Joe Biden é “um homem da maior integridade”, de quem é “impossível não gostar” pessoalmente. Mas “esteve errado em quase todas as grandes decisões de política externa e segurança nacional, ao longo das últimas quatro décadas“. O retrato foi feito em 2014, no livro de memórias de Robert Gates, “veterano” de Washington que foi secretário da Defesa de Barack Obama – e está agora a ser recuperado por congressistas republicanos, perante a crise no Afeganistão desencadeada pela decisão de sair do país até 31 de agosto, que levou à tomada do poder pelos talibãs.
Foi o congressista republicano Jim Jordan, do Ohio, que utilizou a sua página na rede social Twitter para recuperar aquilo que escreveu nas suas memórias o insuspeito Robert Gates, que “tinha toda a razão” na avaliação que fez do então vice-Presidente norte-americano.
Barack Obama’s Secretary of Defense was right:
Joe Biden has “has been wrong on nearly every major foreign policy and national security issue over the past four decades.”
— Rep. Jim Jordan (@Jim_Jordan) August 27, 2021
Essa avaliação foi reiterada pelo mesmo Robert Gates numa entrevista que deu à CBS, em maio de 2019, quando Joe Biden já aparecia como possível candidato democrata à Casa Branca.
“Penso que mantenho essa declaração”, afirmou Gates, em 2019. “Ele [Biden] e eu concordámos em muitas matérias, durante a administração Obama. Mas discordámos totalmente no tema do Afeganistão e em outras matérias”, notou o ex-secretário da Defesa, acrescentando: “Penso que o vice-Presidente teve alguns problemas com os militares. Portanto, a forma como ele se dava com os líderes militares, que tipo de relação essa seria… penso eu… dependeria das personalidades que estivessem em causa”.
Só no duplo atentado de quinta-feira, que vitimou 13 soldados norte-americanos, perderam-se mais vidas do que em todo o ano passado, já que há vários anos que era muito baixa a mortalidade (norte-americana) no Afeganistão. É verdade que nos primeiros anos da administração Obama (em que Biden era vice-presidente) se perdiam várias centenas de vidas no Afeganistão, sobretudo nos anos de 2010 e 2011. Esses anos, em que morreram quase 500 soldados dos EUA (2010), foram marcados pelo chamado “surge” norte-americano decidido pela administração – uma investida reforçada com a qual Joe Biden não concordou, na altura.
Joe Biden “criou um problema onde ele não tinha de existir”, diz Thomas Barfield
Mas esse cenário há muito se alterou. Como assinalou, em entrevista recente ao Observador, Thomas Barfield (académico e presidente do American Institute for Afghanistan Studies), há vários anos que morriam muito poucos soldados norte-americanos no Afeganistão. “Nos últimos dois anos as tropas locais perderam uns 50 ou 60 mil soldados… Mas americanos? Não morreu ninguém, praticamente. Há muito que a mortandade se transferiu para os soldados locais”, lembrou.
“Claro que, provavelmente, era uma guerra impossível de vencer, mas não tenho dúvidas de que seria possível manter aquele equilíbrio que existia durante mais tempo – com muito poucas mortes de militares norte-americanos”, concluiu o especialista, em entrevista ao Observador onde argumenta que Joe Biden “criou um problema onde ele não tinha de existir”. Pode recuperar essa entrevista nesta ligação.
Afeganistão. Thomas Barfield: “Joe Biden criou um problema onde ele não existia”