Os pilotos da TAP podem ganhar entre 85 mil euros a 260 mil euros por ano, de acordo com números divulgados pelo ministro das Infraestruturas. À pergunta sobre se estes valores eram demasiado, Pedro Nuno Santos respondeu com outra: “Não sei. O que acha?”

Pedro Nuno Santos revela salários de pilotos da TAP que vão dos 84 mil a 260 mil euros por ano

Mas há várias maneiras de apresentar as contas salariais dos pilotos e as conclusões mudam consoante o ângulo usado, ainda que em algumas categorias, os pilotos da TAP possam mesmo ter uma remuneração anual superior aos colegas da Iberia.

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Em comunicado divulgado esta quinta-feira, o Sindicato dos Pilotos contesta os montantes apresentados pelo ministro, que é acusado de estimular uma “campanha de desinformação com o objetivo de transferir para os pilotos o ónus dos maus resultados da TAP”. O Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil (SPAC) põe em causa os critérios usados na comparação divulgada por Pedro Nuno Santos para justificar a necessidade de implementar cortes nos custos salariais e no número de funcionários, que no caso dos pilotos pode chegar aos 30%.

“Quando se comparam salários entre pilotos de várias companhias aéreas deve existir uma base idêntica. Ou seja, por exemplo, os mesmos dias de atividade mensal e horas de trabalho e a diferenciação entre vencimento base e variáveis associadas ao trabalho prestado e trabalho suplementar”, sublinha o SPAC.

A comparação elaborada pelo SPAC com os pilotos da Iberia, Air Europa e da Air France chega a números diferentes dos revelados por Pedro Nuno Santos, ainda que – em alguns dos exemplos – os profissionais da TAP surjam com valores mais elevados do que os pagos pelas duas transportadoras espanholas, referidas por Pedro Nuno Santos. É o caso dos comandantes com 10 anos de antiguidade e oficiais piloto com 1 e cinco anos de antiguidade. Já em relação à Air France e nos profissionais com mais antiguidade, 25 anos, os pilotos da TAP aparecem a ganhar sempre menos.

Esta análise tem por base o montante anual recebido pelas várias categorias profissionais de pilotos, em valores brutos, mas apenas referente às remunerações base, aquelas que o sindicato considera comparáveis. Isto porque dois pilotos de categorias profissionais iguais e até com o mesmo número de anos de voo podem chegar ao final do ano com remunerações distintas, em função do número de horas extraordinárias ou trabalho suplementar que cada um tenha realizado, e que acresce à remuneração base.

E essa é precisamente uma das falhas que o SPAC aponta às contas apresentadas por Pedro Nuno Santos. Os custos com os pilotos da TAP foram significativamente agravados em 2018 e 2019 (durante a gestão privada, assinalou o governante) por recurso a trabalho extraordinário a pedido da empresa. Para o SPAC, “custos por trabalho extraordinário não são as mesma coisa que remuneração base” e explica que este aumento extraordinário se deveu ao crescimento da oferta de voos, que não foi logo acompanhada pela contratação de mais profissionais — só em outubro de 2018 é que a TAP lançou processo para contratar mais 300 pilotos.

No entanto, e de acordo com informação da TAP prestada ao Observador pelo Ministério das Infraestruturas, o efeito extraordinário das horas suplementares e extraordinárias pagas em 2019 foi retirado dos valores usados para a TAP nas comparações com as empresas espanholas precisamente porque se verificou um aumento significativo da atividade no ano passado. Foi usada uma parte dos pagamentos extra realizados em 2018.

As contas dadas por Pedro Nuno Santos, e que foram elaboradas pela empresa, foram feitas através da estimativa de remuneração total com base nos dados públicos dos acordos de empresas, e que depois foram ponderado, “calibrados”,  através de entrevistas. A comparação usa os valores máximos encontrados para a Iberia e para a Air Europa e não valores médios.

Segundo o sindicato, o recurso ao trabalho extraordinário permitiu à TAP reduzir os custos em fretamento (contratação externa), de 205 milhões de euros em 2018 para 10 milhões de euros em 2019. Não são contudo revelados dados (que eventualmente o sindicato não terá) de quanto receberam os pilotos pelo trabalho extraordinário realizado nesses anos.

O SPAC recorda também que foi a administração da transportadora, então liderada por Antonoaldo Neves, a propor a assinatura de um acordo que regula a prestação de serviço de voo em dias de folga e de férias. Estas condições foram entretanto transpostas para o acordo de empresa com estes profissionais, um dos mecanismos de negociação coletiva que a transportadora pretende suspender para implementar a reestruturação e viabilizar cortes de 1,4 mil milhões de euros nos custos com pessoal até 2024.

O SPAC estranha ainda que os dados mostrados pelo Executivo não comparem os salários pagos pela TAP com os de outras concorrentes, como a Lufthansa ou a British Airways, e que não levem em consideração que o hub da transportadora portuguesa concorre com o destas grandes companhias em destinos como o Brasil, os Estados Unidos e África. A comparação com a Air Europa e a Iberia é justificada por dois critérios: custos de vida mais próximos entre os dois países e capitais e o facto de estas companhias concorrerem com a TAP nos voos para a América Latina.