Um dente de elefante encontrado por um mariscador na foz do rio Mira, em Vila Nova de Milfontes, deu origem a um estudo publicado na revista Scientific Reports, disse esta quarta-feira à Lusa um dos autores.
A equipa de investigadores detetou semelhanças com os dentes molares de uma espécie que habitou a Península Ibérica há cerca de 30 mil anos, mas a datação por carbono-14 permitiu “dissipar as dúvidas” e concluir que se trata de um dente com origem no Oeste de África, com cerca de 230 anos, disse Carlos Neto de Carvalho, do Centro Português de Geo-História e Pré-História (CPGP).
“O estudo tem significado porque pode ter aplicação na investigação de possíveis proveniências geográficas de materiais genéticos antigos. É uma técnica que não é muito utilizada e pode vir a ser aplicada a comunidades humanas antigas e ajudar a traçar o trajeto de migrações”, disse.
Nesse sentido, depois do contacto com o Laboratório de ADN Antigo de Creta, na Grécia, foi desenvolvido um trabalho de investigação que permitiu descobrir as origens africanas do dente e o seu percurso até ser encontrado nas margens do rio Mira, no concelho de Odemira.
Conseguimos determinar a área de onde veio o dente. Depois foi cruzar essa informação com os naufrágios ao largo da costa naquela zona e demos com um navio negreiro que transportava mercadoras entre Cabinda, França e as Caraíbas”.
Neto de Carvalho admitiu ainda que a equipa de investigadores pensava que o achado “podia ser bem mais antigo”, mas acabou por concluir que se trata de um elefante africano da floresta com “características morfológicas e genéticas muito semelhantes” às da espécie que povoou a Península Ibérica há cerca de 30 mil anos.
Veio da bacia do Congo e, por coincidência, há um naufrágio que aconteceu naquela zona da costa dentro do intervalo de erro da datação por carbono-14 de um navio que vinha dessa zona, de Cabinda. Era de um armador francês e provavelmente, além de escravos para as colónias francesas nas Caraíbas, traria mercadorias daquela zona”.
O estudo foi publicado em novembro pela revista Scientific Reports e enquadra-se no projeto de investigação do CPGP e da Câmara Municipal de Odemira intitulado “Registo Paleontológico dos Últimos Elefantes do Continente Europeu”, coordenado por Carlos Neto de Carvalho.