A associação cívica SEDES criticou esta quarta-feira o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) de resposta à crise pandémica pela falta de uma “visão estratégica ambiciosa para um crescimento robusto” e de “medidas políticas com fundamento técnico e científico”.
Numa posição pública divulgada, a SEDES considerou que, no plano, “não são percetíveis, nem uma visão estratégica ambiciosa para um crescimento robusto, nem medidas de política com fundamento técnico e científico suficientes” e defendeu ser “crucial” a garantia de transparência na aplicação dos fundos europeus, para “impedir o desperdício de recursos que são de todos e não de apenas alguns”.
O plano, lê-se ainda no documento, de quatro páginas, “não tem suficiente evidência de que responde às recomendações do Conselho Europeu sobre o Mecanismo dos Desequilíbrios Macroeconómicos, nem se apresenta orientado a uma estratégia de crescimento económico e de desenvolvimento da sociedade portuguesa”.
A associação cívica avisou ainda que “não se podem dispersar os gastos e investimentos em dezenas de programas e pequenos projetos, sem teorias de políticas públicas testadas e com evidência empírica científica comprovada”, mas sim serem sujeitos “a uma análise rigorosa de custos-benefícios, para evitar os problemas da má afetação de recursos, que reduziram significativamente o crescimento económico nas duas décadas passadas”. Depois, a SEDES dá vários exemplos do que pode ser feito, como na área da digitalização, uma das áreas do plano.
“Na digitalização, deveríamos modernizar os processos industriais, estender centros de tecnologia e equipar escolas, universidades, laboratórios e centros de investigação, como a Alemanha através do plano Indústria 5.0 está a introduzir métodos de Inteligência Artificial, Impressão 3D e Big Data, em vez de desperdiçar recursos em estéreis ações de divulgação”, segundo a posição da SEDES sobre o PRR.
Para uma transição energética “justa e equilibrada”, a associação alertou para o facto de Espanha estar a reduzir o custo da eletricidade em 30% até 2030 quando, em Portugal, “tem-se vindo a fechar centros de produção que implicam destruição de valor que supera os recursos que o Plano de Recuperação via aportar à energia”.
A SEDES concluiu que Portugal “precisa de uma nova visão estratégica para a recuperação, que fortaleça as empresas e as instituições de forma a relançar o crescimento com metas ambiciosas através da modernização tecnológica e utilizando as melhores técnicas e as melhores práticas internacionais, para evitar uma nova crise financeira”.
Sedes quer recuperação económica com ajudas financeiras e investimentos
A Sedes – Associação para o Desenvolvimento Económico e Social defendeu a necessidade de adoção de uma estratégia de recuperação económica, combinando ajudas financeiras, investimentos públicos e apoios para empresas e famílias.
“Os elevados níveis de incidência da pandemia, a lentidão na abertura da economia e dependência de setores (como o turismo) que registarão uma lenta recuperação, associados aos níveis elevados de endividamento da economia e do Estado, e às fragilidades que se anteveem em face do nível de moratórias e do previsível aumento do crédito malparado, não podem deixar nenhum português consciente indiferente”, indicou, em comunicado, a associação.
Neste sentido, a Sedes defendeu ser necessário alcançar a imunidade de grupo, através de uma campanha de vacinação, a adoção de uma estratégia de recuperação económica e resiliência social, “combinando ajudas financeiras, investimentos públicos e incentivos às empresas e famílias”, bem como de reformas e políticas económicas que levem ao crescimento económico. A isto acresce assegurar que o crescimento económico é “social e territorialmente inclusivo”, com o país dotado de infraestruturas e políticas que permitam responder a futuras crises.
Assim, segundo a SEDES, terão que ser utilizados, “de forma eficiente”, os fundos europeus. “É necessário, antes de mais, ter consciência que o facto de se dispor de um montante de 50 a 60 mil milhões de euros de transferência oficiais para a década de 2021 a 2030, equivalente a 25%-30% do PIB de 2020, não significa que os rendimentos dos portugueses cresçam de forma a aproximarmo-nos da média da UE”, apontou, sublinhando que isto exige políticas orientadas para o crescimento e reforço da competitividade.
A associação referiu ainda que o programa de recuperação económica tem que ser baseado na recuperação da produtividade das empresas e no retorno dos trabalhadores, com setores como o turismo, hotelaria e restauração a receberem apoios por mais tempo. Já para os restantes setores, o Estado deverá disponibilizar os recursos para estender empréstimos, pagamento de impostos ou moratórias, evitando insolvências, notou. O programa de recuperação deverá ainda ter em conta o apoio à manutenção e expansão da capacidade instalada.
“O Plano de Recuperação e Resiliência em discussão pública não tem suficiente evidência de que responde às recomendações do Conselho Europeu sobre o Mecanismo dos Desequilíbrios Macroeconómicos, nem se apresenta orientado a uma estratégia de crescimento económico e de desenvolvimento da sociedade portuguesa. Nele não são percetíveis, nem uma visão estratégica ambiciosa para um crescimento robusto, nem medidas de política com fundamento técnico e científico suficientes”, lamentou, apontando a digitalização como uma das políticas a seguir.
No que concerne à política energética, a associação quer uma “transição justa e equilibrada”, com planos de médio e longo prazo produzidos por um “sistema eficiente de planeamento do Estado”, em cooperação com empresas e centros de investigação. A Sedes considerou também ser “crucial” assegurar um sistema de transparência, auditoria e controle de gastos, que impeça o desperdício de recursos.
O PRR, que Portugal apresentou para aceder às verbas comunitárias para fazer face às consequências da pandemia de covid-19, prevê 36 reformas e 77 investimentos nas áreas sociais, do clima e digitalização, correspondentes a um total de 13,9 mil milhões de euros de subvenções.
Segundo o Governo, foram definidas três “dimensões estruturantes” de aposta – resiliência, transição climática e transição digital -, às quais serão alocados 13,9 mil milhões de euros de subvenções a fundo perdido das verbas europeias. No documento, estão também previstos 2,7 mil milhões de euros através de empréstimos.
Fundada a 2 de outubro de 1970, no período da ditadura conhecido por “primavera marcelista”, quando se esperava uma abertura significativa da sociedade, a SEDES é uma associação cívica que tem por missão contribuir para o desenvolvimento económico e social do país e é atualmente presidida por Álvaro Beleza.
A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 2.474.437 mortos no mundo, resultantes de mais de 111 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP. Em Portugal, morreram 16.086 pessoas dos 799.106 casos de infeção confirmados, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde.