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No país da Web Summit, Ana Gomes vira o jogo de Ventura contra Marcelo

Este artigo tem mais de 3 anos

Ana Gomes responde a insultos de Ventura para criticar Marcelo, que faz "o jogo da ultra-direita". Já o Governo merece elogios. Manuel Alegre "aparece" a criticar vazio do PS e a elogiar resistência.

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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Cinfães, 14h. Os carros da (mini-)comitiva preparavam-se para arrancar, depois de uma visita ao quartel de bombeiros da vila, quando se avistam movimentações à volta da candidata. Afinal, uma das televisões tinha pedido uma reação às acusações da véspera feitas por André Ventura e Ana Gomes acedeu responder. Desde o início que a direção de campanha tinha dito que a estratégia seria deixar Ventura a falar sozinho, não só por essa ser a única resposta possível a forças “anti-democráticas”, mas também porque se o objetivo é empurrar Marcelo para baixo, então há que apontar para cima. Mas Ana Gomes queria ir “a jogo”. E foi. Mesmo que para isso tenha percorrido mais de 300 km.

“Eu estou em jogo pela valorização da democracia, e tudo o que tem sido feito no sentido de desvalorizar eleições faz o jogo da ultra-direita”, disse quando questionada sobre se a melhor resposta ao candidato apoiado pelo Chega não deveria ser o silêncio, ou seja, “não ir a jogo”. André Ventura, na noite passada, tinha usado insultos jocosos para caracterizar os seus adversários, apelidando, por exemplo, Jerónimo de Sousa de “avô bêbado” e Ana Gomes de “contrabandista”. Insultos que, na opinião da ex-eurodeputada socialista, são a “demonstração de que a ultra-direita não é só mais uma corrente de opinião como diz Marcelo Rebelo de Sousa, é um perigo para a democracia”.

Era Ana Gomes a procurar dar uma lição a Marcelo Rebelo de Sousa, indo a “jogo” para virar “o jogo” contra ele. E a lição era esta: “Usar insultos para estigmatizar pessoas ou comunidades não pode ser tolerado na nossa sociedade” e “é preciso fazer mais do que apenas combater as ideias”, como disse Marcelo Rebelo de Sousa no debate frente a André Ventura, numa crítica implícita a quem, como Ana Gomes, defende que o Chega não devia ser um partido legalizado no TC. É preciso combater também “as forças ocultas que estão por detrás da ultra-direita”, disse, insistindo que “a democracia não pode ser tolerante com intolerantes” e quem é democrata não pode achar que a ultra-direita é “só mais uma corrente de opinião”.

Ana Gomes tira notas durante uma visita ao quartel de bombeiros de Cinfães

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

O apoio de Alegre. E a crítica Costa: “O vazio do PS é uma forma de desvalorizar o regime”

Longe vão os tempos em que os notáveis e os apoiantes-surpresa “apareciam” nos eventos, para imprimir um ritmo crescente às campanhas eleitorais — que se prolongam por duas semanas em modo intensivo e que convém que tenham picos de interesse mediático. Ao quinto dia, o terceiro de pé na estrada, foi Manuel Alegre quem “apareceu”, embora não tenha saído de casa.

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Foi no habitual ciclo de conferências online, transmitido na página de Facebook de Ana Gomes, que o histórico socialista apareceu a dar um “boost” à campanha de Ana Gomes. E como é que o fez? Criticando o PS, o partido que os une, por ter “desertado” destas eleições e elogiando “o espírito de resistência anti-fascista” da ex-eurodeputada.

https://www.facebook.com/anagomesapresidente2021/videos/250940219747828

O tom é solene, de quem reconhece o perigo a chegar: “A democracia está a ser minada por dentro, isto já não vai lá com tanques na rua”. Daí que seja obrigatório os democratas não faltarem à chamada. Mas o PS faltou à chamada da democracia, e Manuel Alegre, que também já foi candidato à Presidência da República sem o apoio do partido, não esquece. “Só é vencido quem desiste de lutar, e os socialistas não podem desertar. Não vamos desistir, vamos lutar e vamos vencer”, disse, referindo-se à ameaça que paira das forças anti-democráticas encarnadas em André Ventura.

A não comparência do PS criou um vazio e isso é uma forma de desvalorizar o regime semipresidencialista do qual o PSé fundador. A não comparência do PS desvaloriza o facto de pela primeira vez haver uma candidatura que põe em causa a Constituição e que quer destruir as instituições democráticas”, disse, sugerindo ao partido liderado por António Costa, que pusesse os olhos em França. “Quando chegou o Le Pen pai, o PS até não se importou porque podia tirar uns votos à direita, e veja-se onde está agora a Frente Nacional e onde está agora o PS em França”.

