A percentagem de adultos portugueses que não terminaram o ensino secundário (47,8%) é mais do dobro da média europeia (21,6%), revela a Fundação José Neves (FJN) no primeiro Relatório Estado da Nação sobre Educação, Emprego e Competências em Portugal. Este é o valor mais baixo entre os países que compõem a União Europeia.

Através deste estudo, a instituição criada pelo líder da Farfetch — plataforma online de moda de luxo que se tornou na primeira empresa com ADN português avaliada em mais de mil milhões de dólares (um unicórnio) –, afirma que a “população portuguesa tem o maior défice de qualificações da União Europeia” e que os homens ganham até mais 38% do que as mulheres. Entre outras conclusões, a FJN deixa ainda “metas” para inverter estas tendências até 2040 .

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“Portugal apresenta também o maior fosso inter-geracional nos níveis de qualificação da sua população ativa. 75,2% dos jovens adultos (dos 25 aos 34 anos) têm pelo menos o ensino secundário completo, mas nem metade dos adultos mais velhos (35 aos 64 anos) concluiu esse nível de ensino (apenas 46,5%)”, diz o estudo.

O relatório, que pode ser consultado aqui, tem como objetivo permitir “a todos os Portugueses, e em particular aos agentes da educação, ao Governo, às instituições de ensino e à própria FJN, tomarem decisões sustentadas”. Além disso, e debruçando-se também este estudo sobre o último ano que passou, “o destaque anual vai inevitavelmente para o impacto da pandemia da Covid-19 no mercado de trabalho”, fazendo também uma “retrospetiva das principais dinâmicas na educação, emprego e competências durante a última década”, explicam os responsáveis.

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De acordo com este relatório, apesar de os jovens terem mais educação, “o salário médio real dos jovens licenciados caiu 17% entre 2010 e 2018, referem os responsáveis por esta análise. “É uma situação que acarreta o risco de um incumprimento das expectativas no valor da educação”, adianta a FJN.

Mesmo assim, este estudo salienta que “mais educação garante emprego e melhores remunerações”. “Os portugueses licenciados ganham, em média, mais 750 euros do que aqueles que só têm o ensino secundário“, adiantam os responsáveis, ressalvando que estas vantagens “são menos pronunciadas entre os mais jovens”.

Estes dados levam os responsáveis pelo estudo também a afirmar que “os portugueses estão mais qualificados, mas que existe desajustamento entre a educação e o mercado de trabalho”: “15% dos diplomados está a  trabalhar em ocupações que não exigem este nível de ensino” e “19,4% dos jovens que terminaram recentemente o ensino superior não estão empregados”, referem.

Tudo isto após um ano marcado pela pandemia. De acordo com as conclusões do relatório, a “Covid-19 acelerou o potencial de desigualdade, sobretudo em termos de idades e qualificações”. Porém, devido às alterações que introduziu na sociedade, “acelerou o trabalho em casa”, mas este “continua a ser uma possibilidade reservada a trabalhadores mais qualificados e experientes”. “62% dos trabalhadores estão em profissões com baixa probabilidade de serem exercidas em casa“, concluem os responsáveis.

Homens têm menos estudos mas ganham mais do que as mulheres

Outro dos pontos de destaques das 64 páginas deste relatório é relativo à disparidade de salários entre sexos. “As mulheres são mais qualificadas do que os homens, mas a disparidade salarial continua a penalizá-las independentemente do nível de educação e área de estudo”, afirma a FJN.

A sustentar a afirmação estão os dados revelados que mostram que os homens licenciados ganham mais 38% do que as mulheres com o mesmo grau de ensino. “O que também se verifica  nos restantes níveis de escolaridade: mais 32% nos mestrados e mais 28% no secundário”, salienta o relatório.

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Mesmo assim, nem todos os resultados são negativos para as mulheres quanto às disparidades de sexo. “Em 2020, cerca de 82% das mulheres entre os 25 e os 34 anos tinha pelo menos o ensino secundário completo“, refere o relatório. Em 2011, “este valor correspondente para os homens era cerca de seis pontos percentuais mais baixo (76%)”. Contudo, “fica claro que a generalização dos níveis de ensino mais elevados entre os mais jovens tem vindo a ser feita de forma marcadamente diferente entre homens e mulheres”, conclui o estudo.

A massificação do ensino superior tem sido muito mais rápida entre as mulheres. Em 2020, quase 50% das mulheres entre os 25 e os 34 anos tinha completado um curso superior, sendo o valor para os homens cerca de 15 pontos percentuais mais baixo (34,6%)”, diz o estudo da FJN.

Além destes resultados, o estudo da FJN adianta que as mulheres representavam, em 2020, 60% dos mestres em Portugal entre os 25 e os 34 anos. No entanto, ao nível dos doutoramentos, “e mesmo que as mulheres sejam também a maioria, o crescimento recente tem sido impulsionado sobretudo por homens”, lê-se também no relatório.

As metas da FJN para 2040: Portugal no top 10 da UE no setor tecnológico

Todas estas conclusões têm como propósito servir de base para uma ambição da FJN para 2040. Qual é a ambição? São várias: que os adultos (25 aos 64 anos) com baixa escolaridade “sejam no máximo 15%, uma diminuição de 33 pontos percentuais face ao valor atual (47,8%); que pelo menos 25% dos adultos participem em educação e formação (atualmente esse número está nos 10,5%); e que Portugal esteja nos 10 países da União Europeia com maior peso do emprego em setores tecnológicos e intensivos em conhecimento (uma melhoria de 9 posições face ao ranking atual, agora está em 19º).

Para alcançar estas metas, os responsáveis do relatório dizem que é necessário “apostar na qualificações dos jovens portugueses”, requalificar a população com baixas qualificações para manter relevância no mercado de trabalho” e “garantir alinhamento entre educação e formação e necessidade do mercado de trabalho”, entre outras vertentes. Para isso, a FJN diz que pretende ser um dos “contribuintes para estes esforços”.

O relatório Estado da Nação resulta de “uma recolha, criação e análise de dados, indicadores e modelos econométricos”. O estudo foi coordenado pela FJN e produzido em conjunto com equipas de investigadores da Universidade do Minho e da Universidade de Aveiro, com base em dados do Instituto Nacional de Estatística, do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e do Brighter Future, entre “outras fontes”, dizem os responsáveis.