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Num setor em forte crise como o da aviação, a TAP parte em desvantagem face às concorrentes. Isto porque tem uma situação financeira mais frágil.
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Num setor em forte crise como o da aviação, a TAP parte em desvantagem face às concorrentes. Isto porque tem uma situação financeira mais frágil.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Num setor em forte crise como o da aviação, a TAP parte em desvantagem face às concorrentes. Isto porque tem uma situação financeira mais frágil.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Solução "é urgente". Estado e privados vão ter de ceder. Um guião para o plano de ajuda à TAP

A TAP ainda não tem plano e está em desvantagem para atravessar crise. É urgente uma solução. Estado e privados terão de fazer cedências, avisa diretor executivo da banca de investimento do Citigroup.

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No princípio da crise da Covid-19 todas as companhias aéreas estavam no mesmo barco, abaladas pela paragem abrupta da atividade. Mas a partir do momento em que há anúncios de apoios – e até concretização de soluções para apoiar outras companhias aéreas – a TAP fica em desvantagem. A razão é clara: porque tem uma situação financeira mais frágil.

Para além de resolver o problema imediato de tesouraria – é esse o objetivo do empréstimo de 350 milhões de euros com aval do Estado pedido pela gestão executiva da companhia aérea portuguesa – é preciso criar as condições para que a empresa possa já começar a trabalhar num plano para o futuro. A rapidez com que a resposta chega é um fator importante, mas não chega. É também a dimensão e adequação dessa resposta. E nestes tempos de exceção às exigências de Bruxelas em relação a ajudas de Estado ao setor da aviação, há Estados que têm mais para dar e vão dar mais.

No meio da turbulência que domina, e vai dominar nos próximos anos a rota da aviação comercial, está uma companhia aérea em que o Estado ainda tem metade do capital, apesar de não intervir na gestão. Já é caso raro na Europa — talvez deixe de o ser no futuro próximo — mas em vez de ajudar na solução para a TAP, parece estar a complicar.

Esta quinta-feira, no debate quinzenal, o tema TAP foi puxado por Rui Rio. António Costa reafirmou conceitos já defendidos pelo ministro da Infraestruturas, de forma mais polida. O primeiro-ministro deixou claro que o Governo não deixará a empresa cair, mas avisou que não haverá cheque em branco.

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“Apoio haverá, apoio sem controlo não haverá“. O Estado vai querer ter uma palavra sobre o plano de negócios da transportadora, com António Costa a sinalizar que o aeroporto do Porto é um dos ativos que para o Governo não está a ser devidamente explorado. Isto apesar de não defender uma intervenção pública na gestão do dia a dia. O primeiro-ministro sinalizou ainda que há vários acionistas privados na TAP, David Neleeman e Humberto Pedrosa, e que  nem “todos podem ter a mesma visão sobre a relação com o Estado”. Mas nada revelou sobre a solução que está a ser negociada.

O Observador preparou um guião com alguns pontos que devem orientar a preparação de um plano de socorro à transportadora aérea portuguesa e falou com Miguel Azevedo, diretor executivo do Citigroup responsável pela banca de investimento no Médio Oriente, África e Portugal, que acompanhou no passado operações de financiamento e privatização da TAP, e está envolvido na preparação do aumento de capital da Finnair, companhia aérea escandinava.

Pacote de apoios deve ser aprovado com urgência

São cada vez mais as companhias aéreas que já anunciaram planos de ajudas, alguns dos quais até parcialmente concretizados. Air France/KML, Iberia e SAS são apenas alguns exemplos recentes. Ainda falta conhecer os contornos do plano para a Lufthansa, a transportadora alemã que será uma das principais referências para o modelo europeu das ajudas ao setor. O grosso dos apoios já anunciados passa pelo Estado, seja através de avales a empréstimos privados, seja por via de financiamentos diretos do próprio Estado às empresas, com condições favoráveis. E a TAP está a partir atrasada nesta corrida.

