Em outubro de 2019 a empresa Novavax estava prestes a morrer, como anunciou à data um ex-administrador lembrado pela revista Science. Dois anos depois, tudo viria a mudar, com a empresa a lançar no mercado uma nova vacina contra a Covid-19, a Nuvaxovid.
Mas já lá vamos. Em 2019, a empresa sediada em Maryland, nos Estados Unidos, tinha, em menos de três anos, fracassado em dois ensaios clínicos e as ações da empresa caíram a pique. Chegou mesmo a vender duas das suas fábricas em Maryland e dispensou mais de cem funcionários para reduzir custos.
Em janeiro de 2020, Jan já o novo coronavírus tinha sido identificado na China, a Novavax empregava apenas 166 pessoas. No final do ano, porém, e com a propagação do vírus a ser considerada uma pandemia, tinha mais 300 funcionários. O que mudou? Os 2 mil milhões de euros que o governo norte-americano e a Coalition for Epidemic Preparedness Innovations (CEPI) lhe deu para que conseguissem produzir uma vacina contra a Covid-19.
No final de janeiro de 2021, o administrador da empresa de biotecnologia, Stanley Erck, acabou por anunciar os resultados da terceira fase de ensaios clínicos da vacina: uma eficácia de 89,3%. “É a primeira vacina a demonstrar não apenas alta eficácia clínica contra Covid-19, mas também eficácia clínica significativa contra as variantes emergentes do Reino Unido e da África do Sul”, anunciava, contrariando quem chegou a duvidar que uma empresa tão pequena conseguisse competir com as grandes farmacêuticas.
A 20 de dezembro, a Agência Europeia do Medicamento anunciou resultados combinados, mais precisos, da taxa de eficácia desta vacina: 90%, mas sem considerar novas variantes.
Como as vacinas contra a Covid-19 que já estão a ser administradas em Portugal, a da Pfizer e a da Moderna, a NVX-CoV2373 — assim se chama a vacina da Novavax — exige também duas injeções num intervalo de três semanas entre elas. Mas há algo que a distingue das outras: é uma vacina de proteína de pré-fusão para coronavírus feita com a tecnologia de nanopartículas Matrix-M — um adjuvante à base de saponinas que permite aumentar a resposta imunológica e estimular altos níveis de anticorpos neutralizantes, como se lê no site que concentra informações sobre todas as vacinas. Ou seja, a Novavax usa uma versão da proteína spike SARS-CoV-2 criada em laboratório à qual juntou o adjuvante.
As vacinas modernas contra a gripe, o HPV (vírus de papiloma), de 2000, ou a HepB (hepatite B), licenciada em 1986, são já vacinas de subunidade de proteína. Mas como têm várias componentes normalmente demoram mais tempo a produzir.
A vacina contra a Covid-19 desenvolvida pela Pfizer com a BioNTech (BNT162b2), a inventada pela Moderna (mRNA-1273) e a da CureVac utilizam uma molécula de ARN mensageiro — ferramenta baseada na informação genética do vírus e que as células utilizam para produzir proteínas — encapsulada numa bolha de lípidos para não ser destruída pelas enzimas do corpo humano. Como estas moléculas e os lípidos são extremamente sensíveis ao calor, a vacina da Pfizer precisa de ser guardada em contentores com gelo seco a -70ºC e sensores térmicos. E a da da Moderna exige temperaturas um pouco menos frias mas, ainda assim, gélidas: -20ºC
A vacina desenvolvida pela AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford (ChAdOx1-S) e a da Johnson&Johnson utilizam uma tecnologia completamente diferente, semelhante a uma estratégia Cavalo de Tróia. Enquanto a AstraZeneca utiliza um adenovírus de chimpanzé para incluir o gene que transporta a informação sobre a proteína S, a Johnson&Johnson faz o mesmo com um adenovírus humano. Mas tanto num caso como no outro, os vírus foram geneticamente alterados para evitar que se proliferem no organismo e para garantir que não causam qualquer doença ao paciente. No caso da Novavax foi criado em laboratório pelo mesmo motivo. Por outro lado estas vacinas precisam apenas ser refrigeradas, não ultracongeladas, logo são mais fáceis de produzir.
Alguns analistas dizem que a tecnologia da Novavax tem uma vantagem. Andrew Ward, biólogo da Scripps Research, que possui algumas ações na empresa, liderou uma equipa que publicou um artigo na Science que descreve a estrutura da proteína spike produzida pela Novavax, o coração de sua vacina. E ficou impressionado com sua estabilidade, assim como as respostas de anticorpos que produziu em humanos e animais. “Eles têm o know-how. E eles obviamente, como confirmamos, são um bom produto”, disse.
Quando, a 20 de dezembro, a Agência Europeia do Medicamento deu luz verde à comercialização desta vacina para pessoas com mais de 18 anos, indicou que os ensaios clínicos apontavam para efeitos secundários normalmente ligeiros ou moderados, que desapareceram ao fim de dois dias da vacinação. Os mais comuns foram dor no local na injeção, cansaço, dores musculares, dores de cabeça, mal estar geral, dores nas articulações, náusea ou vómitos, descreve a AEM.
A Novavax espera entregar 100 milhões de doses para uso nos Estados Unidos em 2021. E tem já acordo com outros países, além do Reino Unido, com o Canadá com 52 milhões de doses e com a Austrália que irá adquirir 51 milhões de doses.
Em setembro, a Novavax chegou a um acordo com o Serum Institute of India, um grande fabricante de vacinas, para a produção de 2 mil milhões de doses por ano. Mas não parece ser o único a fazê-lo. Ainda em janeiro o The Guardian anunciava um outro local onde será produzida esta nova vacina que o Reino Unido vai adquirir: Teesside, em North Yorkshire, uma zona industrial em declínio onde está localizada a Fujifilm Diosynth (sim a Fujifilm), que irá também fazer esta vacina.
Notícia atualizada a 20 de dezembro, às 15h37, com a aprovação da EMA