Ansiedade, stress ou burnout [esgotamento por exaustão]. Rita Maçorano percebeu, ainda na faculdade, que a temática da saúde mental seria uma missão — não que o plano fosse o de lançar o Holi, mas quando, na cadeira de neurociências, lhe colocaram o desafio de criar uma solução inovadora com tecnologias emergentes o mote estava dado. Na altura, Rita estava a tirar a licenciatura em Engenharia Biomédica e Biofísica.
“Pegámos [em conjunto com Francisca Canais, cofundadora do projeto] na saúde mental e começámos a desenvolver soluções que conseguiam ver o estado emocional da pessoa através de sinais fisiológicos”, diz ao Observador a jovem de 24 anos.
Depois da licenciatura, seguiu-se o mestrado, partilhado com Francisca Canais, e um outro desafio, mais profundo, começaria a dar forma ao futuro: “Desenvolvemos uma solução para tratamento de fobias, recorrendo a jogos e a esta quantificação dos sinais fisiológicos. Desenvolvemos, testámos em ambiente clínico, tivemos resultados bastante promissores” mas, com a chegada da pandemia foi necessário abrandar. Por esta altura, a Nevaro, de onde viria a nascer o Holi, já tinha alicerces.
Mas que projeto é este, fundado por Rita, Francisca e Hugo Ferreira, que arrecadou o primeiro lugar no concurso Protechting 4.0 em 2020, que foi finalista do USWC Copenhaga em 2018, que ficou no 3.º lugar do Internet+ na China em 2019 ou que venceu o DNA Cascais Health & Wellbeing? Ja em 2021, o Holi foi o projeto vencedor da sexta edição do Santa Casa Challenge, um concurso de empreendedorismo organizado pela Casa do Impacto, que lhe deu acesso direto à Web Summit 2021, incubação gratuita no hub de empreendedorismo e social e um prémio de 15 mil euros.
“A Faculdade de Ciências tem um centro para a inovação e lançaram um concurso que era o ScienceIn2Business. Fomos desafiados a apresentar e ficámos em primeiro lugar, o que nos deu um boost para explorar esta veia empreendedora. A Nevaro surge como a combinação da gamificação com a saúde e a quantificação dos sinais fisiológicos”, conta ao Observador.
Com a experiência que a Nevaro foi arrecadando, e percebendo quais as necessidades existentes no mercado, especialmente com a questão da pandemia, Rita, Francisca e Hugo procuraram reformular a estratégia de integração da Nevaro no no ramo da saúde.
“De repente, estávamos numa pandemia, estava tudo sem parar e os sintomas de burnout começaram a disparar. Fomos contactando com várias empresas e percebendo a necessidade. Desenvolvemos o Holi para esta gestão e redução do risco de burnout bem como para agir em caso de necessidade”, acrescenta. Como? Quando vendem a app às organizações, estas disponibilizam-na aos funcionários, para que estes interajam com diversas ferramentas dentro da aplicação. Exemplo: práticas de respiração, de mindfulness, registo de humor (mood tracking) ou de escrita terapêutica (journaling).
Os empregadores têm depois acesso a uma análise agregada do estado da empresa, mas nunca dos colaboradores individualmente, garantindo desta forma a proteção de dados, explica Rita Maçorano ao Observador. O objetivo do Holi é, assim, o de promover uma gestão consciente da saúde mental e do bem-estar dos funcionários.
A aplicação, disponível apenas para empresas, combina as estratégias gamificadas que já faziam parte do código genético da Nevaro mas, segundo Rita, “de forma menos terapêutica”. Isto porque não cabe ao Holi o diagnóstico ou tratamento, mas a gestão intermédia. “Temos uma rede de parceiros clínicos com quem partilhamos as soluções. Utilizamos uma metodologia de semáforo para identificar o estado da pessoa; se virmos que está num nível em que precisa de apoio especializado, encaminhamos para um dos parceiros.”
A ideia valeu-lhes o primeiro lugar na sexta edição do Santa Casa Challenge, concurso organizado pela Casa do Impacto [o hub de empreendedorismo e inovação social e ambiental], da Santa Casa da Misericórdia, que procura soluções inovadoras para promover a saúde de qualidade, num ano dedicado ao Desenvolvimento Sustentável.
“Vencer o Santa Casa Challenge representa para nós o reconhecimento de todo o esforço que temos posto na mudança do paradigma da saúde mental”, realça Francisca. “O prémio e apoio que este primeiro lugar nos trouxe vai permitir alavancar a nossa entrada no mercado e maximizar o impacto que teremos capacidade de gerar.”
Para já, a ferramenta esta apenas disponível em formato b2b, ou seja, direcionado ao setor empresarial, com as “empresas de grandes dimensões” a encaixarem no principal público alvo, mas Rita reconhece o potencial de abertura numa estratégia direcionada ao consumidor. “De momento, só trabalhamos com empresas e ajudamos os departamentos de Recursos Humanos a saber lidar com pessoas com problemas, mas o nosso objetivo é revolucionar o panorama da saúde mental”, explica.
Desde sempre a funcionar numa lógica de bootstrapping (sem investimento externo e com o que fatura) , e com uma base sólida de parceiros na saúde que inclui, entre outros, o Hospital da Luz, o Instituto Gulbenkian de Saúde, a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo ou o Neurocog, o Holi tem-se financiado através dos prémios, da bolsa de investigação e de uma subscrição que equivale ao “preço de um café por dia por pessoa”, esclarece Rita.
No futuro desta ideia, para já, está o arranque de uma ronda de investimento, bem como a criação de uma rede clínica bem estabelecida em território nacional para depois passar à internacionalização. “Contamos com parceiros internacionais; antes do Holi já tínhamos uma rede bem estabelecida. Temos colaborações com Reino Unido, Itália e países nórdicos”, conclui.