Miguel Azevedo, diretor executivo do Citigroup responsável pela banca de Investimento no Médio Oriente, Africa e Portugal

“A situação é complicada, requer maturação e consenso”, reconhece Miguel Azevedo, do Citigroup. No entanto, acrescenta, a “TAP foi apanhada em plena implementação de um projeto ambicioso de crescimento e isso torna a tarefa mais difícil, mas também mais urgente. No sector da aviação, seja europeu ou norte-americano, quase a totalidade dos players mais relevantes já anunciaram um plano de ação e a TAP tem igualmente que mostrar a todos os seus stakeholders, incluindo os financiadores dos aviões [lessors, ou dono de um ativo que está em leasing],  bancos e investidores em obrigações, nos quais se incluem pessoas individuais, que tem um plano estruturante. Daí a urgência no anúncio de uma decisão”.

A carta com os pedidos de apoio foi endereçada ao Governo a 20 de março. Passado um mês e meio ainda não foi dada qualquer resposta. A demora na resposta portuguesa contrasta ainda com a circunstância de o próprio Estado ser também ele próprio acionista relevante na TAP.

“Seria quase irónico que a companhia aérea europeia em que o Estado (enquanto acionista) está mais presente, fosse a última a anunciar um acordo com o Estado (enquanto soberano). É fundamental haver um acordo e um consenso entre acionistas num momento tão desafiante como este.”

Mas essa é também a origem do problema.

Colaboração e consenso entre acionistas

O consenso parece estar distante depois do extremar de posições na praça pública, sobretudo após a audição do ministro Pedro Nuno Santos no parlamento na semana passada, que reforçou o ambiente de crispação entre Estado e privados que já se vivia antes da chegada da pandemia.

Empréstimo de 350 milhões não chega para resolver problema da TAP. Se é o povo a pagar, “é bom que seja o povo a mandar”.

Foi com o chapéu de acionista que Pedro Nuno Santos revelou o seu descontentamento com a gestão da TAP face aos resultados e derrapagens orçamentais pré-covid. Ora o Governo terá de atuar neste contexto como Estado soberano.

A gestão privada liderada por Antonoaldo Neves, e o acionista David Neeleman, têm procurado fazer passar uma narrativa diferente. A de que há uma TAP antes e outra depois da privatização. E de que muito foi feito durante a gestão privada, tanto em termos de reposicionamento estratégico como em crescimento em rotas, aviões e colaboradores.

A nova TAP de David Neeleman: uma história de aviões novos, dívida a ser paga e prémios que vão continuar

Esta história, que não convence o Estado — ainda no último relatório e contas a Parpública dava nota da preocupação pelos mais de 200 milhões de prejuízos registados nos últimos dois anos —,  foi recentemente validada no mercado financeiro, através de emissão de dívida sem qualquer aval público, como sublinha o diretor executivo do Citigroup, banco que também esteve ligado a uma destas operações. E foi com essa emissão que a TAP reduziu o montante do passivo pelo qual o Estado é responsável, para 200 milhões de euros, indicou António Costa.

“A TAP tinha vindo a implementar um plano de expansão bem desenhado e que foi muito bem recebido por investidores institucionais globais, nomeadamente aquando da emissão de divida internacional, no final de 2019. A TAP, que até à privatização sempre se financiou com a garantia do Estado, conseguiu no final do ano passado atingir o marco histórico de aceder ao mercado internacional de dívida institucional, com base nos seus méritos próprios.”

Sobre a derrapagem dos resultados da companhia – que, como destacou Pedro Nuno Santos, só entregou prejuízos em vez dos lucros prometidos – Miguel Azevedo faz a salvaguarda. “Há que ter presente que a TAP, nos últimos quatro anos, em termos gerais aumentou a frota em 30%, as vendas em 50% e aumentou o EBITDAR (resultados antes de impostos e outros encargos financeiros) em 300%. Numa empresa em crescimento e em investimento é inevitável que as novas rotas levem o seu tempo a atingir a rentabilidade desejada e projetada”.

O acordo de reequilibrio do capital na TAP foi feito antes de Pedro Nuno Santos assumir a pasta da aviação

PEDRO NUNES/LUSA

Apesar das declarações públicas, os maus resultados não são a única explicação para o mal-estar do Estado. O acordo de partilha de poder na TAP (governance), obtido já no governo socialista, dita que o Estado detém 50% do capital, mas não manda. No passado, o Governo entrou em colisão com a gestão privada da transportadora a propósito do pagamento de prémios a alguns colaboradores no ano passado e por causa da estratégia comercial para o Porto. Já antes da crise da Covid-19, o Estado queria ter presença na comissão executiva. Agora estão criadas as condições para isso acontecer.

