A Organização Mundial de Saúde (OMS) considerou esta segunda-feira, desnecessária uma terceira dose de reforço da vacina contra a Covid-19, que alguns países admitem dar, e criticou também a “ganância” em relação ao processo de vacinação, no dia em que Israel já está a administrar terceira dose da vacina aos mais vulneráveis.

Numa conferência de imprensa online, a partir da sede da organização em Genebra, além de voltarem a condenar a falta de solidariedade mundial na administração das vacinas, vários responsáveis frisaram que não há dados científicos que indiquem ser necessária uma dose de reforço da vacina.

Não há uma evidência que indique a necessidade de uma (terceira) dose de reforço”, salientou Ann Lindstrand, uma das responsáveis da OMS pela supervisão da vacinação contra o novo coronavírus, apelando aos países que o consideram fazer para pensarem numa perspetiva global e entregarem essas doses a países que ainda não começaram a vacinação.

A responsável admitiu que a vacina, como em qualquer outra, pode reduzir os efeitos com o passar do tempo, mas salientou que não há para já dados suficientes que indiquem que esse reforço é necessário.

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No entanto, Israel começou a administrar a terceira dose da vacina contra a Covid-19 para os doentes que sofrem complicações no sistema imunitário, avança o The Washington Post. O centro médico Sheba em Tel Aviv já está mesmo a inocular pacientes que realizaram transplantes de coração.

“Há evidências que os pacientes imunodeprimidos não desenvolvem uma resposta adequada de anticorpos mesmo tomando duas doses”, afirmou o ministério da Saúde israelita.

Além disso, as autoridades sanitárias de Israel sinalizam que o anúncio da terceira dose surge num momento em que os casos de Covid-19 estão a aumentar no país.

Há pouca informação sobre efeitos de vacinas, diz Soumya Swaminathan

Soumya Swaminathan, cientista chefe da OMS, alertou também para que haja pessoas a pensar misturar vacinas e disse que há ainda pouca informação sobre os efeitos (só está estudado o uso da vacina AstraZeneca seguida da Pfizer) e que tal pode resultar numa “situação caótica”.

Há quatro países que querem fazer esse reforço e isso exige mais 800 milhões de vacinas, disse a responsável, salientando também que não há evidência científica de que esse reforço seja necessário. “Pode ser necessário um reforço, dentro de um ou dois anos, mas a seis meses não temos indicações”, acrescentou a cientista chefe, pedindo aos países para que não se baseiem em declarações das empresas farmacêuticas, que dizem que agora é necessária uma terceira dose de reforço.

Michael Ryan, diretor executivo do Programa de Emergências em Saúde da OMS, também disse que uma terceira dose de reforço da vacina não será agora e criticou aqueles que não querem só a fatia maior de um bolo, mas sim o bolo inteiro.

As vacinas, assinalou, devem ser dadas prioritariamente aos trabalhadores da saúde e às populações mais vulneráveis, porque há uma crise global e é o momento de proteger essas populações mais vulneráveis.

A diferença mundial em termos de vacinação contra a Covid-19, com países já a pensar em doses de reforço e com outros onde ainda não chegaram sequer vacinas, levou também o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus, a lamentar: “Se a solidariedade não está a funcionar só encontro uma palavra para isso, a ganância”

O responsável disse ser natural que se sobreponha o interesse individual, mas frisou a necessidade de os países perceberem que as vacinas que partilham também os estão a ajudar, porque só assim se coloca um fim à pandemia.

“Não percebemos porque é que o mundo não está a partilhar as vacinas, porque isso era do interesse de todos”, disse, acrescentando que é “dececionante” o que se assiste, com países a dizerem que querem comprar vacinas, que têm dinheiro, e onde as vacinas não chegam.

Tedros Adhanom Ghebreyesus disse também que os países do G20 (maiores economias do mundo) podiam fazer mais na questão das vacinas e que deviam assumir essa liderança.

E alertou que podem estar enganados os países que já vacinaram a população e se julgam seguros. “Quando acham que está tudo bem ignorar o resto do mundo e o vírus continua a circular, isso prolonga a agonia do mundo”, disse, acrescentando que era possível acabar rapidamente com a pandemia de Covid-19, porque há ferramentas para tal, assim o mundo fizesse por isso.

A pandemia de Covid-19 provocou mais de quatro milhões de mortes em todo o mundo, entre mais de 186 milhões de casos de infeção. Em Portugal morreram 17.164 pessoas e foram registados mais de 909 mil casos de infeção.