Corrigido com esclarecimento feito por José Miguel Júdice

“O Estado português auxiliará a TAP quando o Estado entender e não quando o Sr. Deputado quiser ou o acionista privado quiser”, afirmou o ministro das Infraestruturas esta terça-feira no Parlamento. Dois meses depois da comissão executiva da transportadora ter pedido ajuda formalmente, Pedro Nuno Santos defendeu ainda que todos os cenários estão em cima da mesa nesta negociação, incluindo a insolvência, e admitiu que terá de haver uma reestruturação porque a atual dimensão da transportadora “não é sustentável.”

“O Estado vai partir para uma negociação e não podemos excluir nenhum cenário, inclusivamente o da própria insolvência da empresa, porque obviamente o Estado não pode estar capturado, algemado numa negociação com privados”.

Ainda durante a audição, o ministro foi chamado a chamado a explicar o cenário extremo da insolvência que admitiu, já depois de António Costa se ter escusado a comentar a hipótese, afirmando desconhecer as declarações feitas no Parlamento. Pedro Nuno Santos desmentiu a existência de divergências sobre o tema  — vários membros do Governo afirmaram publicamente nesta crise que não iam deixar cair a TAP. Mas agora, é introduzida uma nuance, ainda que seja para estratégia negocial.

Não há diferença nenhuma nas posições que os diferentes membros do Governo têm tomado e sobre a insolvência, em particular, o primeiro-ministro foi muito claro. Queremos salvar a TAP, queremos intervencionar a TAP. Mas se as condições que implicam o controlo que vamos propor não forem aceites pelo privado, acha que o Estado deve intervencionar na mesma? Esta é a questão e não há nenhuma discordância. Vamos impor condições, mas têm de ser aceites”.

O Governo já assumiu que a empresa não consegue sobreviver sem ajuda do Estado, como aliás outras companhias aéreas. A inexistência de um acordo com os acionistas privados, que inviabilize um apoio público à TAP, poderia resultar num desfecho de insolvência, uma vez que a empresa não tem capacidade para gerar receitas e os privados não estarão disponíveis, ou terão a capacidade, para colocar os recursos necessários.

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Solução “é urgente”. Estado e privados vão ter de ceder. Um guião para o plano de ajuda à TAP

Pedro Nuno Santos assumiu ainda que a dimensão atual da TAP “não é sustentável no momento que vivemos nem nos próximos anos.” Terá de ser feita uma revisão do plano estratégico, mas também uma reestruturação que levará a um ajustamento na dimensão da empresa. A TAP foi apanhada pela crise do Covid em plena expansão da oferta, com a renovação da frota e a contratação de trabalhadores. Um investimento que foi possível financiar, acrescentou, porque o Estado estava na empresa.

Num estilo mais controlado, para evitar ser visto como arrogante, como explicou na sua intervenção inicial na comissão parlamentar de economia e obras públicas, Pedro Nuno Santos deixou claro que a mudança face à intervenção dos últimos 15 dias foi no tom e não na substância.

Empréstimo de 350 milhões não chega para resolver problema da TAP. Se é o povo a pagar, “é bom que seja o povo a mandar”.

Dois níveis de intervenção pública e várias centenas de milhões de euros

Pedro Nuno Santos reafirmou que a TAP é uma empresa crítica para Portugal e explicitou que ajuda pública terá dois níveis de resposta. Um mais imediato e que passa por uma intervenção de emergência em matéria de liquidez. Mas também “temos de revisitar a estrutura da empresa, o que vai demorar mais tempo” e o Governo vai exigir o controlo sobre o destino da injeção financeira desde já e que admite vir a representar várias “centenas de milhões de euros”.

Pedro Nuno Santos assegurou que o Governo e os portugueses “estão disponíveis” e querem salvar a TAP, cujo papel na economia portuguesa, nas exportações e no turismo destacou. Mas insistiu: “Não vamos negociar sem que sejam aceites condições firmes de repartição de encargos entre as partes e normas de controlo por parte do Estado sobre o destino” dessa ajuda. Se as condições não forem aceites, não haverá intervenção pública, disse ainda o ministro que voltou a acusar o CDS e o deputado João Gonçalves Pereira de estarem a representar os acionistas privados (David Neeleman e Humberto Pedrosa).

Essas condições passam pela disponibilidade de os acionistas converterem créditos sobre a empresa em capital. “É o mínimo”, sublinhou. Pedro Nuno Santos também assinalou que os acionistas privados ainda não foram claros sobre a disponibilidade que têm para acompanhar a intervenção pública necessária.

“Algumas cláusulas do acordo parassocial têm de ser suspensas para garantir um mínimo de segurança e um controlo sobre os destinos que vão ser dados ao dinheiro que vamos injetar”.

No entanto, ao longo da audição foi moderando o tom das exigências do Estado. “Neste momento queremos ser cautelosos e razoáveis sobre as exigências”, assumindo uma estratégia diferente dos partidos que defendem a nacionalização. “Vamo-no sentar com os privados e com a comissão executiva para acordar os termos da intervenção do Estado.”

Logo na intervenção inicial sobre a TAP, Pedro Nuno Santos assumiu um “mea culpa” sobre uma intervenção assertiva, mas que alguns confundiram com “arrogância e soberba” feita há duas semanas. “Há pessoas que não apreciaram a forma como disse o que disse na última audição. Tenho a obrigação de fazer o meu trabalho de forma  a não ter um registo que pode ser confundido com arrogância.”

O ministro justificou a sua prestação irritada com a pressão vinda de um deputado — João Gonçalves Pereira do CDS — para que o Estado desse a resposta que o privado queria.

E aproveitou para contra-atacar um “comentador” que pediu a sua demissão. O advogado “mais rico do nosso país”, sublinhou, “esqueceu-de de dizer que era do escritório que representava o acionista privado e a própria TAP. Há quem não tenha vergonha. Temos de denunciar quando as pessoas usam o espaço público para defender interesses seus”.

Pedro Nuno Santos não identificou o comentador, mas esclareceu que a inicial do nome está na sigla do escritório. Era uma referência ao  comentário feito pelo José Miguel Júdice na SIC na sequência da intervenção do ministro na comissão parlamentar de há duas semanas. Entretanto José Miguel Júdice corrigiu a informação inicialmente publicada pelo Observador, sublinhando que já não é sócio do escritório de advogados PLMJ  desde janeiro de 2019, e que deixou de exercer a prática de advocacia.

Não tem Porsche nem vergonha

Na resposta, o deputado do CDS, disse que o “ministro está em modo Xanax” e exigiu respostas concretas para o pedido de apoio ao estado que foi feito já há dois meses. Pedro Nuno Santos clarifica que não mudou de opinião sobre o que disse há duas semanas, é mesmo uma questão de estilo e voltou a denunciar a pressão privada e de alguns partidos para que o Estado apresente a solução para a TAP.

Ainda na semana passada, o secretário de Estado do Orçamento adiantou que a solução com injeção de dinheiro público deveria chegar em junho, numa altura em que vários países já anunciaram pacotes de apoio às respetivas companhias aéreas.