Uma gestão profissional, um Estado mais interveniente. As partes vão ter que ceder e há condições

O negócio da aviação exige profissionais muito especializados e um know-how que o Estado acionista não pode dar. Por outro lado, também é razoável que o Estado saia desta intervenção com mais poder, até para ficar mais confortável (mesmo na defesa política dos apoios públicos). Com o que está em jogo, as duas partes vão ter de ceder — e a parte privada, como o primeiro-ministro assinalou, pode ter duas posições diferentes — e unir-se numa solução que afaste a nacionalização, rejeitada pelos privados, mas reforce a posição do Estado, não só no capital, o que será inevitável com os apoios financeiros, mas também na gestão executiva da TAP.

Todos os acionistas terão que fazer cedências e arranjar um modus operandi consensual, que permita a todos se sentirem devidamente representados nos vários órgãos de gestão, mas ao mesmo tempo mantendo uma gestão profissional, altamente qualificada, com experiência e que se norteia pela defesa dos interesses de todos os stakeholders. No meio da guerra que este sector irá viver durante os próximos 2 anos, é a meu ver, fundamental garantir a estabilidade interna para se poder superar a instabilidade externa."
Miguel Azevedo, diretor do Citigroup para a banca de investimento

“Num momento destes, todos os acionistas terão que fazer cedências e arranjar um modus operandi consensual, que permita a todos se sentirem devidamente representados nos vários órgãos de gestão da Empresa, mas ao mesmo tempo mantendo uma gestão profissional, altamente qualificada, com experiência e que se norteia pela defesa dos interesses de todos os stakeholders. No meio da guerra que este sector irá viver durante os próximos 2 anos, é a meu ver, fundamental garantir a estabilidade interna para se poder superar a instabilidade externa.”

Apoios à tesouraria, isenções de taxas e impostos. Ajuda do Estado à TAP vai impor condições

O modelo usado para apoiar a banca no pós-crise financeira poderá ser replicado no setor da aviação. Ou seja, os Estados poderão entrar como acionistas – ou reforçar, no caso português – e ter alguma intervenção na gestão, para mais tarde serem reembolsados com o recurso a investidores privados. Mas com uma diferença.

Se na banca a crise veio de dentro do sistema financeiro – com muitas culpas para os gestores e acionistas – no caso da aviação, o problema veio de fora. Não foi por má gestão das companhias. No limite, até se poderá invocar que o Estado tem responsabilidades, na medida em que impediu as empresas de voar, embora o tenha feito para controlar uma crise sanitária.

E não é só em Portugal que acionistas e gestores torcem o nariz a um reforço do Estado. O presidente executivo da Lufthansa, Carsten Spohr, sintetizou assim o dilema que o setor vive: Apesar de o grupo Lufthansa precisar de apoio dos governos (neste caso não será apenas o alemão), “não precisamos de gestão do Governo”, puxando do trunfo do sucesso empresarial desde a privatização, em 1997, e dos lucros conseguidos.

Poucos dias antes, o concorrente Air France KLM recebeu luz verde de Bruxelas para um apoio de Paris no valor de sete mil milhões de euros, entre garantias e empréstimos acionistas. Mas não foi um cheque em branco. Em troca, o grupo comprometeu-se a baixar os preços nos voos domésticos e fazer um corte radical nas emissões de CO2.

Não é só um problema de tesouraria, apoio deve acomodar retoma gradual e longa

Se esta fosse uma crise em V, de recuperação rápida, a TAP podia só precisar de apoio na liquidez, depois voltava ao mercado e resolvia o problema. Mas esta crise vai-se arrastar.

As projeções de analistas e da banca de investimento apontam para que, num cenário base (e não pessimista) o setor da aviação só consiga voltar ao nível de 2019 em 2023. Vai demorar três anos. É um período muito longo em que as empresas vão ter que se confrontar com excesso de oferta, guerra de preços para atrair procura, menos volume de receita e queda da rentabilidade.

