Entre uma ação de teatro de rua provocatório e um debate público sobre a valorização do Rio Douro, Bebiana Cunha, candidata do PAN à Câmara Municipal do Porto, fez um almoço-entrevista com o Observador, num restaurante escolhido pela também líder parlamentar. O local eleito foi o Apuro, um espaço vegan na baixa da cidade cuja proprietária é Natacha Meunier, candidata do PAN à união de freguesias do Centro Histórico. “Conheço este restaurante desde que ele abriu e tem tudo a ver com a minha alimentação, sou vegan há 9 anos”, começa por dizer Bebiana, que chega à hora marcada e já tem uma mesa reservada.

À mesa fala-se quase sempre de comida e este almoço não é exceção. “Ser vegan foi uma decisão gradual, no meu caso demorou mais de dois anos. Durante a adolescência fui-me questionando sobre a alimentação que fazia e fui educada a fazer, fui fazendo algumas experiências, mas nada de muito radical”, conta. Até que em 2009, quanto trabalhava na divisão de promoção cívica e juventude na Câmara Municipal de Matosinhos, Bebiana Cunha visitou uma quinta pedagógica, observou alguns animais de perto, teve cabritos ao colo e percebeu que “o seu comportamento era muito idêntico aos cães” que tinha em casa.

Depois de procurar informação sobre os impactos da produção pecuária a nível ambiental, a decisão de deixar de comer carne estava praticamente tomada. “Havia uma tradição familiar de ao fim de semana comer aqueles assados, tive de informar a minha família que os convívios continuavam, mas que deixaria de comer o cabrito. A reação foi pacífica, sempre respeitaram as minhas decisões.” Depois do cabrito, seguiu-se o coelho até chegar ao peixe. “E eu gostava muito de peixe”, confessa.

Se há nove anos o Porto tinha apenas dois restaurantes vegan e a candidata limitava-se a pedir guarnições sempre que ia jantar fora com os amigos, hoje diz ter assistido a um crescimento de mercearias de proximidade. “A visão do PAN para a cidade é criar zonas 15 minutos, havendo uma clara aposta na economia local. Também defendemos o produto quilómetro zero, aquele é produzido nas nossas hortas”. Bebiana Cunha tem uma varanda em casa com espaço para plantar ervas aromáticas, alfaces e morangos, mas ultimamente não tem conseguido tempo para cuidar dele e fazer com que cresça alguma coisa. “Depois da campanha, está nos meus planos retomar.”

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Nos últimos dois anos tem-se dividido entre Porto e Lisboa, devido à sua presença como deputada na Assembleia da República, no carro ou no comboio leva sempre frutos secos, uma banana e água, mas quando tem mais disponibilidade também gosta de cozinhar. Especialidades? “Acho que as pessoas gostam dos meus assados, do meu arroz de tofu e das minhas lasanhas. Nos doces não sou propriamente uma expert, gosto mais de comer do que fazer.” O menu chega finalmente à mesa, numa coluna leem-se descrições de hambúrgueres, na outra bowls. “Vou escolher esta de arroz basmati, tofu grelhado e manga. Sou mais de arroz do que de massa”, confidencia. “Para beber? Pode ser o sumo dia, maçã com beterraba.”

Contactando com os portuenses na rua, a candidata do PAN tem uma certeza: o partido está a crescer

Os ataques a Moreira, as diferenças com Ilda Figueiredo e a solidão em questões ambientais

O pedido está feito e é hora de conhecer Bebiana Cunha além do prato. “Nasci na Ordem do Terço no dia 25 de dezembro, a minha mãe diz que fui uma boa prenda de Natal, mas tenho dúvidas”, assume sorridente. Formou-se em psicologia, mas chegou a pensar estudar veterinária, vive com cinco gatos, “um número superior ao que é permitido legalmente”, e, numa outra residência, tem uma cadela com um nome peculiar: Dana Scully, a personagem da série “Ficheiros Secretos”.

Bebiana Cunha começou a colaborar com o PAN em 2011 como voluntária, sem ter qualquer cargo remunerado, algo que mudou em 2019, ano em que foi eleita deputada na Assembleia da República “Não estava nos meus horizontes, mas com o tempo percebi que gostaria de ter mais participação política.” Mostrar na rua que o PAN é mais do que um partido em prol dos animais, mas um projeto social e ambiental é um dos maiores desafios da candidata no Porto. “A melhor forma de apresentar o projeto é com trabalho feito, a nossa participação na Assembleia Municipal do Porto fala por si. Em quatro anos, apresentámos mais de 100 propostas em diferentes áreas e na Assembleia da República temos um projeto para o país com base no compromisso ambiental, mas sempre ao lado das minorias.”

Para Bebiana não há duvidas de que “os valores do partido são os valores do século XXI” e pela sua experiência em campanha pelas ruas o PAN tem crescido e conseguido a proeza de “tirar muita gente da sua zona de conforto”. “Ainda ontem, na Praça da Corujeira, pessoas de mais idade nos diziam que votaram PSD a vida toda, mas que no domingo vão votar pela primeira vez no PAN porque consideram ser o único partido capaz de cuidar de todos. Este é um conceito muito interessante e é bem capaz de fazer a mudança.”

