(notícia em atualização)
É mais uma acha para a fogueira. Em Itália, 29 milhões de doses de vacinas da AstraZeneca contra a Covid-19 foram encontradas nas instalações de uma fábrica perto de Roma, e nem o governo italiano nem a União Europeia teriam sido avisados da sua existência. A notícia é avançada pelo jornal La Stampa (conteúdo para assinantes) que escreve que as doses estariam prontas para ser enviadas para o Reino Unido. O pedido de investigação foi feito pela Comissão Europeia e, depois de uma revista ao local, as autoridades italianas encontraram milhões de vacinas armazenadas. Com esta descoberta, agravam-se ainda mais as relações entre a farmacêutica e a União Europeia.
Segundo a agência ANSA, a busca foi feita pela unidade de saúde e higiene (Comando carabinieri per la tutela della salute) da polícia italiana.
Horas depois de a notícia correr a imprensa internacional, a AstraZeneca acabou por negar que as doses fossem uma “reserva”, em declarações feitas ao El Espanhol, ou que fossem para ser exportadas para o Reino Unido, como disse ao The Guardian.
A fábrica inspecionada foi a da empresa Catalent, em Anagni, que procede à operação de fill & finish, ou seja, o enchimento e acondicionamento em frascos das vacinas da AstraZeneca e que tem já um acordo firmado com a Johnson & Johnson para operações semelhantes.
A denúncia, segundo escreve o jornal italiano, partiu do comissário europeu para o Mercado Interno, Thierry Breton, que, desde fevereiro, tem visitado várias unidades fabris da AstraZeneca e de outras farmacêuticas que produzem vacinas contra a Covid-19.
No início de março, Breton percebeu que a fábrica holandesa de Halix, em Leiden — onde alegadamente foram produzidas as vacinas agora descobertas — tinha capacidade para produzir seis milhões de doses por mês. No entanto, a Agência Europeia do Medicamento (EMA) ainda não aprovou a sua produção, o que faz com que as doses da Halix não possam ser distribuídas na União Europeia. O Reino Unido está fora desta proibição, já que as suas autoridades de saúde aprovaram todas as unidades de produção da AstraZeneca.
Segundo o La Stampa, Breton quis saber o que acontecia às doses produzidas na fábrica holandesa e, na ausência de resposta, foi dado início a investigações que conduziram às instalações italianas.
“Nesse momento, o comissário francês começou a suspeitar e informou de imediato as autoridades italianas da situação e estas levaram a cabo inspeções na fábrica da Catalent”, escreve o La Stampa.
A grande questão, e que estará a ser agora investigada, é que nem todos os frascos encontrados na fábrica italiana terão sido produzidos pela Halix e, nesse caso, poderiam ser usados para cumprir os acordos com a UE. Ou seja, poderá tratar-se de um estratagema da farmacêutica, segundo fontes da UE citadas pelo jornal italiano, para enviar as vacinas para outros destinos, ao invés de destiná-los aos 27 Estados-membros.
A AstraZeneca, nas declarações feitas à imprensa, não comenta este pormenor. O que diz é que estas doses serão para distribuir pelos 27 e para enviar para países em desenvolvimento, ao abrigo do programa Covax. Estas últimas não precisam da autorização especial para passar as fronteiras europeias.
A explicação da AstraZeneca
Em declarações ao El Español, a farmacêutica garante que as únicas exportações previstas são as que não estão obrigadas a notificação prévia. “Atualmente não há exportações planeadas além das que são destinadas aos países de Covax ”, assegurou um porta-voz da AstraZeneca.
“Há 13 milhões de doses a aguardar luz verde para controle de qualidade para serem enviadas para a Covax como parte do nosso compromisso de fornecer milhões de doses para países com baixos rendimentos. A vacina foi fabricada fora da UE e enviada para a fábrica de Anagni para encher frascos”, acrescenta. As restantes doses são destinadas à União Europeia. “Cerca de 10 milhões de doses serão entregues aos países da UE durante a última semana de março e as restante em abril, quando receberem a aprovação para serem entregues, depois do controle de qualidade”, explica o porta-voz ao jornal espanhol.
Doses escondidas são quase o dobro das recebidas na UE
Os 29 milhões de vacinas são quase o dobro daquelas que a UE já recebeu até agora da AstraZeneca (16,6 milhões), que tem vindo sucessivamente a falhar a entrega das doses acordados com os 27. O stock agora descoberto, como escreve o La Stampa, é igualmente importante para o Reino Unido que precisa destes frascos para garantir a segunda dose de vacinação a quase quinze milhões de cidadãos.
Embora haja suspeita de que estas vacinas estariam reservadas para o Reino Unido, a Comissão Europeia ainda não se pronunciou oficialmente sobre o assunto, numa altura em que os 27 exigiram à AstraZeneca que pare de exportar vacinas produzidas dentro da UE para outros países até que cumpra as suas promessas de entrega: 100 milhões de doses no primeiro trimestre deste ano.
Desde 1 de fevereiro que a UE introduziu um sistema de autorizações para exportação de vacinas, mas apenas um lote com destino à Austrália foi bloqueado desde então.