Os alunos de escolas em territórios económica e socialmente desfavorecidos poderão aceder ao ensino superior através de contingente especial, tal como está previsto no Plano Nacional de Combate ao Racismo e à Discriminação 2021-2025, que entra esta sexta-feira em consulta pública.

No documento, a que a Lusa teve acesso, e integrado nas medidas que dizem respeito ao ensino superior, o Governo prevê “definir um contingente especial adicional de alunos das escolas TEIP [Territórios Educativos de Intervenção Prioritária] no acesso ao ensino superior e cursos técnicos superiores profissionais”.

O programa TEIP abrange atualmente 136 agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas que estão localizadas em territórios económica e socialmente desfavorecidos, “marcados pela pobreza e exclusão social, onde a violência, a indisciplina, o abandono e o insucesso escolar se manifestam”, lê-se no ‘site’ da Direção-geral de Educação.

Em declarações à Lusa, a secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade explicou que a criação de um contingente especial de acesso ao ensino superior para alunos das escolas em TEIP “é uma medida que está a ser desenhada pel[o]a [Ministério da] Presidência, o Ministério da Educação e pelo Ministério do Ensino Superior”.

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Aqui é precisamente esse o objetivo, tal como existe noutros países: contingentes especiais para outros grupos. Considera-se esta uma boa estratégia, por isso a propomos”, disse Rosa Monteiro, que defendeu que o trabalho em relação ao ensino superior “vai muito além da questão do acesso”, apesar de admitir que é uma questão “absolutamente decisiva”.

Nesse sentido, sublinhou que é preciso que o incentivo comece antes do ensino superior, apontando que está também previsto o “reforço do sistema de bolsas”, como as bolsas do programa OPRE para alunos ciganos do ensino superior e as bolsas no âmbito do programa ROMA Educa, para estudantes ciganos no 3.º ciclo do ensino básico ou do ensino secundário.

Mais diversidade no ensino superior e mais educação contra o racismo

Dentro do ensino superior, o plano prevê também códigos de conduta, maior representatividade entre pessoal docente e não docente ou dirigente ou a inclusão nos planos curriculares de estratégias de educação contra o racismo e sobre a história e contribuição das pessoas afrodescendentes e ciganas.

O documento, que o Governo agora apresenta para consulta pública, está organizado em quatro princípios e dez linhas de atuação, com o objetivo de “concretizar o direito à igualdade e à não discriminação, através de uma estratégia de atuação nacional que vá para além da proibição e da punição da discriminação racial”.

Para Rosa Monteiro, este “é um dia muito especial para todo o Governo porque é a primeira vez que se torna público um plano nacional de ação contra o racismo”. E isso “não tem só o valor simbólico, é o reconhecimento de um conjunto de necessidades de intervenção que reforça de facto os meios destinados à prevenção e combate ao racismo, com medidas transversais e medidas direcionadas aos vários setores e áreas governativas”, apontou.

O plano traz medidas divididas entre “Governação, informação e conhecimento para uma sociedade não discriminatória”, “Educação e Cultura”, “Ensino Superior”, “Trabalho e Emprego”, “Habitação”, “Saúde e Ação Social”, “Justiça, Segurança e Direitos”, “Participação e Representação”, “Desporto” e “Meios de Comunicação e o Digital”.

Milhares em protestos contra o racismo em Lisboa, Porto e Coimbra. As fotos das homenagens a Floyd (muitas sem as regras de segurança)

Mudanças nos currículos e manuais escolares e mais diversidade no Plano Nacional de Leitura

Está prevista uma aposta na formação e capacitação dos trabalhadores da administração pública, desde um “programa intensivo de direito antidiscriminação” ou ações para quem trabalha na área do atendimento ao público, mas também entre a comunidade educativa, profissionais de saúde, forças de segurança ou trabalhadores de municípios e freguesias.

Por outro lado, em matéria de “Educação e Cultura”, o plano prevê “diversificar o ensino e os currículos, designadamente, através da inclusão de conteúdos, imagens e recursos sobre diversidade e presença histórica dos grupos discriminados, e processos de discriminação e racismo, nos currículos e manuais escolares de disciplinas obrigatórias”.

“Alargar a oferta do plano nacional de leitura a autores lusófonos e de outros países não europeus ou norte-americanos, incluindo autores portugueses ciganos e afrodescendentes, bem como autores imigrantes e emigrantes, e refugiados a residir em Portugal”, é outra das medidas previstas.

No âmbito do “Trabalho e Emprego”, por exemplo, o Governo quer promover formas de recrutamento cego, de modo a aumentar a diversidade e a assegurar maior igualdade tanto no acesso como na progressão, por parte de pessoas de grupos discriminados.

Outra das medidas, inserida na parte sobre “Justiça, Segurança e Direitos”, é a autonomização e reforço da Comissão para a Igualdade e contra a Discriminação Racial (CICDR), e que, tal como explicou a secretária de Estado, passa pela saída deste organismo da alçada do Alto-Comissariado para as Migrações.

O documento vai estar em consulta pública até ao dia 10 de maio, na plataforma ConsultaLEX, e a secretário de Estado espera que haja “uma participação muito significativa e cooperante por parte da sociedade civil” e contributos para o programa de ação. “Pretendemos que este seja um plano para todas as pessoas, em que toda a sociedade portuguesa se reveja, com este desígnio de avançarmos para um futuro mais igual, alinhados com aqueles que são também os grandes objetivos da União Europeia”, defendeu Rosa Monteiro.