Com o passar dos anos e o final da carreira ativa no futebol a fazer o que mais gostava, Diego Armando Maradona foi-se aproximando da esquerda latino-americana. E adotou uma segunda pátria, Cuba, bem visível em tatuagens que fez: no ombro direito, uma das imagens mais icónicas de Che Guevara; na perna esquerda, o rosto de Fidel Castro. “Foi como um segundo pai para mim”, admitiu El Pibe no dia da morte do antigo líder cubano. Quatro anos depois, no mesmo dia do desaparecimento de Fidel, o mundo chora a morte do seu eterno 10. E conhece histórias que não se conheciam, como o dia em que Eric Clapton tentou salvar o argentino quando estava em Cuba.
A história é contada pela então correspondente do Clarín em Londres, recordando um episódio que começou com uma conversa do músico britânico com a empregada, Nidia, que chegara a Londres para estudar inglês mas que limpava casas para pagar o curso. A brasileira, como não poderia deixar de ser, era fanática por futebol e serviu de ponte para a ideia de dois jornalistas, María Laura Avignolo e um britânico do The Observer. A ideia passava por colocar Eric Clapton em contacto com Maradona para que pudesse deixar Cuba e fazer o seu tratamento às adições a droga e álcool na clínica do música na Antigua, a Crossroad Centre. Sem custos. Quando estava numa digressão no Japão, Clapton conseguiu falar com o astro argentino (a quem iam traduzindo a conversa) de madrugada. Explicou a sua admiração, contou-lhe a sua história, garantiu que o mandaria buscar quando quisesse. Maradona disse que sim a tudo mas acabou por não sair de Cuba, onde trocava de forma constante de telefone e onde nem sempre conseguia fugir às más companhias que o visitavam quando mais tinha de “jogar” sozinho.
Nos últimos dias de vida, as pessoas mais próximas de El Pibe já estavam a começar a preparar um novo “Plano Cuba”, mais por “estímulo motivacional” na recuperação após a intervenção cirúrgica a que foi sujeito do que propriamente para fugir às adições como nas outras ocasiões. E essa hipótese ganhava cada vez mais força. Não foi a tempo. Agora, cumprindo aquilo que o próprio pediu ainda em vida, terão de escrever “Obrigado por ter jogado futebol, obrigado à bola” na sua lápide. Mas como foram os últimos dias de El Pelusa após fazer 60 anos?
Apesar de haver uma perceção externa que a recuperação à operação a um hematoma no cérebro na Clínia Olivos estava a correr da melhor forma, o Clarín, primeira publicação a dar conta da morte do ídolo argentino, assegura que Diego teve várias recaídas não só de saúde mas também em termos anímicos, o que fazia com que os seus responsáveis médicos começassem a admitir um regresso gradual ao trabalho. Na casa onde estava, em Tigre, era acompanhado 24 horas por dia por uma enfermeiro, por um psicólogo e por um psiquiatra, realizando exercícios físicos com um especialista para melhorar a sua força motora. Essa parte estava a ser seguida, o problema era o segundo passo: encontrar motivações. Nem as visitas frequentes das filhas Gianinna e Jana melhoravam essa fase. E até já começava a ser assumida a possibilidade de ir a alguns treinos do Gimnasia, só para observar.
Nos últimos dias, depois da tristeza que sentiu ao não poder contar por variadas razões com todos os filhos e um dos netos, Benjamín, no 60.º aniversário, essa quebra anímica era ainda mais evidente. Diego estava mais e mais ansioso. Esta quarta-feira, acordou, levantou-se por volta das 10h, fez a habitual caminhada, sentou-se e ficou encostado. Algo de estranha já estava a acontecer. Maximiliano Pomargo e Johnny Espósito, que acompanhavam sempre El Pibe, começaram a ligar ao círculo mais próximo, onde se incluíam o médico particular Leopoldo Luque, o advogado Matías Morla e as filhas que vivem na Argentina, Dalma, Gianinna e Jana. As ambulâncias começaram a chegar. Por volta do meio dia, já eram seis. Apesar de todas as tentativas de reanimação, Maradona morrera.
Luque, Carlos Díaz e Agustina Cosachov, a equipa médica que acompanhava em permanência El Pelusa desde a operação, já estudavam uma forma de colocar de novo o argentino em Cuba. Ligações afetivas à parte, era uma terra especial que poderia quebrar o estado de depressão e angústia que atravessava, tendo mesmo existido um telefonema de Tony Castro, filho de Fidel, a oferecer estadia e total privacidade para recuperar com as melhores condições no país. Segundo a publicação, já era mais do que um mero cenário. Tornara-se uma probabilidade cada vez mais forte. Além de Pomargo e o sobrinho Espósito, tinha também a seu lado esta manhã Monona, uma espécie de segunda mãe que fazia os melhores guisados do mundo e que garantia que nada do que mais gostava lhe faltava, das bebidas sem álcool com prescrição médica aos rebuçados e frutos secos, outra das suas perdições.