A bastonária da Ordem dos Enfermeiros (OE) considerou este domingo que as medidas do Governo para melhorar as condições sanitárias em Portugal no quadro da pandemia de covid-19 “vêm tarde”, uma vez que “houve muitos meses para as preparar”. E alerta que faltam enfermeiros preparados para lidar com o equipamento da pandemia. Exemplo? Os ventiladores. “As pessoas têm de se convencer que um ventilador não é uma ‘Bimby’, que se carrega num botão e que o doente fica estável e que está bem cuidado”, observou.

Em declarações à agência Lusa, Ana Rita Cavaco defendeu que, quer o Governo quer as ordens profissionais, tiveram acesso a estudos que demonstravam que havia a possibilidade de haver um número elevado de casos em novembro e ainda maior em dezembro.

Segundo o último boletim da Direção-Geral da Saúde (DGS), divulgado no sábado, Portugal contabiliza pelo menos 2.507 mortos associados à covid-19 em 141.279 casos confirmados de infeção.

“Sabíamos que podíamos chegar a uma situação, quer por estarem infetados, quer por estarem em isolamento, quer por haver mais doentes, em que seriam necessários mais enfermeiros e não temos esse rácio adequado”, sublinhou Ana Rita Cavaco, salientando que o Portugal é dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) com o menor índice de enfermeiros por 1.000 habitantes (um para dois doentes, quando a média é de um para cada paciente).

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“Não podemos baixar esse rácio, porque vamos pôr em perigo esses doentes que estão nas unidades de cuidados intensivos (UCI)”, sustentou.

“Há muito tempo que enviámos ao ministério [da Saúde] uma listagem daqueles enfermeiros que ainda estão disponíveis no mercado para contratar, que são pouco mais de 400, e, em vez de termos essa estratégia, aquilo que assistimos foi a uma série de medidas avulsas que nem faziam sentido”, afirmou.

“Primeiro anunciaram que iam pôr alunos de enfermagem na linha de saúde pública, quando nós também enviamos dados ao governo, dizendo que temos ainda mais de 200 enfermeiros de saúde pública que estavam noutras funções e que podiam ser colocados na linha de saúde pública, e, para colmatar a saída desses especialistas de saúde comunitária dessas funções, teríamos então de contratar estes que estão disponíveis no mercado”, acrescentou.

Para Ana Rita Cavaco, a partir de agora, a gestão vai ser feita “dia a dia e escusava de ser feita ao dia numa fase destas”, porque, insistiu, “houve tempo para preparar”.

Segundo a bastonária, a OE pediu um estudo para saber quais e quantos são os enfermeiros com experiência em cuidados intensivos que estariam noutras funções e que também poderiam ser deslocados para as unidades de cuidados intensivos.

“Dos dados que obtivemos, não haverá muitos mais com experiência em cuidados intensivos. Resta-nos contratar aqueles que existem no mercado, sabendo que um enfermeiro com experiência em UCI não a adquire em cursos de 16 horas, como alguns hospitais quiseram fazer, porque trabalhar com um ventilador é muito complicado”, afirmou, assumindo desconhecer como trabalhar com um.

“As pessoas têm de se convencer que um ventilador não é uma ‘Bimby’, que se carrega num botão e que o doente fica estável e que está bem cuidado”, observou.

Para a bastonária, “tudo isto teria de ter sido pensado antes e não oferecer contratos de quatro meses aos enfermeiros, porque muitos estão a recusar e acabam por preferir, pandemia por pandemia, emigrar para outros países que estão com políticas de contratação muito agressivas”.

Segundo Ana Rita Cavaco, há vários países que fazem esses pedidos à OE, oferecendo-lhe mais salário, outras condições e contratos por mais de quatro meses.

“Aliás, com tudo o que está a acontecer em termos de atividade assistencial, que está a ser adiada por causa da covid-19, vamos demorar muito tempo para recuperar as cirurgias, as consultas, e vamos precisar destes enfermeiros. O que [o Governo] tem de abrir é concursos, que desde janeiro não abriu nenhum, nem para enfermeiros de cuidados gerais nem especialistas”, frisou.

Sobre a contratação de enfermeiros reformados, Ana Rita Cavaco considerou uma medida positiva, mas apenas para laborarem nas unidades de saúde pública, uma vez que são pessoas que, pela sua idade, também serão de risco.

Por isso, contratá-las para fazer os rastreios poderá ser uma hipótese.

O Conselho de Ministros anunciou no sábado novas medidas para tentar controlar a epidemia de covid-19, entre as quais a contratação de enfermeiros reformados para rastreios de contactos da covid-19, a contratação de 350 enfermeiros para as UCI e mais 202 camas para as UCI.