O juiz Fonseca e Castro, que terá interrompido uma sessão de julgamento porque o procurador e um funcionário se teriam recusado a tirar a máscara, e que tem contestado o confinamento e as regras do estado de emergência, foi suspenso preventivamente pelo Conselho Superior de Magistratura (CSM). Num vídeo publicado no Facebook, antes de ser notificado mas já antevendo a suspensão, Fonseca e Castro diz que vai “continuar a falar na qualidade de juiz” e que terá “mais tempo disponível para ajudar a população a ficar consciente dos seus direitos e a fazer valer os seus direitos“.
Na decisão do CSM, a que a agência Lusa teve acesso, o inspetor responsável pelo inquérito disciplinar refere que a conduta imputada ao juiz/arguido “se mostra prejudicial e incompatível com o prestígio e a dignidade da função judicial”, opinião partilhada pelo vice-presidente do conselho que determinou a suspensão do magistrado. Além da suspensão preventiva, o órgão de gestão e disciplina dos juízes decidiu ainda abrir um processo disciplinar ao magistrado.
Num vídeo no Facebook, publicado na tarde desta quinta-feira, o juiz Fonseca e Castro diz que a suspensão — que, na altura da publicação, ainda não lhe tinha sido comunicada diretamente — já era por si esperada. “Já era algo que tinha antecipado. Não é nada que me tenha apanhado desprevenido”. Refere que vai “continuar a falar na qualidade de juiz porque é o que sou”. “Vou ter mais tempo disponível para ajudar a população a ficar consciente dos seus direitos e a fazer valer os seus direitos. É isso que vai acontecer”, conclui, acrescentando que dará mais informações mais tarde.
Fonseca e Castro tem feito várias afirmações públicas contra o confinamento e o estado de emergência, e apelado à desobediência civil e ao incumprimento das regras. O episódio mais recente a envolver o juiz foi a suspensão de uma sessão de julgamento no tribunal de Odemira porque o procurador e um funcionário se teriam recusado a tirar a máscara. Na manhã desta quinta-feira, Fonseca e Castro fez um direto numa página de Facebook criada no mês de fevereiro, onde dá a sua versão dos factos. O juiz argumenta que “não pode julgar alguém de cara tapada”, uma vez que aplicar uma pena a alguém “exige rigor”.
“Deixa de haver obrigatoriedade de utilização da máscara na sala de audiências devido à incompatibilidade com a atividade que é a apreciação da prova. Essa atividade obedece aos princípios da oralidade, imediação e livre apreciação da prova”, afirma acrescentando que “não é possível que as pessoas tenham a cara tapada”.
O juiz emitiu um despacho onde dizia ser “impossível o arguido e as testemunhas terem a cara tapada”. Segundo o próprio, terá dado opção aos restantes intervenientes processuais para também tirarem as máscaras, o que terá acontecido, segundo relata, “de imediato pelos advogados”.
“O único que não tirou a máscara foi o senhor Procurador que se opôs a que a audiência fosse realizada com pessoas sem máscara”, relatou Fonseca e Castro citando o Procurador que terá dito que estava “desconfortável” por haver outras pessoas na sala de audiências sem máscara.
“A audiência não foi realizada porque o senhor procurador se recusou, é o único que tenho em Odemira”, afirmou durante o direto no Facebook negando a versão avançada pela SIC que dava conta que teria sido o Juiz a interromper a audiência por ter havido recusa de algumas pessoas em retirar as máscaras.
Ordem dos Advogados abre processo a Fonseca e Castro
A Ordem dos Advogados anunciou, em comunicado, que vai agir disciplinarmente contra o juiz Fonseca e Castro. O comunicado refere que, numa reunião realizada esta quinta-feira, o Conselho Geral da Ordem teve conhecimento de que “estariam a ser distribuídas pela internet por um Juiz de direito minutas de peças processuais relativas a defesas em processos de contraordenação, providências de habeas corpus, participações criminais, declarações de não consentimento e termos de responsabilidade”.
Como a elaboração de peças processuais só pode ser feita por advogados com inscrição em vigor na Ordem — e dado que Fonseca e Castro pediu a 2 de março a suspensão dessa inscrição por ter reingressado na magistratura — o magistrado “não pode legalmente” praticar “atos próprios da profissão de advogado”. O Conselho Geral da Ordem dos Advogados decidiu, assim, “instaurar os competentes procedimentos legais”.
Que minutas são estas? No Facebook, Fonseca e Castro partilhou um Caderno de Minutas para ajudar cidadãos a contestar contraordenações passadas pelas forças de segurança e a apresentar queixa-crime. Segundo o Jornal de Notícias, o documento junta várias minutas e argumentos jurídicos para que cada cidadão “possa fazer valer os seus direitos” e para ajudar advogados a defenderem os seus clientes nestes processos. Nesse Caderno, constam modelos para contestar contraordenações por não se usar máscara, por circular entre concelhos ou pelo consumo de álcool na rua. Também constam declarações para serem enviadas às escolas contra a testagem de menores ou a proibição do uso de máscara.
PSP já denunciou Fonseca e Castro ao Conselho Superior da Magistratura
Depois de publicar vários vídeos no Facebook onde apela à desobediência civil e as pessoas a não cumprirem as regras em vigor ao abrigo do estado de emergência, a PSP participou do Juiz ao Conselho Superior da Magistratura, avançou o Expresso.
Fonseca e Castro foi rápido a reagir no Facebook, através de mais um vídeo, onde identificou cada um dos agentes da PSP que fizeram queixa, envolvendo diretamente o Diretor Nacional da PSP Magina da Silva. “Foram as seguintes pessoas que participaram de mim ao Conselho Superior da Magistratura: Manuel Magina, Diretor Nacional da PSP; Manuel Domingos Antunes Dias, Superintendente da PSP; Artur Jorge; João Tomás Soares”, elenca acrescentando que “não tem problema com as participações” e que está “preparado para tudo o que possa ser feito” contra ele.
O juiz confirma que há um inquérito em curso pelo CSM e que “oportunamente irá prestar declarações em Lisboa” onde pediu para ser ouvido.
Fonseca e Castro foi dirigente da Associação Juristas Pela Verdade, mas depois de voltar à magistratura deixou a associação e fundou a página Habeas Corpus que vem alimentando com conteúdo há mais de um mês.