Rui Tavares, dirigente do Livre e co-autor dos compromissos políticos da candidatura de Ana Gomes, também participou na conferência e deixou uma imagem para explicar o porquê de a apoiar nesta corrida: Ana Gomes a escrever cartas a quem de direito, desde juntas de freguesia ao Presidente da República, para resolver qualquer que seja o problema que esteja mal. “É um exemplo de cidadã que não baixa os braços”, disse.

Ana Gomes participa todas as tardes, às 18h, num ciclo de conferências online com apoiantes. Hoje foi Manuel Alegre e Rui Tavares

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

No país da Web Summit, o 4G não é igual para todos.

E de quem é a culpa? Marcelo Rebelo de Sousa (Para o Governo, só elogios)

Ana Gomes saiu de Lisboa de manhã cedo rumo a Cinfães, um concelho no norte do distrito de Viseu, a 50km do Porto por entre estradas acidentadas. Chegou pouco depois da hora marcada, 11h30, à escola profissional de Cinfães, construída com recurso a fundos comunitários e que tem fama de ter uma taxa de empregabilidade de 100%. Foi recebida pelo presidente da câmara, e líder da concelhia socialista de Cinfães, Armando Mourisco, com o diretor da Escola e falou com alunos da área da hotelaria, incluindo uma jovem que já pensa num plano B se a restauração falhar: concorrer à GNR. Foi música para os ouvidos da candidata, que gosta de ver mais mulheres em meios tradicionalmente dominados por homens.

[Ouça aqui a reportagem da Rádio Observador]

Ana Gomes “à procura de 4G” em Cinfães

Mas nem tudo é bom num concelho frio e despovoado. As acessibilidades são um problema, e não só as acessibilidades “de betão”. Também as “acessibilidades da tecnologia” são a prova de que o país da Web Summit é um país de desigualdades. “É um alívio saber que desta vez não fecharam as escolas, porque temos muitos problemas com o ensino à distância onde a internet tem muitas zonas de sombra”, disse o diretor da escola profissional, Paulo Vasconcelhos, admitindo que o 3G ainda é “muito litoral” num país “centralizado na capital”.

“É incompreensível nos dias de hoje, no país da Web Summit, haver estas desigualdades. A Web Summit não pode ser só um evento mediático em Lisboa, tem de ter consequências nas tecnologias de informação para o país”, disse a candidata, pedindo um Estado forte também para isso: para combater as desigualdades.

E um Estado forte, no seu entender, passa por um Estado descentralizado, reorganizado, e, idealmente, regionalizado. Em declarações aos jornalistas, no final da visita à Escola, Ana Gomes lembrou que o referendo à regionalização foi há mais de 20 anos e foi “perverso”. “Na altura foi promovido pelo professor Marcelo Rebelo de Sousa, enquanto líder da oposição, que quis o referendo para boicotar a regionalização”, acusou.

Para Ana Gomes, que não defende um referendo, mas que é a favor da descentralização a abrir caminho a uma eventual regionalização, a culpa é de Marcelo Rebelo de Sousa. “Não tem havido vontade política porque Marcelo Rebelo de Sousa é contra a descentralização e a regionalização”, disse, defendendo o reforço de competências dos autarcas, melhor conhecedores do terreno, para gerir os fundos comunitários e para não perderem oportunidades ao ficarem dependentes das aprovações e das burocracias de Lisboa.

A candidata cujas sondagens dizem que disputa o segundo lugar, não tira os olhos do primeiro, que culpa de todos os males. Já para o Governo, que, ainda ontem, anunciou “medidas duras mas indispensáveis” de combate à pandemia, só elogios: “O Governo atuou bem”. Uma vez mais, Ana Gomes põe as fichas todas no ataque ao Presidente da República, que continua a ter uma “atitude displicente” em relação aos eleitores, e que não tomou medidas atempadas no sentido de preparar uma campanha eleitoral com vista ao esclarecimentos dos eleitores em plena pandemia.

Terminada a visita à escola, onde foi também acompanhada pelo diretor de campanha distrital, o ex-presidente da federação do distrito de Viseu da JS, Luís Soares, as críticas a Marcelo foram para o bolso e Ana Gomes acedeu a tirar um par de “selfies” com um grupo de jovens que não resistiram ao famoso registo fotográfico com a candidata a Belém. Homenagem?

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