Depois de assistir ao funeral de um bombeiro em Cuba, no Alentejo, Marcelo Rebelo de Sousa fez questão de visitar Soure, local onde esta sexta-feira um comboio com 212 passageiros a bordo chocou com uma máquina que estava a operar na linha e acabou por descarrilar. Porém, apesar da gravata preta, símbolo de luto, a noite de Marcelo acabaria em Coimbra, para entregar a Taça de Portugal.

Do aparatoso acidente ferroviário resultaram dois mortos e 44 feridos, oito graves, dos apenas quais três permanecem internados no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. “Para o número de passageiros e a dimensão do acidente, foi um número muito reduzido de vítimas”, afirmou o Presidente ao chegar à linha de comboio, onde pelo menos uma via será reaberta à meia noite deste sábado.

À sua espera estava Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, que ao ser avisado pelo segurança que Marcelo estaria perto, apressou-se a colocar a gravata e a vestir o casaco do fato. Atravessou um troço para o cumprimentar e até foi alvo de elogios.

Maquinista do Alfa Pendular foi operado e está ligado ao ventilador enquanto aguarda nova cirurgia

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“Tenho que elogiar a forma rápida e empenhada com que o senhor ministro dirigiu, coordenou, esteve presente, veio para aqui e não largou um segundo o que se passava (…) Isto permite que 24 horas depois estejamos perante uma realidade que não tem a ver com aquilo que se temia. Quando houve a primeira notícia, temia-se uma tragédia de dimensão incalculável”, sublinha Marcelo.

No mesmo círculo de conversa, intercalado por jornalistas e também pelo autarca de Soure, estavam também os responsáveis da Infraestruturas de Portugal que deram detalhes ao Presidente. “O que os resultados preliminares do inquérito já apuraram é que a nossa viatura de manutenção estava a deslocar-se, não estava em trabalho, arrancou com o sinal vermelho e entrou rigorosamente no mesmo segundo em que o Alfa passava o sinal. Ou seja, se tinham entrado um segundo antes, os sistemas tinham funcionado e o acidente não teria nem de perto nem de longe as mesmas circunstâncias. Foi ter acontecido no mesmo segundo que levou a que isto pudesse acontecer.”

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Marcelo ouviu as explicações e recusou fazer “pré conclusões”, prefere esperar e parece não ter demasiada pressa. “É compreensível que um inquérito de uma matéria tão sensível não pode ser feito em poucas horas e de um dia para o outro.”

Referindo-se às duas vítimas e respetivas famílias, o Presidente pede “um respeito especial” na forma como se chegam a essas mesmas conclusões.

“É preciso apurar se houve ou não componente humana e acontece que houve duas vítimas que estavam precisamente numa das composições envolvidas. Também isso leva a que se tenha um cuidado especial e um respeito especial na forma como se apura o que aconteceu. Entendo que se fosse uma semana, um mês ou vários meses seria inaceitável, mas alguma precaução na elaboração das conclusões e na explicação penso que é sensato.”

Marcelo quer a verdade, mas também prudência e precaução: “Tudo isto tem de ser gerido com verdade, mas também com toda a precaução e todo o cuidado. Mais vale demorar um pouco mais e ter um retrato mais próximo e fino da realidade, do que ser muito rápido e ser corrigido ao longo do tempo.”

A IP garante dar “todos os esclarecimentos” numa conferência de imprensa no início da próxima semana”. Afirma que abriu uma investigação interna e avisou pessoalmente, “e de acordo com os procedimentos normais”, as famílias das vítimas.

“Não podemos retirar generalizações quanto à ferrovia”

Tanto para Marcelo como para Pedro Nuno Santos, o acidente desta sexta-feira não pode ser exemplo, mas sim exceção que não coloca em causa a segurança da ferrovia. “É lamentável o que aconteceu, é dramático, mas não podemos daqui retirar generalizações quanto à ferrovia, quanto à segurança, importância e papel fundamental que tem para todos os portugueses e sobretudo daqueles que menos meios têm”, destaca o Presidente da República, acrescentando que “na vida, sabemos que os sistemas nem sempre funcionam e as pessoas também”.

As histórias de quem viu, acudiu e viveu o descarrilamento de Soure

O Chefe de Estado não tem dúvidas de que os portugueses “podem ter a certeza de que é seguro utilizar a ferrovia”, fala num grau elevado de sofisticação tecnológica e considera o caso de Soure “muitíssimo raro” de acontecer.

Já à saída do Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, onde ambos visitaram três feridos graves — o maquinista, que se encontra ventilado, mas estável, e duas mulheres – o ministro das Infraestruturas voltou a pedir confiança aos portugueses.

“A ferrovia é um dos meios mais seguros que existem, muito mais seguro que o automóvel, não há qualquer tipo de aproximação. Tivemos um acidente e isso é um motivo de grande preocupação, é importante percebermos exatamente o que aconteceu, mas em nenhum momento se perca de vista que o comboio é o meio de transporte terrestre mais seguro que existe.”

Consciente de que não pode garantir a inexistência de acidentes, Pedro Nuno Santos quer identificar razões para depois tirar conclusões. “De acordo com a lição que é tirada, são tomadas as ações para tentar minorar. Nunca vamos conseguir, em nenhum meio de transporte, reduzir a zero os incidentes e acidentes. Isso não existe.”