À saída de duas fábricas no norte do país, uma em Famalicão e outra em Paços de Ferreira, o primeiro-ministro esteve longamente a responder aos jornalistas evidenciando cautelas sobre o que se segue em maio e admitindo já à partida que se correr mal, recua-se. Garante que existe “consenso” para levantar medidas e que as informações que tem neste momento é que o país pode “descer um nível” o seu grau de proteção, passando do estado de emergência  para a situação de calamidade. Mas também diz que esse levantamento pouco muda quanto à necessidade de manter regras, diga o que disser a Constituição.

É como jurista que fala quando se dirige aos especialistas que nos últimos dias surgiram a levantar dúvidas sobre a passagem de um estado de exceção constitucional para outro, que vem da lei de Bases de Proteção Civil. Terá o Govenro força suficiente para manter algumas das restrições que quer que permaneçam? Os juristas consultados este sábado pelo Observador têm dúvidas, mas o jurista António Costa diz que conhece bem a “enorme capacidade que os juristas têm de inventar problemas. Felizmente a realidade da vida é muitíssimo mais prática.”

Constitucionalistas questionam eficácia da situação de calamidade para combater a pandemia da Covid-19

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Mas nas declarações, o primeiro-ministro reconhece que para muitas das restrições que quer manter vai ter mesmo de confiar apenas no “bom senso dos portugueses”, ainda que admita que “quer a lei de bases da proteção civil quer a lei de saúde pública dão ao estado os instrumentos necessários para poderem agir”. O que é certo é que o estado de emergência “permite a adoção de medidas mais alargadas”, mas “diga a Constituição do que disser, haja ou não estado de emergência, confio nas pessoas e no comportamento exemplar”, rematou.

“Há consenso” para levantar medidas em maio

Na próxima quarta-feira, depois da reunião semanal com os epidemiologistas no Infarmed, o primeiro-ministro vai receber parceiros sociais e também os partidos. No fim de tudo vai reunir-se com o Presidente da República que vai definir, por fim, se há ou não renovação do estado de emergência. Neste momento, diz já Costa, “há consenso” sobre a reabertura de algumas atividades já em maio, mas esse calendário só ficará traçado no Conselho de Ministros de quinta-feira, sendo certo que acontecerá por fases: o primeiro levantamento aparece a 4 de maio, o segundo a 18 do mesmo mês e a terceira fase acontecerá a 1 de junho. As creches? Costa não confirma a informação avançada esta segunda-feira na imprensa.

Uma coisa deixa, no entanto, firmada, mesmo antes das primeiras medidas serem levantadas: há volta a dar. Isto é, se o desconfinamento resultar num aumento do número de casos, voltará atrás. O primeiro-ministro refreia já à partida a libertação de algumas atividades e algumas regiões do país — uma fórmula de desconfinamento que foi já admitida pelo próprio António Costa. “Se as coisas começarem a correr mal temos de dar passo atrás. Ninguém pense que se for necessário dar um passo atrás não o daremos. Daremos sempre os passos que forem necessários para proteger as pessoas”, afirmou aos jornalistas.

Há algumas regras que adianta já e que pretendem evitar que desconfinar signifique o aumento do número de casos de forma descontrolada. A primeira passa pela obrigatoriedade de manter normas de higienização e de uso de máscaras em espaços fechados, nomeadamente escolas e transportes públicos. Depois, a garantia de que as empresas e espaços comerciais têm capacidade para assegurar o cumprimento do distanciamento social necessário e também que os restaurante não tenham a mesma capacidade que anteriormente.

Aliás, o primeiro-ministro disse mesmo que as linhas de crédito que foram abertas para as empresas, com garantia do Estado, não visam apenas mantê-las vivas, mas também que possam usar esses recursos para prepararem os seus espaços. Dotando-os de condições para receberem os seus trabalhadores em segurança, mal recomecem a operar.

Além de tudo isto, o Governo quer ainda que esteja assegurado o abastecimento de máscaras suficientes para uso da população. Afinal, diz, “vamos ter de conviver com estes equipamentos de proteção seguramente por muitos e bons meses” e a prioridade passa agora por fazê-los chegar “em abundância” a “hipermercados e lojas”. Um dos objetivos da visita de Costa era mostrar a economia que continua a funcionar e também a reconversão da produção, no caso da fábrica têxtil de Paços de Ferreira, passou de produzir “roupa de luxo para confecionar equipamento de proteção individual”, adaptando-se às necessidades do mercado nesta fase de pandemia.

“Todas as semanas avaliaremos para ver se o passo que demos não foi maior do que a perna”, afirmou ainda o primeiro-ministro advertindo que a fase que aí vem não é menos difícil do que a que o país vive até ao dia 2 de maio — data do final do estado de emergência. E isto porque “não está a diminuir o número de casos novos” no país, ainda que o crescimento exponencial tenha sido controlado. Aprender a conviver com um vírus que classifica de “muito perigoso”,  é “mais difícil ainda” do que estar em recolhimento domiciliário, assume repetindo que este levantamento de medidas tem de ser feito mantendo “o grau de confiança das pessoas elevado”. E isto porque este período será longo, avisa Costa que acredita que a “normalidade plena da vida só voltará a existir quando houver vacina. Vamos ter de praticar normas de distanciamento social e normas de proteção social, durante muito tempo e não temos de viver em permanente estado de exceção constitucional”.