covid-19. E admite até que, depois de estimado o número de profissionais de saúde necessários para cada nível de alerta, seja necessário identificar organizações que possam providenciar voluntários na área da saúde. No caso do internamento hospitalar de adultos, e mediante uma avaliação, o plano admite a possibilidade de duplicar o número de profissionais de saúde. No internamento de pediatria, (que acresce a possibilidade dos progenitores estarem ausentes por doença) poderá ser necessário triplicar o número de enfermeiros e assistentes operacionais.