Os sindicatos de médicos e enfermeiros consideram que a atribuição de prémios apenas aos profissionais de saúde que trabalharam na primeira fase da pandemia do novo coronavírus vai criar desigualdades. Em declarações ao Público, responsáveis sindicais puseram em causa os critérios da medida do Governo, aprovados no sábado em Conselho de Ministros, e defenderam que o número de profissionais que abrange é demasiado reduzido.

Os prémios abrangem os profissionais do Serviço Nacional de Saúde que, durante o estado de emergência decretado na primeira vaga da pandemia, exerceram funções diretamente relacionadas com a Covid-19. Estes consistem na atribuição de 50% da remuneração base mensal do trabalhador, pago de uma só vez; de um dia de férias por cada período de 48 horas de trabalho suplementar; e de um dia de férias por cada período de 80 horas de trabalho normal.

Guadalupe Simões, dirigente nacional do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, considerou que “atribuir o prémio só aos profissionais que estiveram em áreas dedicadas à Covid-19 significa muito poucas pessoas”. “Um dos critérios é atribuir o prémio aos profissionais que trabalharam nas instituições de primeira e segunda linha durante aquele estado de emergência. Os doentes espalharam-se por todos os hospitais”, salientou a responsável ao Público.

Para Lúcia Leite, presidente da Associação Sindical Portuguesa dos Enfermeiros, os critérios são também “limitativos” e deixam de fora, por exemplo, os profissionais que trabalharam com grávidas em ginecologia enquanto se aguardavam testes por serem casos suspeitos. Já Noel Carrilho, presidente da Federação Nacional dos Médicos, lamentou que “para a limitação de direitos como férias, assistência à descendência, realização de horas extraordinárias o universo seja muito mais alargado do que para a atribuição de uma compensação”.

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Lúcia Leite lembrou ainda que a medida chega numa altura em que a situação se tornou mais grave e em que “o número de enfermeiros em áreas Covid-19 e intermédias é muito maior”. “O prémio vem fora de tempo e não abrange todos os profissionais. Atribuir o prémio só à primeira vaga é um presente envenenado e a forma como o está a gerir, mais envenenado vai ser”, declarou.

Ordem dos Médicos lamenta “injustiça” dos prémios

Num comunicado enviado esta terça-feira às redações, o bastonário da Ordem dos Médicos lamentou “a propaganda, injustiça e aproveitamento político que a tutela está a fazer com esta suposta recompensa”, “uma ilusão desonesta que não dignifica nem respeita a responsabilidade, competência e qualidade dos nossos médicos”, considerou Miguel Guimarães.

O bastonário apontou que, “a título de exemplo, só são elegíveis para o ‘prémio’ os profissionais que tenham trabalhado pelo menos 30 dias com doentes Covid-19, dos 45 dias do estado de emergência, nada importando se estiveram a contribuir noutras áreas vitais para o sistema de saúde incluindo doentes com Covid-19 ou até se ficaram infetados antes do prazo referido”. “Na prática”, a medida “coloca uma série de entraves e condicionantes que limitarão ainda mais o número de médicos e de outros profissionais de saúde abrangidos”.

Na perspetiva de Miguel Guimarães, isto significa que tudo não passa de “uma ação de propaganda exercida de forma injusta e que não honra o esforço que tem sido feito pelos médicos nesta pandemia. Recorde-se que, só até ao final de agosto, os médicos já tinham feito 6 milhões de horas extraordinárias, num valor superior a todo o ano de 2019, e que nesta segunda vaga crescerá ainda mais”, frisou.

Ministra da Saúde admite prémios para profissionais que estão a trabalhar na segunda vaga

Marta Temido admitiu alargar os prémios que vão ser atribuídos aos profissionais de saúde que ajudaram a combater a primeira vaga de Covid-19 aos que estão a trabalhar na segunda. Em entrevista ao Público e à Renascença, a ministra da Saúde afirmou que o Governo está “momento a regulamentar uma norma que é votada pela Assembleia da República. E, portanto, obviamente, se houver esse quadro legal, certamente que sim”.

Sobre a crítica dirigida pelos sindicatos aos critérios da medida, Marta Temido disse que “não há nenhum governo nem nenhum ministério da saúde em concreto, ou nenhum ministro da saúde, que não desejasse compensar o mais possível, até aos limites das suas possibilidades, aquilo que tem sido o empenho dos profissionais de saúde”.

Artigo atualizado às 13h32 com as declarações da ministra da Saúde ao Público