Nos últimos dias, as denúncias começaram a aumentar. Os professores de Atividades de Enriquecimento Curricular, não obrigatórias, temem ficar sem ordenado já a partir deste mês, uma vez que as aulas presenciais terminaram para os alunos do básico. Na Fenprof, a denúncia mais complicada chegou de Coimbra, enquanto a FNE diz ter mais queixas no Norte do país. Ao Observador, o Ministério da Educação garante que vai continuar a financiar estas e outras atividades até ao final do ano letivo, não havendo motivo para que estes docentes fiquem sem salário, desde que as atividades sejam adaptadas ao ensino à distância.
“O Ministério da Educação vai enviar, para as entidades promotoras de Atividades de Enriquecimento Curriculares, indicações de que o financiamento está assegurado se garantidas estas atividades adaptadas ao 3.º período letivo, que se desenvolverá à distância para estes alunos do ensino básico”, lê-se na resposta ao Observador.
Para além disso, a tutela também garante que vai manter o financiamento das Atividades de Animação e de Apoio à Família (AAAF) nas escolas públicas e dos Centros de Recursos para a Inclusão (CRI). Para as escolas privadas, há também financiamento garantido quer para “o ensino artístico especializado ao abrigo de contratos de patrocínio”, quer para os contratos de cooperação. A condição é a mesma para todas: que o trabalho desenvolvido com os alunos se adapte ao ensino à distância.
Para além disso, o gabinete do ministro Tiago Brandão Rodrigues esclarece que não houve quebra no envio do financiamento, nem mesmo nos últimos 15 dias do 2.º período quando as aulas presenciais foram suspensa.
O problema das AEC: medo falou mais alto
As chamadas AEC são facultativas (atividades lúdicas, desportivas ou culturais) e acontecem nas escolas para alunos do 1.º ao 4.º ano de escolaridade. As entidades promotoras — agrupamentos de escolas, autarquias, associações de pais ou até IPSS — recebem financiamento da tutela e, depois, estabelecem contratos de trabalho com os docentes (a termo certo ou incerto) sendo responsáveis pelo pagamento dos salários.
Ao que o Observador apurou, na maioria das denúncias feitas pelos professores, as entidades promotoras, receando não receber o financiamento da tutela, não davam garantias aos docentes de que o próximo salário fosse pago. Com a garantia do ministério, não há motivo para não o fazerem.
“Se há garantia de financiamento do Ministério da Educação não há motivo para que os professores não sejam pagos. O único motivo agora será se as direções dos agrupamentos decidirem que não querem manter as atividades para os alunos”, defende Luís Lobo, dirigente da Fenprof.
Em Lisboa, o Observador falou com professoras que desenvolvem AEC em escolas dos Olivais, de Arroios e de Campo de Ourique, e que quiseram manter o anonimato, e o relato de todas foi idêntico: as associações que as contrataram por receio de não receber o financiamento da tutela não davam garantias de continuar a pagar os ordenados até ao final do ano letivo.
Uma das situações mais complicadas que chegou à Fenprof foi através do Sindicato dos Professores da Região Centro: a Cáritas Diocesana de Coimbra, que serve o Agrupamento de Escolas Martim de Freitas, o maior do concelho com uma população de cerca de 2000 alunos, cessou os contratos de trabalho com todos os professores das AEC, através de email — documento a que o Observador teve acesso —, mas acabaria por recuar na sua posição.
A decisão foi tomada sem que a Cáritas tenha falado com a direção do agrupamento, ou com os professores titulares do 1.º ciclo”, esclarece Luís Lobo, detalhando que a ideia do conselho pedagógico do agrupamento era pedir a estes professores que criassem atividades para os alunos do 1.º ciclo fazerem em casa.
“Felizmente recuou na sua decisão, até porque estavámos prontos para seguir para tribunal, e esta quinta-feira anunciou a revogação da cessação dos contratos de trabalho”, conta Luís Lobo. Desta forma, os docentes têm a garantia de que trabalham até ao final do contrato.
Num ofício enviado ao Ministério da Educação a 14 de abril, a Fenprof diz que os seus sindicatos têm sido contactados por professores das AEC “confrontados, por parte de instituições que os contrataram, com a intenção de não procederem à sua remuneração ou, mesmo, de precipitaram a cessação (injustificada) dos seus contratos de trabalho”. O argumento dado aos docentes tem sido “dúvidas quanto ao cumprimento dos contratos-programa no que respeita ao financiamento”. Essas dúvidas são agora afastadas com a garantia da tutela.
Já na FNE, o secretário-geral João Dias da Silva conta que foi na quarta-feira que as queixas começaram a surgir: “Tínhamos uma perceção inicial de que podia haver problemas com estes professores.”
Os relatos, para já, concentram-se no norte do país e têm chegado à federação através do SPZN — Sindicato dos Professores da Zona Norte. No entanto, o líder da FNE acredita que a situação poderá estar a acontecer em mais zonas do país.
“Os sindicatos estão a trabalhar do ponto de vista jurídico e a nossa posição de princípio é que não pode haver cessação imprevista de um contrato”, acrescenta, para além de que nos casos que têm chegado à FNE não são cumpridos os trâmites legais. “Os professores não estão a ser avisados com a antecedência necessária e em alguns casos as entidades empregadoras não querem pagar as contrapartidas devidas”, detalha.
Na sua opinião, não há motivo nenhum para que estes professores não possam também desempenhar a sua função em teletrabalho como os restantes, podendo assim garantir os seus ordenados, ainda mais havendo financiamento da tutela garantido.