Uma solução para a TAP não pode passar apenas por apoio de tesouraria

ANDRÉ KOSTERS/LUSA

Para além da necessidade apoio financeiro de uma natureza completamente diferente, que resulta do impacto brutal, mas totalmente exógeno, a todo o sector. Os 350 milhões de euros de financiamento com aval do Estado não chegam, como sinalizou o ministro das Infraestruturas no Parlamento, Pedro Nuno Santos. O conjunto de apoios pedidos pela empresa a 20 de março — isenções de taxas, adiamento de e fracionamento da entregas de impostos e contribuições sociais e passagem à reforma de colaboradores a partir dos 60 anos — representa um apoio indireto de mais 700 milhões de euros.

Para a TAP resistir, a dimensão do bolo tem de ser suficiente e não apenas ao nível de crédito, mas também na estrutura de capital.

“Dada a expectável dimensão do apoio financeiro, é compreensível que o Estado queira não só dotar a TAP de liquidez no presente mais também salvaguardar a solvabilidade da empresa no futuro, assegurando assim o correto retorno do apoio a ser concedido pelos contribuintes portugueses. A estrutura de capital tem que estar ajustada à incerteza do futuro e à dimensão do desafio”, defende Miguel Azevedo.

E os acionistas privados não estão em condições de responder a essas necessidades na TAP, nem em mais nenhuma companhia aérea porque a dimensão dos valores em causa é enorme. Com a exceção da Finnair, que vai fazer um aumento de capital no qual os acionistas públicos vão participar.

Em cima da mesa estará também uma revisão ou ajustamento da estratégia que os privados levaram à TAP. Os mercados de crescimento eleitos pela companhia portuguesa são neste momento os mais afetados — e alguns — como África e eventualmente América Latina — vão demorar mais tempo a recuperar. Mas também não faz sentido virar a leste onde a concorrência é muito grande e a TAP não tem a vantagem da posição geográfica, nem das comunidades luso-descendentes.

Até lá, a companhia vai ter de voar mais baixinho, mas sempre com as cores de Portugal, sublinhou António Costa, e continuará a promover a “continuidade territorial” e a servir a diáspora portuguesa. Uma maior utilização do aeroporto do Porto é outro ponto assinalado pelo primeiro-ministro numa estratégia futura, com intervenção do Governo.

Aeroporto do Porto

Aeroporto Sá Carneiro no Porto

ESTELA SILVA/LUSA

Mas se o ajustamento ao futuro da aviação implicar uma TAP mais pequena e com menos trabalhadores e esse será seguramente um ponto sensível na relação entre os dois acionistas. Sobretudo porque o apoio do Estado soberano tem sido dado sustentado no discurso político da defesa do emprego.

Nacionalização menos provável. Empréstimo privado com aval ou do empréstimo do Estado?

Os partidos à esquerda, PCP e Bloco defendem que o Governo deve aproveitar esta circunstância para forçar a nacionalização da TAP, mas apesar deste cenário não ter sido descartado em declarações públicas por vários membros do Governo, essa não deverá ser a estratégia. António Costa até disse que o Estado não está interessado em intervir na gestão do dia a dia da empresa.

Apesar do uso de frases slogan como “quem paga deve mandar”, o próprio ministro das Infraestruturas sinalizou que manter a hipótese de nacionalização em cima da mesa faz parte da estratégia negocial. Ao excluir alternativas estaria a perder força negocial com os privado e “chegava ao outro lado derrotado e em perda”. Mas isso não quer dizer que a nacionalização seja o objetivo.

Por outro lado, a proposta da comissão executiva num financiamento privado, com aval do Estado, pode não ser a melhor solução.

Se os financiadores exigem uma garantia pública, o risco passa todo para o Estado. Sendo assim, e no atual cenário, a opção mais favorável pode ser o Estado a emprestar diretamente à empresa. O que até pode ficar mais mais barato para a TAP.

Para o responsável do Citigroup, o “Estado deverá estudar qual a forma mais barata de levantar esses fundos (emitindo ele próprio OT’s, beneficiando da reputação de Portugal nos mercados internacionais), pois é o ponto de partida para um apoio mais eficiente e que permita um melhor resultado final. Em termos de risco para o Estado, conceder um aval ou financiar-se diretamente deverá ser indiferente, pelo que a opção mais eficiente deverá ser  escolhida”.

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