São promessas de eleitores como estes que contribuem para a confiança da candidata. “Estou confiante de que elegeremos um vereador”, afirma. Debaixo do braço, Bebiana Cunha garante ter várias prioridades e a primeira é “assegurar uma governança participada na cidade para reabrir e rever petições públicas que ficaram por discutir porque Rui Moreira recusou-se”, acusa.

“Este executivo municipal tem estado completamente fechado à discussão, temos uma cidade bastante participada com pessoas que conseguem estudar os assuntos e apresentar soluções, mas a transparência é muito reduzida. Há medo do escrutínio, da crítica e de mudar de posição, um ator político não deve ter medo de mudar de posição, deve ter a humildade e a capacidade de dar um passo atrás de for preciso. Rui Moreira precisa de um claro banho de humildade, mas, como sou uma pessoa bondosa, desejo-lhe um banho de água morna e não de água fria.

Na mesa do almoço no restaurante Apuro o prato escolhido é vegan, bem a combinar com a alimentação da candidata

Sinónimo desse banho morno seria o independente não ter maioria absoluta. “Ter maioria absoluta na cidade seria péssimo para o Porto nos próximos quatro anos, não tenho dúvidas disso.” Na autarquia, Bebiana diz fazer “um trabalho de formiguinha”, garantindo ter “uma boa relação com todos os partidos”, já no leque de candidatos identifica coisas em comum e fatores que os separam. “É mais fácil falar de questões da pobreza ou problemas sociais com o Sérgio Aires, com o Tiago Barbosa Ribeiro e até com a Ilda Figueiredo, mas em questões ambientais continuamos a estar sozinhos. Apesar de haver concordância entre todos, não sinto que os outros partidos acompanhem o PAN de forma genuína.”

Dos 11 candidatos ao Porto, apenas Bebiana Cunha e Ilda Figueiredo são mulheres e a deputada acredita que a cidade deve “pela primeira vez ter uma presidente no feminino”. “Penso que representamos experiências de vida e visões diferentes para a cidade. O PAN tem uma visão para a cidade do século XXI, a visão do PCP é do seculo XX. Sinto que o PAN está prepara para os atuais desafios do Porto e com isto não quero dizer que a Ilda Figueiredo não tenha um percurso importante na cidade, porque tem, mas quando a oiço falar sinto um olhar para o passado e não um projeto de presente e futuro.”

As gaivotas, as discussões com Inês Sousa Real e o marido

Os pratos chegam à mesa, deseja-se bom apetite e a conversa que paira no ar é sobre gaivotas, um dos problemas mais visíveis na cidade e também um dos mais sensíveis para o PAN, que, além de defender uma análise a nível nacional, apresenta algumas soluções. “O facto de termos vários aterros nos municípios envolventes e a forma como se tratam os resíduos é fator de atração das gaivotas, elas vêm procurar alimento. A solução passa por uma gestão eficiente de resíduos, encontrar locais para onde as atrair e intervir na substituição ou retirada de ovos, que no Porto isso tem sido feito pontualmente.

Bebiana Cunha rejeita por completo o termo “praga” relativamente a este animal e até encontra semelhanças com os seres humanos. “Quando olho para as gaivotas, cada vez mais acho que são um animal muito parecido connosco. Se observarmos a posição delas, a tentativa de conquista de território, a proteção das suas crias, a procura de alimento… é um animal muito inteligente, que arranja todas as estratégias possíveis para atingir o seu objetivo, tal como nós.”

Ser líder do PAN não está, para já, nos seus planos e não esconde as “muitas discussões” com Inês Sousa Real

Semelhanças à parte, não há tempo para sobremesa ou café, mas ainda nos restam uns minutos para falar do futuro e de ambição, nesse capítulo Bebiana pousa os talheres e é mais contida. “Neste momento, tenho uma tarefa em mãos que é ser líder parlamentar, é algo que me deixa bastante satisfeita, mas diria que a minha principal ambição dentro do PAN é fazer chegar a mensagem as pessoas, fazer crescer o partido.”

Ser líder do partido não é algo que esteja nos seus planos mais próximos, garante, apesar de admitir que seria “um privilégio” fazê-lo, e confessa que nem sempre está alinhada com as ideias de Inês Sousa Real. “Não tenho essa ambição, acho que o PAN está muito bem entregue à Inês Sousa Real, é uma pessoa muito positiva e muito construtiva, às vezes discutimos muito, nem sempre estamos de acordo, mas temos a capacidade de discutir soluções, estratégias e, no fim, chegar a consensos.”

Sobre o facto de o marido, Albano Lemos Pires, ser membro da direção do PAN, a candidata rejeita um caso de ‘Family Gate’ no partido. “Há uma clara confusão de conceitos, uma coisa era eu, enquanto deputada, contratasse o meu marido para trabalhar no PAN, isso eu rejeito totalmente, outra coisa é ter conhecido o meu marido, que na altura não era meu marido, no partido em 2012. Apaixonámo-nos e hoje trabalhamos juntos, ele em regime de voluntariado. Estamos a falar de coisas distintas, a pessoa não pode ser prejudicada nos seus direitos políticos porque é casada comigo.