A Ionity começou a operar em Portugal em final de Abril, sendo o nosso país um dos últimos a usufruir da rede ultra-rápida criada por um conjunto de marcas –  os grupos VW, Mercedes, BMW, além da Ford e Hyundai-Kia – que se uniram para reduzir os custos de criar uma rede de carga europeia, com até 350 kW de potência. Mas o arranque não podia correr pior, pois além de o nosso país ter sido dos últimos a receber os carregadores desta rede, as duas estações agora inauguradas em cada um dos lados da auto-estrada A2 em Almodôvar têm apenas dois pontos de carga (os concorrentes da Tesla, que servem apenas os clientes da marca, têm uma média de 10) e o preço do kWh é de longe o mais caro, tornando os custos de utilização de modelos eléctricos mais elevados do que os equipados com motores a gasóleo ou gasolina, abrindo assim mão de um dos principais argumentos de venda desta tecnologia.

Estes custos elevados dos carregamentos, que rondam os 80 cêntimos/kWh, deviam ser exclusivamente aplicados aos clientes de marcas que não integram o consórcio. Sucede que nem os construtores que investiram no consórcio os conseguem evitar, uma vez que apesar do tempo que foi necessário esperar para ter o primeiro posto em Portugal, a Ionity – cujo cartão não funciona no nosso país – foi “surpreendida” pela legislação nacional que obriga as estações que operam em áreas públicas a estarem ligadas à rede Mobi.E. Isto impede a prática de preços diferenciados na utilização do posto, uma vez que Ionity é apenas um OPC (Operador de Ponto de Carregamento) e não tem licença de CEME (Comercializador de Electricidade para a Mobilidade Eléctrica). Foi para evitar esta situação que a Tesla instalou os seus Superchargers em terrenos privados, para poder servir apenas os veículos da marca e pelos preços que bem entende.

Ultra-rápidos têm vantagem, mas não tantas

Para testarmos o sistema de carregamento da Ionity, deslocámo-nos num ID.4 a Almodôvar, o mais recente eléctrico da Volkswagen, a marca que mais veículos eléctricos comercializa, entre as que suportam os custos da Ionity, logo uma das mais interessadas em satisfazer os seus clientes, cumprindo o prometido, que passa por fornecer energia a preços competitivos. De outra forma, será difícil explicar a um condutor de um eléctrico da VW, Audi, Seat, Skoda, Cupra ou Porsche que tenha de pagar cerca de 80 cêntimos/kWh, quando a Tesla fornece os seus clientes por valores que variam entre 33 e 36 cêntimos.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

4 fotos

Chegámos à estação da Cepsa (que tem o exclusivo da Ionity para a Península Ibérica) de Almodôvar ainda com 21% de capacidade na bateria e não foi com surpresa que descobrimos os dois carregadores à espera de clientes. Contudo, num fim-de-semana em que inúmeros condutores rumem ao Algarve, não é difícil imaginar que só dificilmente ambos não estarão ocupados e, provavelmente, com uma fila de espera. Passado o cartão do CEME, o carregador ficou desde logo operacional, situação de que só nos apercebemos passados uns minutos, pois com o sol a incidir no ecrã, associado à reduzida luminosidade deste, ver o que está indicado não é tarefa fácil.

O Volkswagen ID.4, com bateria de 77 kWh, tem a capacidade de aceitar potências de até 125 kW e o nosso arrancou a carregar a 120 kW, mantendo este nível até atingir 45% de carga. A partir daí, foi reduzindo a potência e, aos 54%, atingidos ao fim de apenas 14 minutos, 26 kWh tinham sido armazenados no acumulador, mas a potência tinha caído para 89 kW, para ser de 66 kW aos 75%, 49 kW aos 85%, 39 kW aos 89%, 31 kW aos 95%, 18 kW aos 98%. Os 100% foram atingidos ao fim de 58 minutos, em que foram transferidos 63 kWh.

Ionity precisa de mais investidores. VW está furiosa

De regresso a casa, voltámos a recarregar, desta vez a partir de 18% e num posto rápido, a 50 kW. A operação tardou mais 25 minutos, uma diferença importante, mas não tanto quanto seria de esperar de um carregador de 350 kW face a outro com apenas 50 kW, ou seja, com uma potência 7 vezes superior. E a diferença torna-se ainda menor se tivermos em conta que o preço do kWh baixou de 80 cêntimos para apenas 25. É expectável que um veículo que aceite uma potência superior de carga retire mais vantagens da Ionity, como os Tesla, vão até aos 250 kW, ou os Porsche Taycan ou Audi e-tron GT, que anunciam 270 kW para as versões mais potentes (apesar da Porsche ter informado os seus clientes que, para evitar uma degradação acelerada da bateria, era preferível limitar a carga a 200 kW).

Solução à vista?

Um mês e meio depois de a Ionity começar a operar no nosso país, tanto quanto o Observador conseguiu apurar, a SIVA ainda está à procura uma solução para os seus clientes, de modo a reduzir o custo da utilização dos postos desta rede. Pelo menos, de forma mais palpável do que utilizando a sua aplicação We Charge ou um cartão próprio.

3 fotos

A BMW e a Mercedes propõem soluções alternativas, através da Digital Charging Solutions (um CEME) em que o preço por kWh ao abastecer na Ionity fica mais em conta. O cartão que lhe está associado é grátis no primeiro ano, mas depois implica uma renda mensal ou anual, o que pode até elevar os custos dos carregamentos, consoante o número de recargas nesta rede.

Dos cerca de 80 cêntimos cobrados por kWh num carregamento na Ionity, quase 60% diz respeito à utilização do posto de carga, cobrado pela própria Ionity, com os restantes a dizerem respeito à energia fornecida (além das taxas). A própria Mobi.E informou-nos que, oportunamente, chamou a atenção para os preços elevados praticados, com o consórcio a ter decidido manter o rumo.

As críticas públicas de que a Ionity já foi alvo, por parte do Grupo VW, indiciam que nem tudo está a correr de feição nesta rede de carga, que prometeu ter 400 estações espalhadas pela Europa no final de 2020 e ainda só vai nas 345, a esmagadora maioria com apenas quatro carregadores. Críticas são coisa que não falta por parte da imprensa e youtubers espanhóis, como o que pode ver abaixo,uma vez que do lado de lá da fronteira já há nove estações Ionity em funcionamento, estando mais nove previstas. Ao contrário do que acontece em Portugal, onde só há uma em funcionamento e três (em Estremoz, Leiria e Barcelos) agendadas para breve.