A Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, que tem a tutela sobre os lares de idosos (bem como o restante setor social) admitiu em entrevista ao Expresso que não leu o relatório da auditoria feita pela Ordem dos Médicos ao lar de idosos de Reguengos de Monsaraz, onde um surto de Covid-19 atingiu 162 pessoas e matou 18.

“Reguengos é um dos surtos que tivemos. A minha preocupação tem de ser estrutural”, afirmou a ministra ao Expresso. “No caso de Reguengos, a grande dificuldade foi encontrar funcionários quando muitos ficaram doentes. É preciso aumentar a aposta nos recursos humanos do sector social.”

Ana Mendes Godinho revela que foi já aprovado o reforço de 5800 pessoas para instituições do setor social, ao abrigo de um programa especial criado em abril. O objetivo, afirma, é colocar cerca de 15 mil até ao fim de 2020. O programa paga 90% do custo da contratação até ao fim de dezembro e depois, se ficarem no quadro, dá um prémio de dois salários mínimos a quem integrar estas pessoas.

Os relatos de “caos” e “terror” denunciados por funcionários e familiares são consistentes com os resultados da auditoria feita pela Ordem dos Médicos, cujo relatório final foi remetido para o Governo. A auditoria concluiu que dos 16 idosos que morreram no lar (as outras duas vítimas mortais foram uma funcionária e um motorista) grande parte morreu devido a desidratação ou agravamento das doenças crónicas que já padeciam.

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“Não o li pessoalmente, mas a Ordem fez-me chegar o relatório e já pedi que o analisassem”, admitiu a ministra.

Lar de Reguengos. Funcionárias e familiares fazem relatos de “caos” e “terror”: “Houve ali muita negligência”

“No lar de Reguengos foram feitos testes a todos os funcionários, mas é impossível fazer testes todos os dias. E existia um plano de contingência”, acrescentou Ana Mendes Godinho na entrevista que faz manchete no Expresso este sábado. “Como foi desencadeado por parte do MP um processo, temos de aguardar. Nem deve haver dois processos a correr em simultâneo.”

Dimensão dos surtos em lares “não é demasiado grande”

Na entrevista, Ana Mendes Godinho desvalorizou o peso dos lares de idosos na evolução da pandemia da Covid-19 em Portugal. “Se nos compararmos com outros países da Europa, 38,8% das mortes ocorridas em Portugal são de pessoas que estavam em lares, em França a taxa de incidência é de 50%, na Bélgica de 51%, em Espanha de 60%.”

“Tivemos 365 surtos [em abril] e temos 69 agora! Claramente, temos menos incidência. Temos 3% do total dos lares e temos 0,5% das pessoas internadas em lares que estão afetadas pela doença! A dimensão dos surtos não é demasiado grande em termos de proporção. Mas, claro, isto não significa que não devamos estar preocupados”, acrescentou.

Ao mesmo tempo, Ana Mendes Godinho afirmou que o seu papel não é apurar responsabilidades, mas apoiar as instituições: “A minha preocupação não tem sido apurar as responsabilidades dos surtos. O meu objetivo no acompanhamento dos surtos não tem sido a responsabilização. De facto, não tem sido. Tem sido criar instrumentos de reforço para apoio às instituições e acompanhá-las”.