Tomás Vilaça tem 7 anos, é natural de Braga e, em setembro de 2019, foi diagnosticado com neuroblastoma, um cancro agressivo, invasivo e muito comum em pediatria. Depois de ter sido seguido no IPO do Porto, sem sucesso, o menino está desde o dia 7 desde fevereiro a fazer um tratamento inovador em Barcelona. É numa das salas do Hospital Vall d’Hebron, rodeada de barulhos de máquinas, que a mãe de Tomás, Ana Costa, conta ao Observador aquele que foi um “momento de alento”: a chamada do Papa Francisco.

Estava a escrever uma carta ao Santo Padre já há um ano, mas achava sempre que não valia a pena porque histórias como esta ele conheceria muitas. Não queria maçar o Santo Padre com uma situação como a nossa, mas a última semana foi mais desafiante e na passada sexta-feira vi-me muito aflita, com muito medo, e resolvi escrever”, começa por explicar Ana Costa.

A mãe do pequeno Tomás e ainda de uma bebé, Constança, assume ser uma mulher de fé, mesmo antes da doença do filho, tal como o marido Ricardo. “É óbvio que se calhar os homens não expressam tanto esta vertente, nós mulheres somos mais expressivas a este nível. Quem me conhece sabe que sou uma pessoa muito aficionada, mas um aficionado saudável. Ao longo da vida fui tendo demonstrações que validavam a minha fé.

Na sexta-feira, dia 12 de março, Ana escreveu duas versões da carta, uma mais curta e outra mais extensa, onde partilhava a história da doença do filho, as pessoas que se mobilizaram para o ajudar e pedia as orações do Papa pela cura do pequeno Tomás. Fê-lo sem ter ainda ter a certeza que o testemunho chegaria até ao Vaticano, no entanto “sentia que isso iria acontecer”. “Neste processo temos tentado sempre fazer tudo o que é possível, de forma a que não falte fazer nada. E, de facto, faltava-me fazer isto.”

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Depois de escrever no papel o que sentia e tudo o que lhe estava a acontecer, Ana Costa pediu ajuda a um amigo para fazer chegar a carta via e-mail ao Santo Padre, uma vez que enviá-la pelo correio seria uma tarefa mais difícil. Esse amigo conhecia uma pessoa que tinha agendada uma audiência marcada no Vaticano com o Papa Francisco na manhã desta quarta-feira e podia, assim, entregar-lhe a carta pessoalmente. “No domingo, enviámos a carta nas duas versões, com uma fotografia da nossa família e os nossos contactos, tanto por e-mail como para esse amigo em comum que sabíamos que iria ao Vaticano esta semana.”

Passavam poucos minutos das 16h desta quarta-feira quando o Papa Francisco telefonou a Ana, mas esta não lhe atendeu porque estava sem bateria no telemóvel. “Por causa do vírus, eu e o meu marido não podemos estar os dois no hospital ao mesmo tempo, então costumo ficar de manhã e à noite e ele durante tarde. Ora nessa tarde estava a tratar de coisas para a casa e por acaso fiquei sem bateria. Quando ligo o telemóvel, oiço uma mensagem de voz, com bastantes interferências, em castelhano que dizia: ‘Olá Ana, sou o Papa Francisco, recebi a sua carta e estou a rezar pelo seu filho’. O meu marido ligou-me de seguida a dizer que o Papa lhe tinha telefonado, achei que estava a brincar.”

Na verdade, após a ausência de Ana, o Santo Padre deixou-lhe uma mensagem de voz e tentou o contacto de Ricardo Vilaça, o pai de Tomás. “Ligou-lhe em número privado e o Ricardo atendeu porque achava que era o distribuidor do IKEA, pois tínhamos umas coisas para receber. Quando atendeu, reconheceu-lhe a voz e ouviu do outro lado: ‘Olá Ricardo, já contactei a Ana, sou o Papa Francisco.”

Segundo o casal, a conversa durou 10 minutos e nela o sumo pontífice perguntou “como estava o menino, o que ele tinha, em que estado estava, desejou tudo de bom e pediu que a partir daquele dia estivéssemos certos da sua oração.” O episódio surpreendeu Ana e Ricardo que, apesar de terem fé, nunca esperaram esta atitude. “Pensei que um dia poderia ter paciência para nos enviar um e-mail, já seria ótimo. Esta semana é o dia do pai, então esta chamada foi, como se diz aqui Espanha, um regalo”, sublinha Ana Costa. Ao saber do telefonema, o pequeno Tomás não reagiu com grande euforia. “Teve uma reação positiva, mas muito normal, foi como se tivesse telefonado uma médica.”

Ainda no IPO do Porto, Tomás já passou por oito ciclos de quimioterapia, uma cirurgia invasiva, um autotransplante, vários ciclos de radioterapia e três ciclos de imunoterapia, mas mesmo assim não conseguiu travar a doença. No ano passado, os pais souberam da existência de um tratamento experimental em Barcelona e em outubro de 2020 iniciaram a angariação de fundos para suportar os custos, que rondavam os 400 mil euros.

Nas redes sociais criaram a página “Pelos Sonhos do Tomás”, deram entrevistas, fizeram leilões, organizaram caminhadas solidárias e orações conjuntas. O caso chegou aos ouvidos de vários jogadores de futebol, a profissão que o pequeno Tomás anseia ter, entre eles o melhor do mundo: Cristiano Ronaldo. “Ficámos muito surpreendidos, o contributo do Cristiano Ronaldo foi uma camisola autografada por ele e com uma frase que dizia: ‘Para el elegido’, entregue entre novembro e dezembro. Penso que estabeleceu contacto connosco através da irmã da Georgina Rodriguez que contactou a mãe de um menino do Colégio do Tomás, em Braga. Muitos outros jogadores contribuíram com camisolas para um sorteio de rifas que vamos sortear.”

Segundo Ana Costa, uma vez que o hospital em Barcelona, onde Tomás está internado, é uma instituição pública, quem está a financiar, neste momento, o tratamento é o Estado português, através do Ministério da Saúde. No entanto, a quantia conseguida pelo casal, que já ultrapassa os 400 mil euros pretendidos, será aplicada numa intervenção que só seja possível realizar num hospital privado ou para despesas inerentes ao facto de a família estar fora do país, “nomeadamente viagens e alojamento, nada mais”.

Esta é uma semana “muito importante” para o pequeno Tomás, cujo tumor está presente nos tecidos e tem metásteses em alguns ossos. Esta sexta-feira inicia um “ciclo decisivo”, que combina quimioterapia e imunoterapia. “No fim deste ciclo vamos avaliar se vale a pena continuar ou não este tratamento, se continuamos os seis ciclos previstos ou se existirão outras alternativas mais invasivas. Vamos ver. Não consigo pensar muito mais à frente.”